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Brasília

Para se diferenciar, ambulante vende água vestido de garçom

Arquivo Geral

12/05/2016 6h30

Ingrid Soares

Especial para o Jornal de Brasília

Inovar em tempos de crise é preciso. Pensando nisso, o ambulante Pedro Henrique Ramos, 28 anos,  teve uma ideia para alavancar suas vendas. Ele trabalha nos arredores da Rodoviária do Plano Piloto, oferecendo água mineral. O diferencial fica por conta do traje que  utiliza para a labuta: uma camisa branca, gravata borboleta, calça e sapato social. 

No semáforo, sob um sol escaldante, ele desfila entre os carros vestido de garçom. Em uma das mãos, uma bandeja com água e guardanapos para não molhar o estofado do carro do freguês.  A outra mão fica para trás, em gesto de oferecimento, tudo como manda o figurino. Suco, refrigerantes e balas também acompanham o menu. 

Natural de Patos de Minas (MG), Pedro cursou o Ensino Médio e, após ser pesquisador de petróleo,  mecânico, freelancer de garçom e vendedor de água de coco,   se mudou para Brasília no ano passado depois de uma separação. Atualmente, divide um apartamento com um amigo no Paranoá. 

Origem da ideia

A ideia surgiu depois que Pedro teve a mochila furtada com todos os pertences. “Quando comecei a vender aqui, me descuidei e levaram tudo. Fiquei indignado, porque também tinha vendido pouco nesse dia. Chateado e com muito calor, entrei no shopping para  usar o bebedouro. Daí vi um garçom servindo água para os clientes, todo chique. A água  era a mesma que eu vendia, mas custava R$ 4,90. Vi que tinha gente que pagava e percebi que o modo como ele se portava e como   se vestia também era importante e agregava valor ao atendimento”, relata. 

Assim, continua, “pensei que, independentemente de estar num shopping ou no sinal, todos deveriam ter direito ao mesmo atendimento. Tudo com muita educação e sem aquela gritaria habitual”, diz.

Ao colocar em prática a ideia de levar o requinte para as ruas, há mais de um mês, as vendas subiram. “Com contas a pagar, tive de me reinventar. Antes, só vendia duas caixinhas (24 unidades) e tirava apenas R$ 150 por semana. No primeiro dia vim apenas no estilo, ainda sem a gravata, mesmo assim vendi 36 unidades. No segundo, comprei a gravata e vendi ainda mais. Agora, consigo fazer quase R$ 300. Só tem melhorado”, comemora. Cada garrafa de água custa R$ 2.

Sorriso no rosto é sempre o cartão de visita

De segunda a sexta-feira, Pedro sai de casa por volta das 6h, pega um ônibus e chega às 8h para trabalhar. Ele deixa as caixas de isopor   em uma empresa próxima ao ponto e pega novamente todas as manhãs. Geralmente, termina o expediente às 18h. Aos sábados, encerra às 14h, e a renda adquirida no dia é reservada para a prática de seu esporte favorito: o caiaque. 

“Quando abordo o cliente, trago sempre um sorriso no rosto, porque quem está no trânsito já anda de mau humor. Digo: ‘Bom dia, o (a) senhor (a) aceita   água?’. Se sim, faço a venda. Se não, agradeço e vou para o próximo carro”, explica.

 Mas a desconfiança ainda é um entrave. “As pessoas tinham medo e, quando chegavam perto do semáforo, fechavam o vidro. Hoje mesmo eu escutei: ‘Já fui assaltado, por isso não tinha coragem de abrir a janela. Mas senti segurança em você’. Para mim, isso faz toda a diferença. Percebi que os clientes também levam em conta a marca. Então, apesar de comprar mais caro, não repasso o preço, mas a qualidade. Em mim eles podem confiar. Também não cobro os 10%”, brinca.

Reação positiva

A reação dos motoristas   é positiva: “É muito legal. Ele é um exemplo a ser seguido. Se todo mundo fosse assim, esforçado, teríamos um País muito melhor”, elogia a estudante Nathalia Maximiano, 28.

Vânia Brandão, 40, aproveitou para matar a sede e também apoiou a iniciativa. “Não gostava de comprar água no sinal, mas ele inspira confiança, é limpo e organizado. Realmente um diferencial. Quem comprar com ele só tem a ganhar”.

Pedro comemora: “Muitos me parabenizam e isso me motiva, fico mais alegre”.

Planos para o futuro

O caminho não tem sido fácil: há alguns dias, a mercadoria foi recolhida pela fiscalização. Mas ele não desiste.  Pedro sonha em abrir um negócio próprio, onde possa empregar mais pessoas. Apesar de gostar de topografia, acabou se apaixonando pela área da administração. “Quero abrir pelo menos mais quatro pontos e investir em triciclos. Mas, para isso, preciso economizar e me cadastrar devidamente. Também quero fazer faculdade. Fiz   cursos profissionalizantes e tudo o que aprendi estou aplicando aqui”, conta.

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