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Análise: ‘A série acabou quando as relações ficaram mais sérias’

Friends acertou em cheio com seus seis encantadores protagonistas numa das séries mais bem escaladas de toda história da TV

Redação Jornal de Brasília

23/05/2021 7h51

Por Jacqueline Cantore*

Desde as primeiras reuniões com a NBC em 1993, David Crane e Marta Kauffman, cocriadores de Friends, prometiam uma série sobre aquela fase da vida quando “os amigos formam sua família”. Foi a premissa que estabeleceram no primeiro episódio, no ar em setembro de 1994, e que mantiveram pelos dez anos seguintes em 236 episódios inéditos. No primeiro episódio, Rachel Greene abandona o noivo ortodontista no altar e vai encontrar a amiga Monica Geller num café em Nova York, onde também estão o irmão dela, Ross, e os amigos Joey, Chandler e Phoebe. Todos entre 24 e 26 anos. Ela se muda para o apartamento da amiga e todos a convencem a renunciar os cartões de crédito pagos pelo pai e viver “na vida real”, que Mônica também explica ser “um saco, mas que ela vai adorar”. A partir dali, toda quinta-feira passamos a acompanhar as dores e delícias deste grupo de seis jovens se virar no amor, no trabalho e na “vida real”, numa época em que o futuro é enorme, tudo é possível e os perrengues são enfrentados com o apoio dos amigos.

Uma sitcom só faz sucesso se seus personagens provocarem empatia e algum engajamento emocional com quem assiste. Friends acertou em cheio com seus seis encantadores protagonistas numa das séries mais bem escaladas de toda história da TV. Seis atraentes e competentes atores, com timing de comédia perfeito, cabiam naquelas personagens como tubinhos de lycra: nada fora do lugar. Jennifer Aniston, Courtney Cox, Lisa Kudrow, Matthew Perry, David Schwimmer e Matt LeBlanc encarnavam jovens que a audiência podia e queria ter como amigos. Sim, queríamos comer na cozinha de Monica, ouvir Phoebe cantar no metrô, viver no mesmo prédio de Chandler e Ross, ter o cabelo de Rachel, rir da burrice de Joey. A familiaridade foi imediata, embora só nos víssemos uma vez por semana.

A série foi ao ar quando parávamos para ver televisão, todos na mesma hora, sem distração de outras telas, para depois comentar o episódio no dia seguinte. Tínhamos um compromisso semanal com aqueles “amigos”. O texto, fruto de 14 roteiristas muito engraçados e de histórias de vida diversas, era afinado diante de uma plateia ao vivo. Friends inovou na medida que transformou um grupo de amigos em família, com dois deles vivendo o perene arco de casal potencial, “será que eles vão ou não vão?”. Mesmo que de forma tosca, também trouxe temas inéditos para a TV até então, como casamento gay, relacionamento inter-racial, barriga de aluguel, adoção, infertilidade e a rejeição de um pai trans. Sempre com o viés de comédia, o que torna tudo mais palatável. A crítica mais frequente hoje em dia é com a falta de diversidade do elenco e piadas gordofóbicas e transfóbicas. Datadas, sim, mas fruto dos anos 90, quando a época era outra e até um real valia o mesmo que um dólar.

Friends continua fazendo sucesso, onde quer que vá ao ar. A Netflix pagou US$100 milhões para exibi-la de 2015 a 2019 e a Warner Media certamente não vai largar deste que será um dos pilares de seu serviço de streaming. É fácil de assistir. Um grupo de adultos faz graça inofensiva, com temas universais e de conexão instantânea. Não tem bala, droga, sangue, insulto, tensão. Existe até um termo em inglês para este tipo de série: lean back, que é o que o espectador faz quando está assistindo – relaxa.

Quando Rachel, Phoebe, Monica, Joey, Ross e Chandler passaram a ficar mais sérios em seus relacionamentos e ter outras prioridades que não seus amigos, a série acabou. A própria cocriadora da série Marta Kauffman, que veio ao Brasil em 2013 a convite da Globosat, deixou muito claro que nunca haveria um filme derivado de Friends e muito menos um remake. Quando estas personagens começam a ter filhos e formar suas próprias famílias, a premissa da série acaba, vira outra coisa. Até mesmo o especial da HBO Max não será sobre como vivem as personagens hoje em dia. Todos já passaram dos 50 e a restritiva cultura do politicamente correto impera. Sem falar que o dólar já vale quase seis vezes mais que o real.

Assista ao trailer de Friends: The Reunion abaixo:

https://www.youtube.com/watch?v=HRXVQ77ehRQ

*Jacqueline Cantore é executiva de televisão, co-autora do livro Séries (Objetiva)

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