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Brasília

Transfobia: cartório dificulta registro de nome social

“Minha filha não precisa provar a ninguém que é uma mulher. Os funcionários do cartório não são juízes para fazer julgamentos”, diz a mãe da trans Taylor Barbosa

Larissa Galli Malatrasi

04/03/2020 5h58

Cartório no Guará-DF. Foto: Reprodução/Google Street View

Há aproximadamente um mês, a mulher trans Taylor Barbosa Conde tenta garantir seu direito e fazer o processo de mudança de nome. O impasse está no Cartório do Guará, 5º Ofício. Após reunir e apresentar toda a documentação exigida pelo Provimento nº 73 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que regulamenta a alteração de nome e sexo no Registro Civil das Pessoas Naturais (RCPN), a jovem de 20 anos se deparou com uma atitude que ela e a mãe, Suene Brasil, entenderam como transfóbica.

Segundo relato da mãe, os agentes do cartório não entraram em contato no prazo previsto de cinco dias úteis após a apresentação dos documentos, e só depois de muita insistência, foi informado que Taylor poderia seguir com o processo se aceitasse passar por uma entrevista para “convencer a equipe do cartório de seu real desejo pela mudança de nome”. Ao Jornal de Brasília, Suene contou que a entrevista foi “desgastante”, “pesada”, e que a tabeliã-substituta se referia a filha sempre no pronome masculino.

Mesmo com todos os documentos exigidos em dia, a tabeliã-substituta não “se convenceu”, afirmou que a mudança de nome seria “negada” e informou que passaria a decisão para responsabilidade do Tabelião Chefe.

“O cartório ainda pediu para que a gente juntasse mais documentos — que são facultativos, como receitas médicas e receitas hormonais — para tentar ‘convencê-los’ e disseram que minha filha passaria por outra sabatina de perguntas”, conta Suene.

“É um constrangimento muito grande para as pessoas trans. Taylor é estudante de psicologia, poliglota, estudiosa, quer se organizar para dar continuidade na vida e fazer cursos mas eles estão atrapalhando”, desabafou a mãe.

“Minha filha não precisa provar a ninguém que é uma mulher. Os funcionários do cartório não são juízes para fazer julgamentos”, completou.

Suene acredita que o cartório está protelando a resolução do caso de forma proposital — e isso é transfobia.

Suene Brasil levou o caso ao deputado distrital Fábio Félix, que é presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos, Cidadania, Ética e Decoro Parlamentar da Câmara Legislativa do Distrito Federal. O deputado encaminhou a denúncia ao Tabelião do cartório e à Delegacia Especial de Repressão aos Crimes por Discriminação Racial, Religiosa ou por Orientação Sexual ou contra a Pessoa Idosa ou com Deficiência (Decrin).

Na denúncia, Fábio Félix (foto) ressalta que o desrespeito a identidade de gênero pode caracterizar crime, de acordo com decisão do Supremo Tribunal Federal em 2019.

“É inaceitável esse tipo de conduta transfóbica por parte de agentes públicos. A decisão do STF é muito clara, a autodeterminação de gênero deve ser respeitada. A Comissão de Direitos Humanos acompanha o caso e presta toda a assistência a Taylor e Suene. Estamos de portas abertas para todas as pessoas que tenham seus direitos violados e seguiremos realizando o trabalho de prevenção e de combate à transfobia e à LGBTIfobia”, declarou.

Suene disse que o caso pode finalmente ser resolvido hoje, após uma reunião que está marcada para acontecer às 16h, dessa vez com a presença de uma Defensora Pública.

Procurado pela reportagem, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), responsável por fiscalizar a atividade dos cartórios do DF, informou que não tem conhecimento sobre o caso e que, para tomar as medidas cabíveis, a denúncia precisa ser feita por meio da ouvidoria do Tribunal. Até o fechamento desta edição, a Decrin não havia se manifestado a respeito do recebimento da denúncia e do andamento da investigação.

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