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Brasília

VEP autoriza retorno de visitas aos presídios; sindicato reage

Sindpen não recebeu bem a notícia e teceu críticas à vara; com 1.815 casos confirmados, Sistema Penitenciário vive estabilidade dos casos da covid-19

Olavo David Neto

14/09/2020 10h20

Depois de seis meses e dois dias, os internos do Sistema Penitenciário do Distrito Federal poderão novamente receber visitas de familiares e amigos. Na quinta-feira (10), a Vara de Execuções Penais (VEP) acatou os protocolos do novo secretário de Administração Penitenciária, Agnaldo Novato, e autorizou a entrada de visitantes a partir da próxima quarta-feira (16). Na mesma decisão também foram autorizadas, já a partir de hoje, as atividades externas de detentos para atividades profissionais e saídas temporárias – saídas para estudo externo continuam suspensas.

Os horários de visitas serão escalonados a partir dos blocos nos quais estão reclusos os detentos, com janelas de uma hora, a partir das 9h até as 15h, e cada preso terá direito a apenas uma visita por vez. Pessoas que componham grupos de risco, como idosos, gestantes, lactantes, menores de 12 anos, portadores de comorbidades ou indivíduos sintomáticos continuam impedidos de adentrar nas dependências do Sistema Penitenciário. Não será permitido contato físico entre visitantes e internos, e os banheiros e as cantinas dos pátios – onde ocorrem as visitações – ficarão fechados.

É obrigatório uso de máscaras brancas e não serão permitidos ambulantes nas áreas externas dos presídios. De acordo com a resolução da VEP, a Secretaria de Administração Penitenciária (Seape) deve publicar no portal da pasta as medidas de segurança apresentadas à juíza Leila Cury. Continuam suspensas as visitas no Centro de Detenção Provisória (CDP) II, na Divisão de Controle e Custódia de Presos (DCCP), utilizados como local de quarentena para novos presos, e na Ala de Tratamento Psiquiátrico (ATP), pela “vulnerabilidade do público em cumprimento de medida terapêutica”.

Com cerca de 15 mil detentos – quase o dobro da capacidade, estimada em 7.500 apenados -, os cárceres do DF notificaram o primeiro caso de covid-19 em 20 de abril. Desde então, segundo o Governo do Distrito Federal (GDF), as contaminações deram um salto e abriram maio com 265 confirmações. No último dia daquele mês, já eram 759 infectados. A onda de contágio manteve-se alta em junho, que registrou 765 diagnósticos no dia 1º e fechou o primeiro semestre com 1.348 infecções.

Apenas em agosto a situação arrefeceu no sistema carcerário. Em 30 dias, apenas 86 registros de covid-19 entre os detentos, e já neste mês, até o fechamento desta reportagem, foram somente 23 casos. No domingo (13), o total de notificações não apresentou aumento em relação ao dia anterior, e apresenta 1.817 confirmações. Os números do GDF não contabilizam infecções em policiais penais, que, segundo o Sindicato dos Policiais Penais (Sindpen/DF), afetou de 30% a 35% da categoria.

De abril até o fim do semestre, foram 1.348 casos de infecção da covid-19 no sistema prisional. Foto: Gaucio Dettmar/CNJ

Sindpen ataca decisão da VEP

Há um único óbito entre os agentes de segurança, mas, de acordo com Paulo Rogério da Silva, presidente da entidade, “três outros escaparam pela misericórdia de deus”. Ele também criticou a mudança de postura da Seape, que, segundo diz, deu-se de forma arbitrária. “Não é comum que eles perguntem, apenas impõem as decisões goela abaixo da categoria”, ataca o sindicalista. “As decisões são tomadas no ar-condicionado, por quem nunca pisou num presídio”, acrescenta Silva. “Foi um sacrifício para estabilizar os casos, e agora eles reabrem sem muito cuidado”, aponta.

O líder sindical ressalta que não é contrário à visitação, que entende como direitos dos detentos, mas frisa que não há possibilidade de se cumprir à risca os protocolos indicados pela Seape e acatados pela VEP. “Dizem que não pode haver contato, e o policial penal vai fazer o quê? Dar um tiro no preso e na visita?”, ironiza. “É uma decisão temerária, até porque os policiais não têm mais o hotel para se instalar, e vão voltar para as famílias com risco de infecção”, lembra Silva.

Famílias vêem permissão para visitas com alívio

“A última vez que eu vi meu filho foi em 28 de fevereiro”, diz Mariluce Gomes, 46. Condenado por três crimes diferentes, João Lucas, 26, recebeu a última visita familiar em 11 de março, quando parentes de Gomes foram ao presídio no lugar da mãe, que precisou trabalhar. “Depois disso, só o advogado”, revela a auxiliar de serviços gerais. Segundo contou ao Jornal de Brasília, ela encaminhou mensagens para o filho num número disponibilizado para contato com os detentos, mas a resposta veio 40 dias depois.

Conforme mostrou ao JBr., várias tentativas de se inteirar da situação de João Lucas foram feitas. Uma carta recebida neste mês, em tese, traria o alívio. “Mandaram uma foto da carta em que ele dizia que não adoeceu, mas disse que estava tudo bem, assim”, conta Gomes. A comunicação, porém, trouxe desconfianças. “Tem muita rasura na carta, e eu não sei se foi dele ou de quem mandou a foto para mim”, preocupa-se. Ao menos duas linhas da comunicação estão riscadas, como atestou a reportagem.

Segundo ela, não houve comunicado às famílias de como proceder para as visitações. “Ainda não definiram ou publicaram como serão essas visitas, como faz para retirada de senhas, nada. Apenas anunciaram a data”, lamenta. Para o psiquiatra Alisson Marques, o retorno do contato presencial com os núcleros familiares é essencial para os detentos. “A família é pilar para qualquer tratamento, sobretudo quando se passa por uma situação tão precária quanto a que se observa no nosso sistema penitenciário”, aponta o especialista.

Mesmo que de maneira forçada, o período sem ver os parentes e amigos num momento de crise global pode gerar novas reflexões – e ajudar na ressocialização e no combate à reincidência. “Esse tempo afastado por causa da pandemia certamente levou a reflexões sobre relacionamentos familiares e possíveis mudanças de atitude”, explica. Procurada, a Secretaria de Administração Penitenciária não retornou os pedidos de entrevista da reportagem.

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