Raphaella Sconetto
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O que pode ou não pode em um condomínio? Cachorro, telas, varal, som, brincadeiras e outros temas polêmicos levantam a discussão na hora de definir as regras de convivência. Assim aconteceu com uma moradora da Asa Sul que, após decisão da Justiça do DF, terá de retirar uma tela de proteção da janela, sob a argumentação de que a instalação fere a estética do bloco.
A empresária Maíra Belo, 34 anos, mudou-se para um apartamento na 410 Sul em setembro de 2017. Ao chegar, sua primeira providência foi providenciar uma tela para proteger três crianças e três cachorros. Consultado antes a respeito, o condomínio negou o pedido da moradora. “Disseram que já tinha a grade, que funcionava como a rede de proteção”, conta.
Não convencida sobre a eficácia da grade em termos de segurança, Maíra instalou a tela. Mas a operação saiu mais cara do que o previsto. “Em dezembro, o síndico começou a me multar”, relata. “No início a multa era de R$ 200, depois aumentou para R$ 400”.
Na Justiça
Maíra diz ter se embasado nas regras da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). “Dizem que não precisa de autorização de ninguém, porque é uma questão de segurança, e que não fere a fachada, porque não é por estética”, argumenta. Mas tal entendimento não era o mesmo do síndico.
“A assessoria do condomínio estava ligando para cá e dizendo que iria negativar meu nome, dos fiadores e do proprietário. E o proprietário, que está na Itália, me ligou dizendo que não podia ser negativado”, aponta. A empresária optou por pagar as multas e entrou na Justiça para garantir o direito de colocar a rede de proteção e ter de volta os valores pagos. Mas não logrou sucesso.
Na decisão, proferida em 13 de setembro, a juíza Margareth Becker decidiu que são soberanas as regras do condomínio. “Nos termos da cláusula trigésima da convenção do condomínio, é proibido (…) alterar a forma externa da fachada do prédio, sendo que a assembleia condominial extraordinária ocorrida em 12/04/2016 deliberou pela retirada de grades de proteção na área externa (com a permissão de instalação na parte interna do apartamento)”, explica a sentença.
“Conjecturas”
No entendimento da juíza, as normas da ABNT são “meras conjecturas”. Ela equipara as grades às telas de proteção, mas Maíra discorda. “O regimento interno do condomínio, de 1992, diz somente sobre as grades de proteção, que devem ser colocadas internamente, mas as grades previnem roubos, invasões. As redes são para proteger crianças e animais”, pontua.
Após a decisão, Maíra pretende entrar com recurso e ainda tentará convocar uma nova assembleia no condomínio para que o regimento seja repensado.
“Nenhum vizinho com quem conversei até agora é contra a colocação da rede”, afirma. “É prevenção para que não haja nenhuma queda.” Essa história ainda vai se desdobrar em outros capítulos.
Animais de estimação, outro foco
Uma das polêmicas mais comuns é sobre animais de estimação. Em agosto deste ano, a Justiça do DF também proferiu decisão contrária à presença de um cachorro em um prédio do Guará.
No processo, a autora narrou que tinha um cachorro de pequeno porte e que foi informada pelo síndico que a convenção do condomínio não permitia a permanência de cães e gatos nos apartamentos. Alegando que a proibição não era válida, ela entrou na Justiça solicitando a reversão da regra e a permanência do cão no local.
O juiz titular da Vara Cível do Guará julgou o pedido improcedente. Lembrou que, além de não cumprir a convenção do condomínio, a moradora assinou um contrato de locação que dizia sobre a permanência de animais no apartamento.
Contrato
A sentença destacava: “O primeiro ponto que merece uma atenção redobrada é que o próprio contrato de locação veda animais domésticos. Ou seja, a autora, em evidente comportamento contraditório, quebrou a avença pactuada e passou a teimar contra o contrato e contra as regras do condomínio. (…) O segundo aspecto é a ofensa às regras do próprio condomínio. Se os condôminos votaram para que nas áreas comuns não tivessem animais de estimação, é porque isso manifesta o desejo de não conviver com tais animais, seja porque não querem entrar no elevador e passar o trajeto com latidos, seja porque possuem alergia ao pelo de tais animais, seja porque se incomodam com o cheiro de urina que se instala em áreas comuns”.
Inconformada, a autora da ação apresentou recurso, mas os desembargadores entenderam que a sentença deveria ser mantida na íntegra. E assim foi feito.
Ponto de Vista
“Síndico e moradora estão certos em suas colocações, mas é preciso ponderar”. É o que recomenda Doani Batistussi, especialista na área condominial. “Colocar telas de proteção por fora é uma alteração de fachada, e muitos regimentos internos proíbem isso. Mas se trata de um item de segurança, principalmente por conta das crianças”. Doani sugere a convocação de uma assembleia para definir novas regras. “Os dois lados têm que ceder. O síndico não é dono, é um representante da comunidade, e o que for melhor tem que ser acatado. Podem pensar numa padronização e até aprovar uma única empresa para realizar o serviço no prédio.”
A reportagem tentou entrar em contato com o síndico do prédio da 410 Sul, mas ele não atendeu às ligações.