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Brasília

Agronegócio precisa respeitar limites do Cerrado, dizem professores

Como segundo maior bioma brasileiro (só menor do que a Amazônia), o Cerrado abriga espécies de animais e vegetações extremamente ricas

Agência UniCeub

09/09/2019 15h58

Pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB) estão pessimistas sobre os impactos do agronegócio no bioma Cerrado. Eles argumentam que a atividade gera consequências para a população e para a fauna. “Qualquer atividade agropecuária praticada que não considera os preceitos da sustentabilidade causa impacto nos recursos naturais”, afirmou o professor de agronomia Cícero Célio de Figueiredo.  

Como segundo maior bioma brasileiro (só menor do que a Amazônia), o Cerrado abriga espécies de animais e vegetações extremamente ricas. Segundo os professores , tratam-se de  mais de 10 mil espécies vegetais, uma grande variedade de vertebrados terrestres e aquáticos e um elevado número de invertebrados. ‘’O Cerrado é o bioma de contato com todos os demais brasileiros, interagindo intensamente a biodiversidade e o ciclo hidrológico. Nele encontram-se reservas minerais importantes e estratégicas de ferro-nióbio, níquel, calcário, fosfato, quartzito, entre outros”, explicou o professor Antônio Nobre, de agronomia e meio ambiente.

Foto: Otávio Nogueira / Gerais de Balsas / Divulgação

Por sua vez, esse bioma é o um dos que mais sofreram alterações com o passar do tempo no país. Atualmente, 50% da área está comprometida. As extensas planícies e uma região com rico recurso hídrico atraíram o olhar do agronegócio, que é o principal responsável pela situação em que essa vegetação se encontra hoje.

Efeito estufa

Dados levantados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que o Cerrado teve sua cobertura vegetal reduzida a quase metade, de 2.038.953 km² para 1.052.708 km²  nos últimos anos. “Entre os impactos causados, os mais graves são a redução dos estoques de carbono e de nitrogênio do solo e a elevação das emissões de gases de efeito estufa como CO2 e N2O; erosão das terras com impacto nos cursos d’água; degradação das nascentes de água; e redução da biodiversidade de plantas e animais”, explicou Antônio Nobre.

A ameaça ao bioma teve início nos anos de 1970, quando o Cerrado virou a principal área de produção de grãos do Brasil, trazendo ganhos econômicos ao país e um grande passivo ambiental, pela introdução de espécies invasoras, uso de agroquímicos e emissão de gases de efeito estufa. “O grau de responsabilidade é alto”, ressalta o professor Antônio Nobre. Ele esclareceu que o processo de ocupação com o desmatamento do Cerrado ocorreu primeiramente com a exploração predatória da madeira e a produção de carvão vegetal para siderurgia. “Seguido pela implantação de grandes monoculturas: pastagens artificiais, cultivos de grãos, cana-de-açúcar e reflorestamento, principalmente”, alertou.

Crise hídrica

Entre os anos de 2002 e 2011, a perda do Cerrado foi 2,5 vezes mais alta que a da Amazônia. Essa redução já apresentou consequências com a mais drástica crise hídrica da história do Brasil Central e as 176 espécies de animais ameaçadas de extinção. 

Para Cícero de Figueiredo, a depender do tipo de contaminação, os poluentes podem alcançar o lençol freático e contaminar as águas da região. “Os riscos mais iminentes para a população são a ingestão de alimentos e água com poluentes presentes em plantas e animais produzidos em áreas contaminadas. Dependendo do poluente, essa ingestão pode causar diversas doenças desde diarreias até problemas neurológicos graves.’’ apontou o professor. Uma preocupação do especialista é que essa contaminação pode impedir o desenvolvimento de plantas  e a “geração de áreas totalmente inóspitas para a vida vegetal e animal”.

Falta de lei

Ainda não existe nenhuma legislação que protege o Cerrado. “Existe projeto de lei para incluir o Cerrado e a Caatinga como patrimônios nacionais. Ademais, a nova lei florestal (No 12.651/2012) reduziu as exigências de proteção e recuperação das áreas de preservação permanente e de reserva legal”, afirmou Antônio Nobre. Ele reconheceu que faltam fiscalização, autuação e reabilitação de desmatamentos ilegais”, que são “instrumentos importantes’’, conforme acrescenta.

Convivência

Apesar dessas consequências, a atividade agropecuária, como vetor de desenvolvimento, permanece como atividade muito importante para o país. De acordo com Cícero Figueiredo, é possível harmonizar a prática com o meio ambiente. O professor cita técnicas sustentáveis como o plantio direto, o uso de plantas de cobertura do solo, sistemas integrados de produção que incluem o uso simultâneo de grãos, pastagem, animal e árvores na mesma área, uso de resíduos de cadeia agroalimentar e de adubos orgânicos, etc. ‘’Na minha opinião não há mais razão em abrir novas áreas do Cerrado nativo para produção agrícola. Só com pastagens degradadas são cerca de 30 milhões de hectares no bioma”, afirmou. 

O professor Antônio Nobre também acredita que é possível permanecer com essa prática de maneira menos invasiva. ‘’ O agronegócio deve ser ainda predominante no século 21; mas, deve se adaptar às novas exigências ambientais e de segurança alimentar dos mercados internacionais. Seu desenvolvimento deve considerar o aumento da produtividade das áreas já desmatadas.’’

Ainda há formas de reverter esse quadro, mas é necessário que além da interferência e fiscalização mais incisiva do governo. “(São) intervenções significativas de recuperação da paisagem, fortalecimento e criação de unidades de conservação de uso sustentável, a valorização do Cerrado nas cidades e o mais importante: a educação ambiental para a preservação, conservação e recuperação dos serviços ecossistêmicos”, apontou Nobre.

O alerta não é novidade. Há 15 anos, pesquisadores do programa Cerrado do grupo Conservação Internacional Brasil (CI-Brasil) apontaram que, até 2030, na velocidade em que andava a degradação desse bioma, haveria risco de extinção. Entre 2009 e 2010, o Ministério do Meio Ambiente também diagnosticou o aumento do desmatamento no Cerrado. 

Por Mayra Christie  (Agência de Notícias UniCEUB / Jornal de Brasília)

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