A impossibilidade de viajar mais para ver tanto os tenistas da equipe como os possíveis adversários do Brasil na Copa Davis foi o estopim para que Fernando Meligeni deixasse o cargo de capitão da equipe brasileira. Apesar de ter tomado a decisão na sexta-feira, Fininho fez o anúncio apenas nesta segunda, encerrando ciclo aberto em 2005.
Em comunicado oficial à imprensa, Meligeni citou “falta de planejamento” da Confederação Brasileira de Tênis (CBT), mas sem citar motivos específicos. Ele também apontou uma série deles que fizeram com que sentimentos de frustração quanto a um trabalho mais bem feito crescessem na comissão.
“Quando entrei, deixei bem claro que ser capitão não era só convocar e segurar a barra dos jogadores. Tinha que ser um projeto mais globalizado, com viagens, idealização para um centro de treinamento e outras coisas. Mas a gente já vinha conversando há mais de um ano e não vimos o engajamento correto por parte deles”, disse Meligeni.
“A gente teve várias reuniões e ele não apresentou um planejamento para 2007. Ele sabia que as coisas estavam degringolando, mas ainda assim não mudou muito. Eu queria era viajar mais, pelo menos 20 semanas no ano, para acompanhar o pessoal de perto. Essa é a forma correta de se trabalhar”, completou o ex-capitão.
Ao falar sobre as várias reuniões que teve com a CBT, Meligeni confirmou que o problema não apareceu da noite para o dia, mas foi crescendo assim que a entidade “falhava” em cumprir os ideais da comissão técnica. Outro motivo lembrado por Meligeni foi a decisão de jogar o confronto de setembro contra a Suécia, pela repescagem da Davis, em Belo Horizonte.
Segundo era sabido na época, tanto capitão como jogadores preferiam sede ao nível do mar, com o máximo de calor possível, para que o jogo ficasse mais lento e favorável ao grupo brasileiro. A respeito da mudança e da sede em local alto e não tão quente, admitiu ter saído insatisfeito, apesar de ter relevado as divergências na época a pedidos do próprio presidente da CBT, Jorge Lacerda Rosa.
“Não que fosse mudar muito jogar no nível do mar, com 40 graus. Mas poderia ter ajudado. Aí entra as questões do ‘se isso, se aquilo’. O problema é que a parte técnica quem tem que decidir é o capitão, junto dos jogadores. E isso nem sempre foi respeitado. Mas a derrota não foi por causa do local e não foi só por isso que eu saí. Foi um agravante”, explicou ele.
Ao mesmo tempo, negou que problemas financeiros com a entidade tenham sido o principal motivo para sua saída, apesar de confirmar atrasos em pagamentos de “prêmios” pelas campanhas vitoriosas desde 2005. “Nunca tive um salário fixo, mas a gente recebia pelos confrontos. Mas isso foi o de menos. Ele podia até atrasar, mas sempre pagou. E a gente entendia os motivos”, explicou.
Apesar de garantir que sai “muito triste” do cargo, Meligeni é taxativo ao comentar sobre a possibilidade de voltar atrás na decisão. “É uma decisão irreversível. Como falei, não foi da noite para o dia. Pensei bem antes e só aceitaria falar nisso de novo daqui a um bom tempo. Mas para isso teria que mudar muita coisa, ter um projeto novo e coisas concretas, não promessas”.
Ao deixar o cargo de capitão, o ex-profissional abre ainda outra questão: a escolha do novo capitão para 2007. Neste ponto, cita nomes que teriam consenso por parte dos jogadores, o que é considerado primordial por eles e que o próprio Fininho tinha. Por outro lado, segue na linha crítica e faz ressalvas ao trabalho do futuro comandante.
“Temos bons nomes que poderiam assumir, como o Larri (Passos, técnico de Gustavo Kuerten), o (Ricardo) Acioly (ex-capitão), o (Tomaz) Koch e o Jaime (Oncins, ex-capitão). Mas para eles irem bem precisariam ter condições e seria antiético já sair comentando agora sobre isso. Mas repito: não é só sentar e comandar. Tem que ter trabalho, plano”, completou.
Longe da Davis, Meligeni não admite deixar o tênis de lado. Para isso se organiza em “projetos pessoais”, como assinou no comunicado. Entre eles estaria a continuação da Copa Fino, torneio para jovens revelações, e até mesmo o sonho em voltar à televisão, já que teve passagens como apresentador na MTV.
Saída sem mágoas
Ex-número 25 do ranking mundial, semifinalista de Roland Garros e campeão Pan-americano em 2003, Fernando Meligeni escreveu seu nome na história do tênis brasileiro. Conhecido pela raça e dedicação dentro da quadra, tornou-se aos poucos um dos mais influentes nomes no meio.
Entre 2004 e 2005, em meio à crise da CBT enquanto presidida por Nelson Nastás, bateu o pé ao lado do grupo de Gustavo Kuerten e participou do boicote à Davis, um dos vários motivos que ajudaram a derrubar o ex-presidente e a colocar Jorge Rosa no comando. Agora, porém, sai disparando exatamente contra o dirigente que defendeu, apesar de garantir não ter diferenças pessoais com ele.
“Eu saio na boa. Ele não é um filho da p…, a gente sempre se deu bem. O que acho é que se poderia fazer mais na CBT e para isso era preciso ter mais organização. O trabalho poderia ser melhor, sem dúvida”, finalizou Meligeni.