Menu
Coluna do Aquiles

E agora estou eu aqui comovido…

Arquivo Geral

01/11/2017 11h46

A precisão do encadeamento do repertório induz à emoção. Fechando o disco, a cantatriz recita um trecho da última entrevista concedida pelo poeta espanhol Federico García Lorca (1898-1936): “(…) En este momento dramático del mundo, el artista debe llorar y reír con su pueblo. Pero antes que esto, somos parte del mundo y hermano de todos”.

E agora estou eu aqui a me perguntar: o que nasce quando se junta uma cantante/atriz com a voz tão livre quanto uma pluma ao vento e um pianista com dedos que são como asas a fazer com que as notas voem? Um álbum dilacerante, da cantatriz Fabiana Cozza e do pianista cubano Pepe Cisnero. Eles que uniram seus talentos para homenagear o pianista, cantor e compositor Bola de Nieve (1911- 1971).

E assim nasceu Ay Amor! (Biscoito Fino), tributo àquele que foi/é um dos maiores músicos cubanos, gravado meses depois do fim do espetáculo “Cant Teatral para Bola de Nieve”, do qual Cozza participou. Os dois trabalhos foram idealizados por Elias Andreato – ele que junto com Cozza garimpou o repertório do álbum.

Antes de ouvir o CD, a emoção estava quieta num canto dos meus sentidos. Aí vêm as faixas 1, 2, 3… deixando-me comovido, posto que Cozza e Cisnero, gêmeos exuberantemente univitelinos, amalgamaram-se e geraram um clássico CD musical/teatral.

Os arranjos e a direção musical são de Cisnero. Com intros e intermezzos da mais fina inspiração, seus arranjos contemplam as músicas com dinâmicas e sequências harmônicas elevadas ao grau máximo. Um craque!

Cozza está melhor do que nunca. Meu Deus! A dramaticidade envolve de tal maneira o seu cantar, que temos medo que vá cortar os pulsos. Tão dilacerante é sua interpretação, que resta a nós sorver cada nota emitida como se fosse uma gota brilhante caída do céu. Tanto os graves como os agudos estão presentes a cada vez que a melodia exige algo mais. Afinada, sua verve musical extrapola o canto, deságua na teatralidade e nos chega íntegra.

Antecedido por outro texto de García Lorca, o bolero “Canción de la Barca” (Ignacio Villa) abre o álbum. Em momentos arritmos, a voz de contralto de Cozza soa com vigor.

“Devuelveme Mis Besos” (María Grever) tem intro suave e também andamentos arritmos. Cozza arrasa!

“Es Tan Difícil”, segundo o encarte, é de John Lennon. Desconfiado da informação, fui xeretar na internet. Até que o blog do jornalista Antonio Carlos Miguel dirimiu a dúvida: “Es Tan Difícil” é de Bola de Nieve e José Sabre Marroquin.

“Ay Amor!”, que dá título ao CD, mostra o quanto de precisão tem os agudos de Cozza. O fecho é com um trecho de “Verlaine” (Lorca).

Mais à frente, “Drume Negrita”, um bolero/canção de ninar, tem intro e intermezzo com a marca Cisneros de qualidade.

Até que “La Vie en Rose” (Louiguy e Édith Piaf) – em categórica interpretação dos dois – conclui o CD. E é aí que Fabiana Cozza narra o tal trecho da entrevista de Garcia Lorca que inicia este texto.

E agora estou eu aqui (ainda mais) comovido…

Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado