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Brasília

Sequência de mortes nas vias do DF

Arquivo Geral

09/03/2018 7h00

Atualizada 08/03/2018 22h57

Divulgação/CBMDF

Raphaella Sconetto
raphaella.sconetto@grupojbr.com

Mulheres e idosas. Das seis vítimas de atropelamentos que aconteceram na capital só nesta semana, três eram dessa faixa etária. Duas, de 72 e 73 anos, morreram. Uma estava na calçada do Ministério da Saúde, na Esplanada dos Ministérios, quando foi atingida por um carro em alta velocidade. Outra foi atravessar a rua correndo e foi acertada na Avenida Alagados, em Santa Maria. Ontem, a última, de 64 anos, foi atropelada na Rodoviária do Plano Piloto.

Neste ano, 15 pessoas perderam a vida por atropelamento, segundo o Departamento de Trânsito (Detran). Em 2017, foram registradas 81 mortes. O órgão reconhece que os números têm subido neste ano e que as penas são brandas para os motoristas autuados por crime culposo – sem intenção de matar.

Rose Marie Flexa Medeiros, 73 anos, não trabalhava no Ministério da Saúde nem tinha o costume de frequentar o local. Nessa quarta- feira estava ali porque visitou uma amiga na Esplanada. De acordo com a família, a idosa aguardava a filha Roseane Flexa Medeiros, 42, num gramado atrás da calçada, entre as árvores, quando foi atingida pelo carro de uma jovem de 22 anos. “Falei com ela às 18h, disse que ia buscá-la. Quando cheguei, oito minutos depois, o Corpo de Bombeiros já estava a levando numa maca”, conta a filha.

Roseane conseguiu conversar com a mãe. “Ela estava entrando na ambulância. Reclamava de dor, estava muito machucada no rosto”, lembra. No Hospital de Base, as duas famílias se encontraram. “A garota disse que tinha bebido o chá de santo daime. Ela confirmou para o médico, está no relatório. A mãe dela falou para a gente, quando questionei, que ela só tomava chá de maracujá. Que a filha tinha uma síndrome que a fazia desmaiar. Aí perguntei ‘e ela continua dirigindo?’. Ela só disse que a gente tinha que rezar para as duas saírem bem”, comenta.

Horas depois, o hospital deu a notícia de que Rose Marie havia falecido. A causa foi traumatismo craniano. “O pai da motorista veio pedir perdão. Só aquilo. Não pegaram contato, não propuseram ajudar em nada”, critica.

Roseane conta que viu a jovem ao entrar na hospital. “Estava dopada, confusa”, afirma. “O carro capotou duas vezes no ar. Uma pessoa normal, lúcida, não desce a Esplanada a mais de 60 km/h no horário que estava. Se estivesse devagar o carro não teria feito estrago”, diz.

Agora, a família espera por justiça. “As tragédias acontecem e as leis são maleáveis. A partir do momento em que eu dirijo em alta velocidade, eu estou disposto a morrer e a matar. Ela vai responder, porque estou disposto a dedicar meu tempo para correr com esse processo”, levantou outro filho de Rose, Ricardo Medeiros Filho, 50.

“Revolta, saudade, perplexidade”

O enterro de Rose Marie Flexa Medeiros está marcado para hoje, às 11h30, na Capela 4 do Cemitério Campo da Esperança, na Asa Sul. “O que fica é revolta, muita. Tem saudade, perplexidade. É uma sensação de impunidade. Ela era uma viúva, que viveu a vida toda para o marido, filhos e netos. Era saudável, caminhava todos os dias. Tinha uma vida ativa. Vai deixar saudade”, lamenta a filha, Roseane.

Outras famílias partilham o mesmo sentimento. Nesse domingo, Guiomar Correia Ferreira, 72, correu para atravessar a rua quando foi atingida pelo condutor de um GM Corsa. O Corpo de Bombeiros não conseguiu reanimá-la e a mulher morreu ainda no local. O teste do bafômetro concluiu que o motorista não estava alcoolizado.

Ontem, Lindalva Ferreira da Silva, 64 anos, foi atropelada por um ônibus na Rodoviária do Plano Piloto, enquanto o motorista manobrava o veículo. Ela foi levada ao Hospital de Base com suspeita de fratura no quadril e fêmur direito. Na segunda-feira, uma moto atropelou Elder Darlison Carvalho Coutinho, 27 anos, em Águas Claras. Ele sofreu escoriações pelo corpo.

E na quarta-feira, além do acidente que vitimou Rose Marie Flexa na Esplanada, duas crianças foram atropeladas. Um garoto de 11 anos teve a perna fraturada em Ceilândia. O condutor, de 20 anos, estava sem habilitação. Segundo a Polícia Militar, o rapaz já foi detido três vezes, em 2016, 2017 e 2018, por dirigir inabilitado e por fazer transporte pirata. A outra criança ferida foi uma garota que atravessava a rua próximo ao Colégio Militar de Brasília. Ela sofreu escoriações.

Ponto de vista

O próprio diretor de Policiamento e Fiscalização de Trânsito do Detran, Glauber Peixoto, admite que os motoristas que são autuados por homicídio culposo – sem intenção de matar – recebem penas mais brandas. “A pessoa dificilmente fica presa. Ela vai ter direito a benefícios da legislação para não ficar presa, e isso vai gerar uma sensação de impunidade, principalmente para as famílias que perderam um ente”, afirma.

O único crime culposo que receberá penas mais duras será aquele envolvendo motoristas alcoolizados. “A partir de 1º de abril, a pena será maior. Só nesses casos, infelizmente”, completa. Peixoto explica ainda que as punições administrativas que cabem ao órgão variam de acordo com a infração. “Mas o que vem causando mais acidentes é a desatenção por uso do telefone”, indica.

Questionado se os números de acidentes envolvendo pedestres aumentaram neste ano, o diretor de Policiamento e Fiscalização afirma: “A gente acredita que foi porque o ano começou mais chuvoso, isso gera a perda de controle dos veículos. Tivemos caso de doença também. E essa época do ano é um período mais intenso, tem as festas, feriados, as aulas voltam”.

Para diminuir os acidentes, ele garante que o Detran tem trabalhado em três frentes: educação, engenharia e fiscalização. “Estamos mapeando os pontos mais críticos, em que acontecem mais acidentes. Temos cursos para pedestres e condutores, é um trabalho voltado para a atenção. A engenharia vem trabalhando na colocação de barreiras eletrônicas, redução de velocidade em algumas vias. E a fiscalização nos locais que têm fluxo intenso de pedestres e veículos”, finaliza.

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