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Coluna Informação #055 – O eterno risco da polarização

Há uma série de reflexões possíveis acerca dos cenários futuros da política brasileira

Rudolfo Lago

27/11/2020 8h04

Há uma série de reflexões possíveis acerca dos cenários futuros da política brasileira a partir da entrevista que dá hoje o senador Humberto Costa (PT-PE) ao Jornal de Brasília. Especialmente a partir dos raciocínios feitos por ele quanto ao motivo pelo qual não apoiava inicialmente a candidatura de sua companheira de partido, Marília Arraes, para a prefeitura de Recife.

Humberto admite o erro de cálculo que fizera quanto às reais chances de vitória da candidatura de Marília. Ele não a achava uma candidata viável, e o desempenho de Marília até agora, mesmo que ela não venha a ser eleita no domingo, demonstra o contrário. Ele, como pessoa fiel ao partido, afirma que, assim, agora, a apoia e estará com ela.

Mas a segunda parte do raciocínio que o fazia ser contra a candidatura, Humberto Costa mantém, mesmo que a vencedora no domingo (29) seja Marília Arraes. Será que valia a pena para o PT sustentar uma candidatura própria em detrimento da manutenção de uma parceria com o PSB que, rompida, não apenas compromete planos políticos em Pernambuco mas também a possibilidade de alianças regionais?

Para Humberto, a forma como o PSB age agora em Recife, os ataques que vem fazendo à candidata petista, farão com que a aliança que havia em Pernambuco – onde o PT faz parte do governo do socialista Paulo Câmara – se rompa e provavelmente contribuirão para inviabilizar uma aliança nacional com um partido que em muitos momentos foi parceiro das candidaturas petistas. O que Humberto questiona é se esse risco vale a pena em troca de se conquistar o comando político de uma cidade.

Daí, a reflexão possível a partir da entrevista de Humberto está na dificuldade de união de projetos em um país com espectro político tão fragmentado. Na defesa da manutenção dos interesses particulares de cada legenda, vai cada um para o seu lado e, no final, perdem todos. No campo da esquerda, essa lição já foi dada no caso do Rio de Janeiro. Cada um foi para o seu lado e o segundo turno no Rio se dá entre dois candidatos conservadores.

Mas nem assim, ao que parece, a lição foi aprendida. Humberto avalia que, no primeiro turno da próxima eleição presidencial, poderão estar todos desunidos novamente. Para discutir uniões no segundo turno, como agora acontece em cidades como Porto Alegre e São Paulo. O problema, no caso da eleição presidencial, é se tal postura levar a algo semelhante ao que aconteceu no Rio.

O outro problema está em dar mais importância aos adversários do mesmo espectro que aqueles que estão no outro lado. Talvez isso já tenha acontecido nas eleições de 2018, entre os partidários de Ciro Gomes, do PDT, e os de Fernando Haddad, do PT. Enquanto se xingavam e disputavam os mesmos votos, deixavam Jair Bolsonaro à vontade.

E, finalmente, há o eterno risco da manutenção da polarização. No fundo, é nessa manutenção que Bolsonaro aposta as suas fichas. Essa polarização é o seu oxigênio. Uma armadilha que o PT talvez não tenha percebido em 2018 é que, ao aceitar a polarização, foi jogado para uma posição que nunca foi exatamente a sua. O grupo bolsonarista raiz não tem nenhum drama de consciência em se aceitar de extrema direita. O problema é que o PT, ao aceitar colocar-se na outra ponta do jogo polarizado, deixou colar em si um emblema de extrema-esquerda que não correspondia à realidade. Especialmente à realidade dos governos que o partido exerceu, numa coalizão que chegava até o próprio Jair Bolsonaro e seu partido de então, o PP.

Em um país que tende a ser mais conservador, ter em si o emblema da extrema-esquerda é um grande perigo. No momento em que o eleitor se enxergou numa disputa entre os dois extremos, a correlação de forças pendeu para Bolsonaro. Recente pesquisa feita pela Fundação Getúlio Vargas mostra que o eleitor não está mais tão disposto a essa polarização agora. E suas escolhas nas eleições municipais até aqui demonstram isso. Mas o que a pesquisa aponta é que os eleitores que se afastaram de Bolsonaro afirmam que, em um quadro de polarização igual, podem retomar o caminho que fizeram em 2018. Antes de entrar num jogo desses, é bom ao outro lado saber que chances reais de fato tem…

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