Menu
Brasil

Quilombolas pedem ao STF plano emergencial de enfrentamento à Covid-19

A ação solicita medidas urgentes de acesso à saúde, segurança alimentar e garantia de isolamento em suas comunidades

Redação Jornal de Brasília

22/09/2020 10h56

Diante do ocorrência e do agravamento dos casos de Covid-19 em comunidades quilombolas e da inequívoca vulnerabilidade a que elas estão expostas, a CONAQ decidiu acionar o Supremo Tribunal Federal (STF), no último dia 9, com uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), que obriga o Governo Federal a elaborar um plano emergencial de enfrentamento à pandemia para as comunidades quilombolas. A ação é um pedido urgente da CONAQ para garantir, em especial, o acesso à saúde, a promoção da segurança alimentar e a não realização de medidas relacionadas à questão territorial que possam impactar no isolamento das famílias, ampliando possibilidades de contágio.

Em caso de uma decisão favorável na ADPF, o Governo Federal terá prazo de 30 dias para desenvolver e implementar um plano nacional de combate aos efeitos pandemia. Entre os pedidos apresentados na ação, está a distribuição imediata de equipamentos de proteção individual (incluindo máscaras, água potável e materiais de higiene), medidas de segurança alimentar e nutricional, que incluam ações emergenciais de distribuição de cestas básicas, um plano logístico que viabilize acesso regular a leitos hospitalares e medidas de combate ao racismo a quilombolas no atendimento médico e hospitalar.

Neste momento, as comunidades quilombolas encontram-se entre as populações mais vulneráveis face a Covid-19. Segundo o último boletim epidemiológico, divulgado pela CONAQ no dia 4 de setembro, já são 4.541 casos confirmados, 1.214 casos monitorados e 157 óbitos, correspondendo a média de letalidade de um quilombola por dia. Além disso, a taxa de mortalidade da população quilombola por Covid-19 (3,6%) é mais alta que a média nacional (3,1%).

Esses e outros dados, apresentados na ADPF, evidenciam as diferentes dificuldades que as comunidades já vinham enfrentando antes mesmo da pandemia, mas que, neste momento, impulsionam a propagação do vírus. De acordo com o Ministério do Desenvolvimento e Combate à Fome (MDS), 75% da população quilombola vive na extrema pobreza, com pouco acesso a serviços públicos, e somente 15% dos domicílios têm acesso à rede pública de água e 5% à coleta regular de lixo.

No que diz respeito ao acesso aos serviços de saúde, 89% dos municípios com incidência quilombola não apresentam leitos de UTI, com redução gradual por municípios, chegando a apenas 40 leitos de UTI em todos os municípios com 30 ou mais localidades quilombolas (IBGE, 2019). O mais alarmante é que 67% das pessoas que dependem exclusivamente dos SUS são negras e negros, grupo que também possui incidência majoritaria de doenças agravantes para a Covid-19, como hipertensão, diabetes e doenças crônicas. Em estudo recente, realizado com as comunidades quilombolas da Amazônia Legal, com apoio da CONAQ e Ecam, os dados ganham ainda mais força quando nota-se que em 28,7% das famílias quilombolas há casos de hipertensão.

Já no que se refere a segurança alimentar, na mesma pesquisa, realizada com comunidades quilombolas da Amazônia Brasileira, constatou-se que 49% das famílias quilombolas têm como fonte principal a agricultura familiar, uma atividade atualmente prejudicada pela constante redução dos territórios tradicionais e pela dificuldade de escoamento da produção na pandemia. O que tem levado essas comunidades a precisarem urgentemente de recursos básicos, como cestas básicas e produtos de higiene.

Vale ressaltar que a quantidade de dados públicos referentes a situação das comunidades quilombolas é, atualmente, limitada, o que acaba configurando um cenário impreciso e repleto de casos subnotificados. Nesse sentido, a ADPF protocolada pela CONAQ visa justamente promover, pelas autoridades, a divulgação, controle e monitoramento dos dados sobre as situação das comunidades no acesso às política públicas. Busca também a efetivação da Lei 14.021, que institui medidas de vigilância sanitária e epidemiológica para prevenção do contágio da Covid-19 nos territórios de povos e comunidades tradicionais, entre elas, a notificação de casos confirmados entre quilombolas e sua ampla publicidade.

Esta é a primeira vez que a CONAQ assume a posição de parte numa ação judicial, defendendo sua legitimidade para representar as comunidades. Para a organização nacional não restou outro caminho, senão acionar o órgão máximo do Poder Judiciário para salvaguardar o direito dos quilombolas à sua própria existência.

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado