por Amanda Martins e Anna Vitória de Carvalho
Na semana do Dia da Consciência Negra, o Distrito Federal deu um passo para estruturar ações permanentes de combate ao racismo institucional. A Câmara Legislativa aprovou o projeto de lei nº 2.002/2025, de autoria da deputada Doutora Jane (Republicanos), que institui o Programa de Letramento Racial do DF. A iniciativa prevê formação contínua e aprofundada sobre equidade racial, discriminação e direitos humanos em escolas, órgãos públicos, instituições privadas e setores diversos.
De acordo com a justificativa do projeto, a proposta surge da necessidade de ampliar o debate sobre raça em espaços institucionais, com a expectativa de que a capacitação contribua para prevenir práticas discriminatórias. Durante a votação, a deputada afirmou que o objetivo é levar o debate a todos os espaços, reforçando a importância da discussão para enfrentar o racismo estrutural.
O conceito de letramento racial, desenvolvido pelo jurista Adilson José Moreira, baseia-se na compreensão de como o racismo opera na sociedade e de como essa discussão deve integrar a formação cidadã. Em entrevistas e participações públicas, ele defende que a educação tem papel central na construção de práticas institucionais mais democráticas.
Por que o tema importa no DF?
Estudo do Instituto de Pesquisa e Estatística do DF (IPEDF) sobre bullying escolar indica que o preconceito racial está entre os tipos mais frequentes de violência nas escolas. Segundo o levantamento, 76,4% dos professores e 91,7% dos gestores relataram ter presenciado ocorrências desse tipo em suas unidades. Além disso, dados da Secretaria de Segurança Pública do DF registram casos de injúria racial, incluindo incidentes em ambientes escolares. Esses indicadores reforçam a importância de ações institucionais contínuas, como as previstas no Programa de Letramento Racial recém-aprovado.
Antes da aprovação do PL, a Secretaria de Justiça e Cidadania do DF já havia realizado ações de sensibilização e formação sobre igualdade racial em algumas unidades educacionais e instituições. Entre os locais que receberam atividades do programa estão o CED 04 do Guará, o CED 07 de Ceilândia e a Escola Classe 511 de Samambaia, que participaram de encontros e rodas de conversa sobre diversidade e igualdade racial.
A Sejus também estabeleceu parceria com o Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), que em outubro de 2025, firmou o extrato do Acordo de Cooperação Técnica nº 03/2025, tornando-se a primeira iniciativa privada a aderir ao programa. Essas experiências anteriores servem como referência para a implementação do novo programa em escala ampliada.
Iniciativas fora do DF
Algumas iniciativas realizadas em outras unidades da federação podem servir como ponto de comparação para a formulação de políticas de letramento racial. Em Minas Gerais, a Secretaria de Educação desenvolve a Estratégia de Gestão Escolar para Equidade Racial, que envolve formação de equipes pedagógicas em unidades da rede estadual. Em São Paulo, instituições acadêmicas como a PUC-SP promovem cursos e ações voltadas à educação para relações étnico-raciais. Organizações como o CEERT também realizam projetos de formação voltados a educadores em diferentes regiões do país. Cada iniciativa segue metodologias próprias e não representa um modelo único, mas demonstra caminhos possíveis para ações institucionais desse tipo.
A aprovação do Programa de Letramento Racial ocorre em um contexto de amplificação do debate público sobre desigualdades raciais. Ao criar uma base legal para ações permanentes, o DF abre espaço para transformar atividades pontuais em política pública continuada. A efetividade do programa, entretanto, dependerá das definições operacionais que serão anunciadas na fase de regulamentação.