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Brasília

Resgate social pela música: Sem sede, projeto pede socorro

Orquestra de Cavaquinho com problemas financeiros e sucateamento dos instrumentos musicais

Lucas Neiva

10/12/2020 5h34

Criado em 2011, o projeto Waldir Azevedo ensina crianças e adolescentes da Vila Telebrasília (Asa Sul) e da Cidade Estrutural a dominar o cavaquinho, buscando criar oportunidades e manter os participantes afastados do uso de drogas no momento de ócio. O projeto já mudou a vida de milhares de pessoas desde a sua criação, mas hoje sofre com dificuldades: a pandemia provocou problemas financeiros que resultaram no sucateamento dos instrumentos e escassez de material. Mas a principal dificuldade que o movimento enfrenta hoje é a perda de sua sede.

O idealizador e coordenador do projeto foi o músico carioca de 39 anos William Oliveira, conhecido pelos alunos como Dudu Oliveira. A inspiração para a orquestra foi sua própria experiência no meio. “Eu participei de projetos sociais no Rio de Janeiro desde criança. Isso sempre foi a minha vida, sempre estive dentro do meio sociocultural. E quando vim para Brasília, decidi dar continuidade a isso”, narra.

O projeto começou na Vila Telebrasília. “A gente percebeu que ali na comunidade tinha essa demanda, esse espaço para a gente entrar atuando com ações de formação e capacitação cultural”, explica Dudu. Para dar início aos trabalhos, ele fez a aquisição de 15 cavaquinhos, e convidou as crianças moradoras da comunidade para aprender o instrumento no contraturno escolar.

Os alunos não são cobrados pelas aulas, e o projeto funciona a partir do apoio de voluntários e professores dentro e fora das comunidades onde atua. Ele já não atende mais apenas 15 alunos de cavaquinho, mas sim mais de uma centena de crianças que recebem aulas e participam de exibições de cavaquinho, violão, percussão com material reciclável, teoria musical, canto coral e reforço escolar.

Complicações financeiras

Desde 2015 o projeto recebe auxílio financeiro do GDF por meio do Fundo de Apoio à Cultura (FAC). O auxílio é suficiente para pagar os professores que participam das aulas, mas não é suficiente para manter um espaço físico. A solução encontrada por Dudu foi se mudar para uma casa na Vila Telebrasília, e utilizar o lar como sede da orquestra.

A solução funcionou no início, mas com o tempo se tornou insuficiente. “Quando se tem 20 alunos, é tranquilo. Mas quando sobe para 100 a 150 por semana e organiza oficinas de manhã, tarde e noite, a situação é outra. Os 300 reais de luz viram 600, a água duplica também”, afirma. O músico acrescenta que mesmo o valor do FAC não era suficiente para arcar com as despesas, muitas vezes surgindo a necessidade dele complementar com dinheiro de seu próprio salário.

Inicialmente ainda era possível contornar as dificuldades financeiras enfrentadas. “Quando a gente não tinha, eram ações como bazar, feijoadas e doações que a gente recebia que davam uma salvada”, explica. Mas a pandemia impediu o trabalho de Dudu e de diversos outros músicos de Brasília, tornando a situação insustentável. Depois de nove anos mantendo o projeto, o coordenador se viu obrigado a se mudar da Vila Telebrasília para conseguir manter o aluguel em dia, levando a orquestra a perder sua sede. “Uma hora eu tive que escolher: ou eu cuido da minha família ou eu cuido do projeto”, lamenta.

A pandemia também trouxe complicações no acesso ao FAC. “O Secretário da Cultura não mede esforços para ajudar a classe artística, mas o FAC não é suficiente para se manter um projeto social. E o trâmite é muito burocrático: o que seria emergencial para hoje só chega daqui a três, seis meses”.

Música que transforma

As dificuldades para manter o orçamento do projeto, para acessar o FAC e a perda da sede obrigaram Dudu a interromper as aulas até que a situação volte à normalidade. “O projeto a gente pode dar um tempo, a minha família não”, desabafa.

O coordenador afirma que, se conseguissem uma sede, o projeto poderia voltar a funcionar. “Uma sede resolveria a maior parte do nosso problema, eu diria que seria 80% disso. Agora os outros 20% a gente daria conta de resolver com ações e bazares para manter um projeto mesmo. Uma sede facilitaria tudo”.

“Esse trabalho de levar arte para a juventude despertou muita carreira. Tem muito menino que hoje toca profissionalmente e começou lá com o cavaquinho. Eu me sinto feliz porque pude fazer parte desse projeto, deixar minha marca lá”, relata o sambista e professor de percussão de 72 anos Luiz Antônio Jambeiro, que participou do projeto Waldir Azevedo desde sua criação.

Jambeiro entrou a convite do próprio Dudu Oliveira, e diz que o projeto teve forte impacto em sua vida. “Eu abracei aquela causa. Estava aposentado e voltei a me sentir útil. Ensinei percussão para os meninos, ensaiamos, fizemos um show muito bom no Clube do Choro que foi muito aplaudido. Era algo lindo”, conta.

O percussionista destaca a importância da proteção a projetos do tipo. “Acho que deve ser bem amparado pelas autoridades da área, porque é um projeto que só objetiva o bem estar da juventude e da adolescência, que forma meninos”.

Saiba Mais

“O projeto me influenciou bastante. Ensinou a dialogar melhor, tratar os outros com mais seriedade, a respeitar o próximo. Isso é algo que a música nos ensina. Nos faz absorver coisas boas”, afirma Marcos Emanoel de Andrade, 21 anos conhecido no meio artístico como Seu Manolo, ex-aluno do projeto que hoje é instrutor náutico e músico.

Marcos entrou no projeto aos 13 anos de idade. “Com o projeto, pude conhecer algo novo. Apresentamos em muitos lugares importantes como o Clube do Choro e a Embaixada da Alemanha”.

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