Por Leonardo Resende
@leonard0resende
Muito teóricos do cinema classificam o surrealismo como uma narrativa de extrema limitação. Existe a liberdade visual, porém dentro um filme, o visual não se sustenta sem uma construção lógica e compreensível de narrativa. Ou seja, é necessário que toda essa montagem eloquente seja justificada dentro do roteiro. Em outros termos, precisa fazer sentido.
Para fundamentar esse recurso, Holy Motors, de Leos Carax, exibido e aplaudido em Cannes em 2012, se sustenta no discurso do ciclismo da arte no mundo contemporâneo.
A obra acompanha a história de Sr. Oscar, um artista que se transforma em diversos personagens ao longo do filme. Essa mutação é embasada: Carax ridiculariza a arte como um objeto de mudança constante e o protagonista é a prova disso. É incontável os momentos que Oscar muda de figurinos, rostos e feições. De grotesco ao curioso, presenciar essas modificações é estupendo, simbolizando como existe a mutação da arte em prol do mercantilismo. Expôr esse argumento na sétima arte – um dos meios mais explorados para converter a arte em comércio – é um simbolismos mais espetaculares na película de Carax.
São raros os diretores que conseguem trabalhar com elementos opostos. Diametralmente, o diretor consegue ridicularizar a arte e consequentemente a homenagear. Vide a cena em que Sr. Oscar deita nu sobre o corpo de uma modelo, fazendo releitura à Pietá, de Michelangelo (foto).
Esses momentos bipolares de Holy Motors não apenas segura o filme, como o transcende para uma obra essencial sobre cinema de arte. Pincelando entre o lúdico e o curioso, o longa-metragem é genial, fazendo, em algum lugar do céu, Salvador Dalí suspirar de alívio.