Menu
Brasília

Abadiânia renasce com o turismo ecológico

Com a economia abalada após a prisão do médium João de Deus, o município goiano se anima com as possibilidades abertas pelo turismo em Corumbá IV

Olavo David Neto

11/01/2021 6h09

Em 18 de dezembro de 2018, a pacata Abadiânia sofreu um baque do qual, dois anos depois, ainda não se recuperou. Naquele dia, a Polícia Civil goiana (PCGO) prendeu o líder religioso João de Deus, conhecido mundo afora por curas e tratamentos esotéricos com resultados atestados pelos próprios pacientes atendidos pelo médium. Acusado de estupro e abuso sexual, o guru foi condenado, já em 2020, a 60 anos de prisão em regime fechado – em março, foi concedida prisão domiciliar ao homem, que, aos 77 anos, enquadra-se nos grupos mais vulneráveis à covid-19.

Com a bancarrota de uma carreira religiosa que já beirava meio século, Abadiânia viu o fluxo de turistas secar do dia para a noite. Alvo da peregrinação de milhares de fiéis, sobretudo vindos do exterior, o município goiano sofreu por tabela com os malfeitos de João, e lojas, pousadas e outros tipos de estabelecimentos voltados aos turistas declararam falência. Agora, um outro tipo de interesse pode despertar novamente o interesse das agências de viagens ao interior goiano.

De solução energética, a faraônica obra de Corumbá IV, nas imediações da cidade, promete se tornar também o caminho da indústria turística abadianense. Formado pelas águas represadas do rio Corumbá, que gerarão energia na usina hidrelétrica, o lago da região já atrai olhares curiosos e inicia um movimento de migração do turismo de cunho religioso, ou espiritual, para as visitas ecológicas. É o caso de Paulo Cezar, dono da Haja Turismo. Voltada a locações de veículos para visitantes, a empresa se estabeleceu como uma das principais opções para grandes grupos de viajantes. Atualmente, Cezar na natureza como fonte de renda.

Ainda que não haja maiores movimentações, ele já recalcula a rota na ponta do lápis. “Eu ainda não montei linhas para o lago, mas tenho interesse, sim”, garante o empresário. “São serviços diferentes para públicos diferentes; agora muda o jeito de trabalhar”, pontua. Antes, na esteira do sucesso de João de Deus, era ele quem recepcionava os turistas no desembarque em terras brasileiras. “Eu fazia traslado de aeroporto mesmo. Pegava no Internacional [em Goiânia, a 150 km de Abadiânia] e trazia para cá”, relembra Paulo Cezar.

Ele prevê uma alteração no perfil dos turistas, que deve se limitar a visitantes de regiões metropolitanas mais próximas, como Goiânia e Brasília. Paulo lamenta apenas a queda nas gorjetas: questionado se os “gringos” eram mais generosos, ele é taxativo. “Ah, eram. Com certeza”, responde, entre risos. Para o governo estadual, que investe – em parceria com a Prefeitura de Abadiânia – no asfaltamento da GO-474, que liga cidade e lago, é um investimento. “Toda e qualquer cidade turística precisa de infraestrutura, de ruas bem pavimentadas e de acesso aos pontos mais relevantes”, pontua Fabrício Amaral, secretário estadual de Turismo, em conversa com o Jornal de Brasília.

O titular da pasta rejeita a ideia de que o lago se torne um reduto de empreendimentos de alto custo, além de privados. Atualmente, a própria concessionária da usina celebra projetos de “clube, marina com operador especializado e condomínio ecológico fechado”, com distribuição de 500 lotes para receber “casas de veraneio”. “Eu já morei em Brasília e vi pessoalmente coisas do gênero. É muito grave. Temos de trabalhar para impedir isso agora, este é o momento”, comenta o secretário, que também ressalta a importância de um plano diretor para uso do terreno e prioridade parao turismo em Unidades de Conservação (UCs).

Terreno privado

Gerente de Marketing do Escarpas Eco Parque, empreendimento que reunirá as benesses citadas acima, Laira Machado explica que o terreno de 24 alqueires – termo utilizado na agropecuária e que varia de região para região. Em Goiás, conta-se um alqueire como 193.600 metros quadrados – já era da iniciativa privada antes de 2006, quando foram iniciadas as obras de Corumbá IV. “A região inundada foi adquirida de outra empresa privada pelo seu potencial ecológico”, comenta a gestora. “São 240 alqueires no total, sendo pouco menos de 10% utilizados para a construção deste complexo de lazer”, explica Machado.

A área não será aberta ao público, ainda que haja a expectativa informal de disponibilização à população com o passar dos anos. O grande atrativo, comenta Laira, é a movimentação turística na região. “A estimativa é que, em cinco anos, sejam gerados cerca de mil empregos diretos com construção e manutenção do espaço”, prevê.

Saiba Mais

Para que Abadiânia se movimente em torno da atração, a Secretaria de Turismo goiana pretende investir na capacitação dos cidadãos.

“Nós fechamos parceria com o Sebrae e estamos encaminhando outra com o Ses/Senac para oferta de cursos de capacitação, de idiomas e outras questões necessárias para a área”, ressalta Amaral, titular da pasta.

“Apesar do João de Deus, Abadiânia ainda tem uma aura de misticismo, não vai ser só o lago. Temos Alexânia também, com um grande potencial de misticismo”, finaliza.

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado