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Brasília

Porteiros da UNB: Servite demite terceirizados

Funcionários foram chamados para renovar contrato e foram surpreendidos com aviso-prévio

Pedro Marra

02/12/2020 6h59

Cerca de 30 porteiros da Servite, empresa que terminou a terceirização do serviço na UnB, receberam, na última terça-feira (24), um aviso prévio de demissão por parte da empresa. Eles receberam ligação de representantes da empresa no DF sobre um documento a ser assinado para confirmar a continuidade no cargo, mas tiveram que assinar um aviso prévio de demissão.

De acordo com o primeiro parágrafo da cláusula 32 da Convenção Coletiva de Trabalho, realizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), protocolado no dia 3 de janeiro deste ano, expõe que a sucessão de contratos de prestação de serviços, no segmento privado, é de responsabilidade das empresas realocar os funcionários nas mesmas condições do cargo anterior, com posto efetivo.

O documento diz, ainda, que não se admite reservas e feristas (pessoa que cobre férias). “…o empregado que possua mais de 05 (cinco) anos de efetivo vínculo empregatício, e a este dar estabilidade de 180 (cento e oitenta) dias e condições dignas de trabalho, mediante comunicado ao trabalhador por escrito, desde que haja anuência do mesmo, vedada a aplicação aos contratos do setor público”, aponta o texto da convenção.

Um dos porteiros, com mais de 10 anos de serviços prestados à instituição, conta que ficou alegre com a ligação que recebeu para ir à universidade assinar o documento de continuação, mas foi surpreendido com outra notícia ao chegar na Central de Segurança da UnB.

“Me ligaram e me chamaram para assinar um documento para dar continuidade ao contrato. Olhei para a minha esposa muito alegre quando me falaram que iriam dar continuidada na nova empresa. Quando cheguei lá, foi totalmente diferente. Deram o aviso prévio a todos nós. A outra empresa não aceitou a gente. Tem muitas pessoas que estão desempregadas, e eu agora também estou”, detalha o ex-funcionário, que não quis ser identificado.

“Para quem trabalha de porteiro é uma saudade grande, até por lidar bem com os alunos. Nunca faltei, sempre trabalhei no fim de ano, em Natal e Ano Novo, sem problema nenhum. Os meus colegas do grupo de risco trabalham da mesma forma que eu. Fiquei triste por perder o meu emprego. Mas posso assegurar que nunca briguei com ninguém. Eu tinha mais de sete anos no posto, e dá para dizer que fui um bom porteiro”, emociona-se.

Outro porteiro dispensado trabalhava desde 2010 no posto da empresa na faculdade de Direito. Ele acredita que foi demitido por ser do grupo de risco do novo coronavírus. “Tenho um bom serviço, nunca reclamaram de mim. Pela minha idade, minha saúde é boa, mas me afastaram justamente pela idade. O certo é que não poderiam nos demitir, até porque estamos afastados por conta da pandemia”, afirma.

Ele cita um problema que ocorre com frequência na Servite. “Dessa vez, está acontecendo [a demissão] porque afastaram a gente, e tem porteiro lá que é parente deles. A gente sabe que é apadrinhado. Conversava com eles quando eu estava no serviço, e falaram que indicaram eles para lá. Já que mandaram a gente embora, com certeza vai sobrar muita vaga”, declara o ex-funcionário da Servite.

Denúncia ao MPT

“As demissões dos porteiros do grupo de risco pela segunda vez são discriminatórias, pois somente esses foram demitidos em plena pandemia. A reitoria é responsável, pois estava em audiência do dia 23 de setembro com o MPT e sabe que os porteiros do grupo de risco não podem ser demitidos. Mentiram e enganaram os trabalhadores, é uma covardia. Tudo isso em plena pandemia”, afirma o representante da Central Sindical e Popular (CSP-Conlutas), Francisco Targino .

Segundo ele, a Medida Provisória (MP) 936/2020 resguarda os empregos dos porteiros do grupo de risco. “Nós da CSP-Conlutas estamos preparando uma nova denúncia ao MPT sobre essa segunda demissão dos porteiros do grupo de risco. Exigimos da reitoria que os porteiros do grupo de risco sejam reintegrados e tenham seus empregos garantidos”, complementa o sindicalista.

O que diz a UnB

De acordo com a UnB, a nova empresa terceirizada é a Servitium Eireli, criada em 1995 na cidade de Olinda-PE. O prazo de contratação é de 20 meses. Em nota, a Administração Superior da instituição, por meio da assessoria de imprensa, esclareceu como se deu a troca da companhia. Além disso, se prontificou a averiguar o envio do aviso prévio de demissão aos funcionários do grupo de risco.

“O Contrato n.º 171/2016 com a empresa Servite – SS Empreendimentos e Serviços Eireli, no seu encerramento, em 30/11/2020, contemplava 299 postos de portaria – sendo 276 colaboradores presenciais e 23 colaboradores com mais de 60 anos, afastados por pertencerem ao grupo de risco ao novo coronavírus. O edital n.º 37/2020 previa 278 colaboradores na UnB. A licitação resultou no contrato n.º 212/2020 com a empresa Servitium Eireli, nesse mesmo quantitativo. Não temos informação acerca da emissão dos avisos prévios por parte da empresa Servite. Contudo, tendo em vista a previsão legal de que não há a necessidade desse procedimento em decorrência da transferência de contrato, vamos averiguar. Pretendemos questionar a empresa acerca da emissão dos avisos prévios”, diz o posicionamento.

A UnB também foi questionada sobre a cláusula 32, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que garante a continuidade de empregados com mais de cinco anos de efetivo vínculo empregatício. Em resposta, a instituição entende que tal informação aplica-se apenas às contratações oriundas das empresas privadas, haja vista o último trecho da citação inicial da reportagem: “vedada a aplicação aos contratos do setor público.”

A universidade, de acordo com a previsão contratual, entende que deve ser aplicado o disposto na Convenção Coletiva de Trabalho de 2020, com participação também do Sindicato dos Sindicato dos Empregados em Empresas de Asseio, Conservação, Trabalho Temporário, Prestação e Serviços Terceirizáveis no Distrito Federal (Sindiserviços-DF).

“Fica pactuado que às empresas que sucederem outras na prestação do mesmo serviço, em razão de nova licitação pública ou novo contrato administrativo ou particular e/ou contrato emergencial, ficarão obrigadas a contratar os empregados da empresa anterior, respeitando todas as estabilidades legais, inclusive as gestantes; membros de CIPA; e todos os demais funcionários que na data do desligamento possua qualquer tipo de estabilidade legal e/ou funcional, sem descontinuidade quanto ao pagamento dos salários e a prestação dos serviços, limitado ao quantitativo de empregados do novo contrato, obrigando as empresas que perderem o contrato a comunicar o fato ao sindicato laboral, inclusive por correspondência eletrônica, até 20 (vinte) dias antes do final do mesmo”, diz a cláusula 32ª sobre o incentivo à continuidade.

Servite cita “prática corriqueira”

A assessoria da Servite informou que não cabe à empresa “fazer interferência na política de contratação de recursos humanos da nova empresa detentora do contrato com a Fundação Universidade de Brasília (FUB). Cabendo, à Servite, apenas definir qual será a política de contratação que adotará, tanto do ponto de vista quantitativo, como qualitativo”, diz um trecho da nota enviada ao JBr.

Perguntada sobre a demissão dos funcionários do grupo de risco, a companhia destacou que “o parágrafo primeiro da cláusula 32 da CCT é claro em especificar que deve ser utilizado para contratos privados, e ainda assim, não obriga, mas tão somente faculta as empresas a realocação dos empregados dentro das mesmas condições do posto anterior, não podendo esse dispositivo ser aplicado para o caso concreto, haja vista que estamos falando de contrato com o setor público, e como se vê, a redação é clara em dizer que é vedada a aplicação deste parágrafo aos contratos do setor público”, alega.

A nota diz, ainda, que o motivo da dispensa dos funcionários do grupo de risco é “óbvio”. “Encerramento do contrato da FUB com a Servite, que obrigou a empresa a disponibilizar para o mercado colaboradores que atuavam na instituição de ensino. Trata-se de uma prática corriqueira em qualquer corporação empresarial do mundo, diante da perda de contratos e da necessidade de redesenhar sua engenharia financeira como forma de sobrevivência”, conclui.

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