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Economia

Petrobras acelera a venda de ativos e mira dividendo a acionista

Sindicatos de petroleiros criticam que tanto os dividendos quanto os bônus da diretoria estão atrelados à venda de ativos

Redação Jornal de Brasília

19/10/2020 13h56

FILE PHOTO: People walk in front of the Brazil’s state-run Petrobras oil company headquarters in Rio de Janeiro, Brazil, October 16, 2019. Picture taken October 16, 2019. REUTERS/Sergio Moraes/File Photo

Nicola Pamplona 
Rio de Janeiro, RJ

Entre janeiro de 2019 e julho de 2020, a Petrobras abriu 48 processos de vendas de ativos, uma média de 2,5 por mês. O número é bem maior do que os 1,4 por mês abertos durante o governo Michel Temer e oito vezes os 0,4 por mês verificados na segunda gestão Dilma Rousseff.

A estatística, elaborada pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos), retrata a principal mudança estratégica na companhia sob o comando do economista Roberto Castello Branco, nomeado pelo presidente Jair Bolsonaro para presidir a estatal.

Elogiada pelo mercado e criticada por sindicatos e pela oposição, a gestão Castello Branco acelerou um processo de reposicionamento da empresa, que abandona negócios considerados não prioritários, incluindo energias renováveis, e foca cada vez mais no pré-sal. A mudança ganhou respaldo legal no início do mês, quando o STF (Supremo Tribunal Federal) autorizou a empresa a criar subsidiárias para vender, em processo que tinha como alvo principal o processo de venda de 8 de suas 13 refinarias.

Sob o argumento de que não gera caixa suficiente para reduzir dívida e investir no pré-sal, a empresa diz que deve abrir mão de operações menos rentáveis. “O pré-sal é um ativo que a gente sabe gerir melhor do que qualquer outro”, diz o gerente executivo de Estratégia da companhia, Rafael Chaves. O plano prevê uma empresa mais focada na região Sudeste, com suas atenções voltadas principalmente para os campos de petróleo na costa do Rio e São Paulo e mantendo apenas as refinarias nos dois estados.

“Estamos escolhendo ativos de classe mundial. Por exemplo, o parque de refino de SP é próximo da oferta do petróleo, é próximo do mercado consumidor e próximo também da logística. Às vezes as pessoas associam à localização geográfica, mas não é questão de preferência”, diz.

Defensor da privatização da Petrobras, Castello Branco esteve no conselho de administração da companhia durante o governo Temer, mas deixou o cargo por discordar do ritmo das mudanças -o plano de venda de refinarias de Pedro Parente, por exemplo, incluía apenas quatro unidades.

Egresso da Vale, trouxe para a sua gestão executivos da mineradora, como a diretora financeira, Andrea Marques de Almeida, e o diretor de Logística, André Chiarini, montando a diretoria com menor proporção de executivos de carreira da história recente.

E, assim como a Vale, o mercado espera que a Petrobras se torne uma boa pagadora de dividendos assim que equacionar sua dívida. No fim de 2019, a estatal aprovou política que amplia os valores distribuídos aos acionistas quando a dívida estiver abaixo de US$ 60 bilhões. No segundo trimestre eram US$ 71,2 bilhões.

Além do mínimo previsto em lei, de 25% do lucro líquido, a nova política prevê distribuir ainda 60% da diferença entre o fluxo de caixa operacional e os investimentos. O mercado espera que a meta de dívida seja atingida já em 2021, o que tornaria a Petrobras uma “máquina de dividendos”, nas palavras dos analistas do BTG Pactual.

Castello Branco tem repetido que a Petrobras remunera mal o acionista e costuma citar que o governo é o principal deles. Sua gestão melhorou também a remuneração dos executivos, com um novo plano de remuneração variável que pode dar até 13 salários ao presidente da companhia no caso de cumprimento das metas de desempenho.

Sindicatos de petroleiros criticam que tanto os dividendos quanto os bônus da diretoria estão atrelados à venda de ativos. “A diretoria é premiada com recursos financeiros a partir do momento em que ele consegue cumprir metas de privatizações que serão maléficas para a própria empresa no futuro”, diz o diretor da FUP (Federação Única dos Petroleiros), Deyvid Bacelar.

A categoria afirma que a venda de refinarias reduz capacidade de se apropriar de margens de lucro sobre os combustíveis em períodos de petróleo barato. E questiona a retirada de energia renováveis do plano de investimento. “A Petrobras ia ser uma empresa de energia, mas agora quer ser uma empresa de commodities”, diz Bacelar.

“Já estamos atrasados em energia renovável e me parece um equívoco a Petrobras não estar articulada com essa discussão”, diz o economista Ricardo Balistiero, coordenador do curso de Administração do Instituto Mauá de Tecnologia. Balistiero diz ser favorável ao maior foco no pré-sal, mas questiona a possibilidade de criação de subsidiárias para venda de ativos sem o aval do Congresso. “A decisão não pode ficar na mão dos 11 juízes do STF”, avalia.

Para o economista do Dieese, Cloviomar Cararine, a redução do papel no refino indica maior força política do governo Bolsonaro. “Pedro Parente encontrou mais dificuldades [para vender ativos], tanto por questões políticas quanto por questões legais. Mas Temer tinha um peso político bem menor do que o Bolsonaro.”

Ele ressalta que há um alinhamento entre a estratégia e o “pensamento liberal” da área econômica do governo, que trabalha para abrir, entre outros, os setores de refino e gás natural. A proposta de sair definitivamente da BR Distribuidora, por exemplo, seguiria esse raciocínio.

Assim como a saída de estados do Nordeste, que gerou a campanha “Fica Petrobras”, e o corte de patrocínios culturais, outra marca da gestão Castello Branco. “A Petrobras é uma empresa estatal, não é uma empresa privada. E como estatal, ela tem que cumprir certos papéis”, diz Cararine.

O gerente de Estratégia da estatal nega que a meta seja reduzir o tamanho da empresa. “Não é uma empresa menor. Dependendo da métrica, a Petrobras está se tornando maior”, afirma, dizendo que o investimento previsto no maior campo do pré-sal Búzios, por exemplo, é maior do que o valor do desinvestimento no refino.

Ele argumenta que o volume de investimentos da empresa nos próximos anos vai depender do tamanho da venda de ativos. Sobre as energias renováveis, afirma que a empresa precisa antes adquirir competência e tecnologia. “Quando formos os melhores nisso, podemos entrar.”

Depois de episódios polêmicos no início da gestão -como a indicação de um ex-candidato apoiado por Bolsonaro para cargo que ele não poderia ocupar ou o recuo em reajuste do diesel que levou a empresa a perder R$ 32 bilhões em valor de mercado -a gestão é hoje vista pelo mercado como independente.

As informações são da Folhapress

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