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Edição pandêmica do Oscar tem safra de filmes mornos

A Covid-19 chacoalhou o setor cinematográfico e vem, há meses, adiando estreias, interrompendo gravações e fechando salas

Redação Jornal de Brasília

24/04/2021 9h21

Leonardo Sanchez
São Paulo, SP

Em momentos de guerras ou crises, eventos anuais costumam carregar, ao lado do número de determinada edição, um asterisco que aponta que aquele foi um ano atípico, o que pode ter interferido na realização ou no desfecho daquele festejo.


De certa forma, a 93ª edição do Oscar, que acontece na noite deste domingo, também levará consigo a marca –porque será realizada dois meses mais tarde que o habitual, porque filmes exibidos apenas no streaming estão elegíveis, porque a cerimônia não será totalmente presencial e, talvez, porque daqui a alguns anos muitos de seus indicados caiam para sempre no esquecimento.


A Covid-19 chacoalhou o setor cinematográfico e vem, há meses, adiando estreias, interrompendo gravações e fechando salas. Esse cenário fez com que uma safra de filmes relativamente modestos, introspectivos e de pouco apelo popular chegasse às disputas principais do prêmio da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, sem mobilizar torcidas apaixonadas.


Grande favorito à estatueta de melhor filme, “Nomadland”, de Chloé Zhao, é prova da fuga de padrões deste ano. Estrelada por Frances McDormand, a produção tem grandes chances de abocanhar também as láureas de direção, atriz e roteiro adaptado. Ao todo, são seis indicações.


Além de McDormand, o elenco é basicamente formado por amadores e não há muito acontecendo em cena além das belas paisagens do interior dos Estados Unidos e da jornada intimista, silenciosa da protagonista. A lentidão com que sua narrativa avança serve de retrato do próprio ano de cinema pandêmico.


“Nomadland” foi um filme que custou e arrecadou apenas cerca de US$ 5 milhões, ou R$ 27 milhões –o que faria dele, com folga, o vitorioso de menor bilheteria e, após “Moonlight”, com o menor investimento do século. No ano passado, ele venceu o Leão de Ouro em Veneza. Se confirmar o favoritismo no Oscar, terá sido o terceiro filme nos 77 anos de história do festival italiano a conquistar a dobradinha.


Seria uma vitória atípica, mas o mesmo é verdade para quase todos os seus concorrentes. “Bela Vingança”, por exemplo, pertence ao subgênero de pouco prestígio “rape revenge”, em que vítimas de estupro buscam retaliação.
É importante não tirar o mérito da diretora Emerald Fennell, mas seria difícil que ela chegasse ao Oscar em anos anteriores –a presença de Jennifer Coolidge no elenco reafirma isso. Também jogou a seu favor a era MeToo. Numa Hollywood abalada pelos abusos cometidos por gente como Harvey Weinstein, o entusiasmo em torno de “Bela Vingança” parece ser sintomático.


O longa concorre ainda em cinco categorias e tem chances em atriz, para Carey Mulligan, e roteiro original. Sua diretora e Chloé Zhao são a sexta e a sétima mulheres na história a disputar em melhor direção –pela primeira vez duas são indicadas no mesmo ano. Zhao, chinesa, deve levar a estatueta e se juntar a Kathryn Bigelow no restrito clube das que receberam o prêmio.


Além deles, estão no páreo de melhor filme “O Som do Silêncio” e “Minari”, com seis nomeações cada um e com protagonistas de ascendência asiática que conquistaram a marca de terceiro e quarto indicados a melhor ator de tal origem. Riz Ahmed, de “O Som do Silêncio”, é ainda o primeiro muçulmano na categoria.


“Minari” acompanha uma família sul-coreana nos Estados Unidos, reforçando a onda de cultura coreana no Ocidente um ano após “Parasita” levar o Oscar de melhor filme. O novo longa está cotado para vencer em atriz coadjuvante, graças a Youn Yuh-jung.


Já “Judas e o Messias Negro”, também com seis indicações, levanta a bandeira racial ao acompanhar um homem que se infiltra nos Panteras Negras. É o primeiro longa só com produtores negros a concorrer em melhor filme.


Além desse, um outro ponto interessante é que seus dois atores, Daniel Kaluuya e Lakeith Stanfield, estão indicados em ator coadjuvante, o que fez muita gente se perguntar se a trama, portanto, não tem atores principais. A presença da dupla na categoria é resultado das cuidadosas estratégias dos estúdios para emplacar indicações que seus astros têm mais chance de vencer –pouco importa quem fica mais tempo na tela.


Todos os anos, essa discussão ressurge e, desta vez, ela atinge “Judas e o Messias Negro”, “A Voz Suprema do Blues” e “Uma Noite em Miami”, este último com um quarteto que está sempre junto em cena, mas que foi dividido na hora de tentar nomeações –no fim, só a de Leslie Odom Jr., em coadjuvante, vingou.


As categorias de atuação, aliás, trouxeram um recorde. Nove artistas de etnias sub-representadas ocupam as 20 vagas dessa seção, o maior número da história. É possível que, pela primeira vez, as estatuetas de ator, atriz, ator coadjuvante e atriz coadjuvante pertençam todas a não brancos.


De volta à lista de esperançosos a melhor filme, temos, é claro, os chamados “filmes de Oscar”. Com seus elencos estelares, diretores celebrados, fatos reais e temáticas caras ao liberalismo hollywoodiano, eles marcam presença todos os anos, inclusive neste, por mais atípico que ele seja.


Vez ou outra, esses longas se saem bem, como pode ser o caso de “Mank”, o campeão de indicações, com dez, e de “Os 7 de Chicago”, com seis. O primeiro deles fala sobre a própria indústria cinematográfica, o que costuma agradar à Academia. Ambos são da Netflix e, caso vençam, podem representar um ponto de virada para o streaming no Oscar.


Fechando a lista, “Meu Pai” preenche a cota de filme britânico encabeçado por um veterano desta edição. Alguns acreditam que seu astro, Anthony Hopkins, tem chances de tirar o Oscar póstumo de melhor ator de Chadwick Boseman, que em “A Voz Suprema do Blues” faz um papel que alguns consideram mais coadjuvante do que principal.


A Academia tem dois caminhos para trilhar neste domingo –o da tradição ou um novo, cria do MeToo e do Black Lives Matter, recheado de marcas históricas a serem alcançadas, mesmo que elas estejam atreladas às especificidades de um ano em que o cinema não funcionou como o habitual.

PRINCIPAIS INDICADOS


Melhor filme
‘Nomadland’
‘Os 7 de Chicago’
‘Minari’
‘Bela Vingança’
‘O Som do Silêncio’
‘Meu Pai’
‘Judas e o Messias Negro’
‘Mank’

Melhor direção
Chloé Zhao, ‘Nomadland’
Lee Isaac Chung, ‘Minari’
Emerald Fennell, ‘Bela Vingança’
David Fincher, ‘Mank’
Thomas Vinterberg, ‘Druk – Mais uma Rodada’

Melhor atriz
Carey Mulligan, ‘Bela Vingança’
Frances McDormand, ‘Nomadland’
Andra Day, ‘The United States vs. Billie Holiday’
Viola Davis, ‘A Voz Suprema do Blues’
Vanessa Kirby, ‘Pieces of a Woman’

Melhor ator
Chadwick Boseman, ‘A Voz Suprema do Blues’
Anthony Hopkins, ‘Meu Pai’
Riz Ahmed, ‘O Som do Silêncio’
Steven Yeun, ‘Minari’
Gary Oldman, ‘Mank’

Melhor atriz coadjuvante
Youn Yuh-jung, ‘Minari’
Olivia Colman, ‘Meu Pai’
Glenn Close, ‘Era uma Vez um Sonho’
Maria Bakalova, ‘Borat: Fita de Cinema Seguinte’
Amanda Seyfried, ‘Mank’

Melhor ator coadjuvante
Daniel Kaluuya, ‘Judas e o Messias Negro’
Leslie Odom Jr., ‘Uma Noite em Miami’
Sacha Baron Cohen, ‘Os 7 de Chicago’
Lakeith Stanfield, ‘Judas e o Messias Negro’
Paul Raci, ‘O Som do Silêncio’

Roteiro original
‘Os 7 de Chicago’
‘Bela Vingança’
‘Minari’
‘O Som do Silêncio’
‘Judas e o Messias Negro’

Roteiro adaptado
‘Nomadland’
‘Uma Noite em Miami’
‘Meu Pai’
‘Borat: Fita de Cinema Seguinte’
‘O Tigre Branco’

As informações são da Folhapress

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