Por Carliane Gomes
Na virada do ano, o uso de fogos de artifício volta a gerar preocupação entre tutores de animais de estimação devido aos efeitos do barulho sobre cães, gatos e outras espécies. Embora seja uma prática comum nas comemorações do réveillon, a soltura desses artefatos pode causar transtornos quando ocorre sem limites. No Distrito Federal, há uma legislação específica que regulamenta o uso de fogos de artifício com o objetivo de proteger a saúde e o bem-estar das pessoas e dos animais. A Lei Distrital nº 6.647/2020 proíbe o manuseio, a queima e a soltura de fogos de artifício ou qualquer artefato pirotécnico que produza estrondo. A exceção são os fogos que têm apenas efeitos visuais ou emitem baixa intensidade sonora. O decreto que regulamenta a norma, o Decreto nº 44.189/2023, estabelece que os fogos vendidos ou utilizados no DF não podem ultrapassar 100 decibéis, medidos a 100 metros de distância. O barulho provocado por esses artefatos pode causar estresse intenso nos animais, envolvendo diferentes fatores biológicos e neurológicos.

Ao Jornal de Brasília, a médica veterinária Agda Pavan, da Meu Amigo Veterinária, explicou que os animais possuem uma audição muito mais sensível do que a dos seres humanos, o que faz com que o som seja percebido de forma extremamente amplificada. “É como se o estrondo acontecesse diretamente no ouvido. Eles não conseguem prever de onde vem o som, qual será a intensidade ou quando ocorrerá o próximo barulho, o que gera ansiedade antecipatória e mantém o sistema nervoso em estado constante de alerta”, afirmou. Segundo a veterinária, esse estímulo ativa o eixo hormonal ligado ao estresse, com liberação de cortisol e adrenalina, desencadeando a reação de “luta ou fuga”. Como consequência, os animais podem apresentar taquicardia, tremores, hiperventilação e episódios de pânico.
Pavan destacou ainda que os gatos também sofrem com estímulos sonoros intensos e podem apresentar reações tão severas quanto as dos cães, embora de maneira diferente. Enquanto os cães costumam demonstrar o medo de forma mais visível, os gatos tendem a se esconder, parar de se alimentar ou reduzir a ingestão de água, o que pode provocar problemas de saúde. “Uma experiência negativa pode criar uma memória traumática para o resto da vida. Assim, nas próximas vezes, apenas os primeiros sinais, como o cheiro da pólvora, o anoitecer ou um relâmpago, já podem iniciar uma reação de pânico e ansiedade antecipada no animal”, explicou.
Além disso, recursos como coletes compressivos podem ajudar a acalmar alguns animais, mas a eficácia depende da adaptação de cada pet. Ela alerta que acessórios para abafar o som nem sempre são bem aceitos e podem causar ainda mais estresse. A especialista também não recomenda o uso de algodão nos ouvidos, devido ao risco de lesões e infecções, e orienta que a forma mais segura de reduzir o impacto dos fogos é usar sons ambientais, como música ou televisão, para mascarar o barulho. Entre as orientações estão fechar cortinas e persianas e manter as luzes internas acesas para reduzir os clarões. A recomendação ainda é não levar os animais para festas externas e oferecer brinquedos interativos e petiscos já conhecidos, ajudando a mantê-los ocupados e mais relaxados. “É importante criar um refúgio seguro, como uma caixa de transporte coberta ou um local no armário sem barulho, deixando itens com o cheiro do tutor.
O médico veterinário João Paulo Teixeira Nunes, proprietário da clínica Saúde Animal, reforçou que, durante a queima de fogos, os tutores devem criar um ambiente seguro e à prova de som, além de permanecer com os animais oferecendo conforto e distração. “Diversas estratégias podem ser adotadas, como isolamento acústico, criação de esconderijos e uso de música relaxante”, explicou. Segundo ele, também é fundamental eliminar possíveis situações de risco, como deixar janelas abertas sem proteção, o que pode favorecer tentativas de fuga ou causar acidentes. Para o veterinário, a principal medida durante a queima de fogos é manter os animais em um local seguro, confortável e o mais isolado possível do barulho. “É fundamental que os pets estejam identificados, para facilitar a localização em caso de fuga, e que os tutores evitem a automedicação, já que isso pode agravar o quadro clínico”, destacou. Ele alerta ainda que sinais como dificuldade respiratória, desmaios, salivação excessiva, automutilação e comportamento agressivo indicam estresse intenso ou pânico e exigem atenção imediata.
A protetora independente Kelbia Aguiar, de 44 anos, responsável pelo projeto Adote 1 Vira Lata, relatou que as duas cadelas resgatadas e adotadas por ela, Meg e Anastácia, apresentam medo intenso de barulhos altos. “Elas morrem de medo. Já aconteceu de uma delas se esconder em um espaço minúsculo entre o sofá e a parede por causa de um trovão”, contou. De acordo com Kelbia, por perceber esse comportamento, ela sempre tenta se antecipar para evitar acidentes. No réveillon do ano passado, mesmo fora da cidade, o barulho dos fogos provocou pânico em uma das cadelas. “Na hora que começaram os fogos, ela saiu correndo em direção à porta. Se não fosse minha irmã segurá-la pela coleira, ela teria fugido”, relatou. Para este ano, a protetora afirma que vai permanecer em casa, fechar os ambientes e preparar um espaço mais isolado para que os animais se sintam seguros.

O descumprimento da legislação distrital que proíbe o uso de fogos de artifício com estampido pode resultar em multas e outras sanções administrativas. As penalidades se aplicam a estabelecimentos comerciais, organizadores de eventos e usuários em geral. No Distrito Federal, a norma tem como objetivo proteger pessoas e animais dos impactos causados pelo barulho. A apuração das irregularidades é de responsabilidade da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), e as denúncias podem ser feitas pelo telefone 197.
Serviço
Para conhecer o Projeto Adote 1 Vira-Lata e os animais disponíveis para adoção, acesse o Instagram @dechancea1srd.
Os interessados podem entrar em contato pelo telefone (61) 99964-2777 para adotar ou colaborar com doações, ajudando nos cuidados de saúde e abrigo dos animais resgatados.