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Brasília

Desabamento na 210 Norte acende alerta a outras construções

Arquivo Geral

05/02/2018 6h30

Foto: Kléber Lima/Jornal de Brasília

Jéssica Antunes
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Amanhecia quando o estrondo ecoou, o chão se moveu e os alarmes dispararam no edifício do Bloco C da quadra 210 da Asa Norte: a laje da garagem subterrânea do prédio construído há quase meio século cedeu e esmagou 25 veículos. Por sorte, nenhum morador estava ali e não houve feridos. A suspeita é que a impermeabilização deficiente da estrutura tenha enferrujado e enfraquecido as ferragens, que não suportaram o peso da terra molhada por chuva intensa. O episódio acende o alerta para outras construções.

Existe uma planilha de reparos e manutenções mensais a serem feitas no prédio de 48 apartamentos. A síndica Mônica Kremer Evangelista, de 50 anos, afirma que tudo estava em dia, mas que não incluía a questão da impermeabilização do solo sobre a laje da garagem, que foi feita na época da construção. “Nunca tivemos nenhum caso de alagamento ou problemas na estrutura, nem com as chuvas mais fortes”, garante.

“A impermeabilização existia, mas estava deficiente. Quando ela falha, a água infiltra e chega às ferragens. Ao longo das décadas, com a ação da água, as peças enferrujam e enfraquecem. A sobrecarga natural da terra somada à chuva de cerca de 40 milímetros da madrugada pode ter causado o rompimento das partes corroídas que não conseguiram sustentar o peso”, explica o coronel Sérgio Bezerra, subsecretário de Defesa Civil.

Bezerra afirma que não houve qualquer sinal presente ou obser vado pelos moradores que indicassem risco iminente. “Esse tipo de problema acontece com falta de impermeabilização adequada. Isso é comum em prédios mais antigos, como os das Asa Norte e Sul, que têm a mesma estrutura. A recomendação é que façam manutenção”, avisa.

Laudos técnicos apontarão a causa do incidente. Um engenheiro, que mora no prédio, foi designado como responsável da avaliação e comandará a recuperação do local, além da retirada dos veículos atingidos, que dependerá de remoção mecânica do entulho. Toda a estrutura elétrica e hidráulica deverá ser feita e o reparo deve ser concluído em pelo menos seis meses. O seguro predial foi acionado. A apólice, de R$ 3 mil anuais, cobre desmoronamentos, mas as despesas dos carros devem ser arcadas pelos donos.

Foto: Kléber Lima/Jornal de Brasília

Sem água nem luz

A Defesa Civil constatou que não houve danos à estrutura do prédio e os moradores foram autorizados a voltar aos imóveis, mas os fornecimentos de água, luz, esgoto e gás encanado foram suspensos. Porém, alguns fizeram as malas e deixaram as residências até que isso fosse normalizado. A garagem continuará interditada.

Para o urbanista Frederico Flósculo, não há problemas de permeabilidade do solo em muitas das superquadras antigas, “mas nas mais valorizadas, com maior especulação imobiliária e expansão do subsolo, há problemas”. Isso porque a água que iria naturalmente para o solo fica sem caminho. O acidente, para ele, evidenciou um dos riscos.

Temor era de que o edifício fosse desabar

Nós sentimos o chão tremer”, contou Graziela Hollenbach. Seu carro não sofreu danos. Foto: Kléber Lima

“Sai que o prédio está desabando”, ouviu a servidora pública Graziela Hollenbach, 40 anos. Do outro lado da porta, estava uma vizinha que chegou ao prédio minutos antes de a laje ceder às 5h59. “Nós sentimos o chão tremer. Quando ela apareceu falando isso, descemos correndo como estávamos, de pijama mesmo”, conta. O cenário era de desespero.

O carro de Graziela estava na garagem, mas escapou dos danos. “Sem um arranhão, como se nada tivesse acontecido”, descreve. Isso porque o veículo estava do lado oposto ao da laje. “O susto foi muito grande”, diz a mulher, que mora há dois anos ali e garante que nunca houve nenhum tipo de incidente, alagamento ou rachaduras.

“Estávamos dormindo quando ouvimos um estrondo seguido de um barulho que parecia uma explosão”, conta a dentista Maria Clara, de 37 anos. O pai sentiu a cama tremer e o cachorro ficou desesperado. Pela janela, ela conta que não viu nada, mas, ao descer, se deparou com o carro da mãe completamente destruído sob a laje da garagem. “Na hora chorei, mas fiquei aliviada por ter sido apenas o carro. Poderia ter sido pior”, conta.

O veículo de Maria Clara era um dos 25 que tiveram perda total com o desastre. Apenas duas vagas daquele lado da garagem estavam vazias. O prejuízo dos moradores inclui veículos de luxo como um Jaguar avaliado em R$ 300 mil, em que o dono recentemente teria trocado o espaço com outro vizinho. Depois de uma contagem dos moradores, foi confirmado pelos bombeiros que não estava faltando ninguém. Ainda assim, três cães farejadores percorreram a área em busca de vítimas.

Ponto de vista

“É uma tragédia anunciada”, considera o engenheiro civil Eduardo Nóbrega de Oliveira. Para ele, a ausência de manutenção correta e de vistorias periódicas podem esconder possíveis falhas e culminar em tragédia. Ele acredita que possíveis infiltrações nas redes de águas pluviais podem ter acarretado em excesso de carga na estrutura com aumento da permeabilidade e da saturação do terreno.

Já o urbanista Frederico Flósculo não tem dúvidas de que o acidente pode se repetir, especialmente na Asa Norte. “Aquele prédio é de vanguarda, apesar da idade, porque tem uma garagem muito mais ampla que a laje sobre pilotis. Sobre a garagem colocaram jardim, com muita terra e plantas. Há blocos com áreas de subsolo três, quatro vezes maiores que a projeção do prédio”, comenta.

Saiba mais

A fachada do prédio passa por reforma. Desde outubro, o revestimento externo que começava a se soltar é reformado, mas, conforme os agentes de segurança, não deve ter qualquer relação com o incidente.

A orientação da Defesa Civil é que a manutenção da impermeabilização dos prédios seja feita regularmente, inclusive com remoção da terra e colocação de manta asfáltica para evitar que a água chegue às ferragens e fragilize a estrutura. Permeabilidade do solo é a propriedade que o solo apresenta de permitir o escoamento de água.

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