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Jorge Vianna afirma que promessas de governantes sobre consertar a saúde são falsas

Em entrevista ao Jornal de Brasília, o parlamentar falou sobre os desafios da área e dos motivos que levam a superlotação das unidades hospitalares do DF

Suzano Almeida

21/08/2024 15h13

Jornal de Brasília

Jornal de Brasília

Ao JBr Entrevista — o podcast do Jornal de Brasília —, desta quarta-feira (21/8), o deputado Jorge Vianna (PSD) falou dos desafios vividos pela população do Distrito Federal, a cada governo, com a saúde pública do Distrito Federal. O distrital apontou como algumas das razões para a superlotação de unidades de saúde a falta de ações de prevenção, de equipes de saúde, de condições de trabalho e os baixos salários para atrair mais médicos para o serviço público. O parlamentar ressaltou, ainda, os desafios enfrentados pelo governo de Ibaneis Rocha (MDB) com a pandemia de covid-19 e a epidemia de dengue, na capital federal.  

O que é preciso para melhorar a saúde e o que a CLDF pode fazer?

O problema da saúde não é somente da saúde, mas todas as políticas que envolvem e a permeiam. A saúde é um núcleo e na órbita dela existem várias outras políticas que estão em volta dela e devem estar ligadas a ela. Aqui em Brasília, temos diversas áreas que são invadidas. O governo fica ali observando, depois elas se tornam cidades, depois aparecem os políticos que querem regularizar. Só que lá não têm água, esgoto, energia, asfalto. Óbvio que em um lugar assim aparecerão doenças, ainda mais em épocas sazonais, como a de dengue, doenças respiratórias para crianças. E, todas elas vão para os hospitais. Esse é um problema. Temos a falta de emprego, pois a pessoa que não tem emprego acaba caindo na vida, no mundo, usa droga, álcool. Elas vão adoecer e vão para os hospitais. A nossa alimentação, pois hoje nos impõe o que comer: se eu for comprar um pão, não sei o que tem lá dentro, um biscoito, um chocolate, um refrigerante, um hambúrguer, e com isso vamos ter diabetes, hipertensão e muito mais. Se essas políticas não começarem a se ajustar e não forem transversais com a saúde e chama-la para conversar, ouvir profissionais de saúde na elaboração, vamos ter um público cada vez maior usando o sistema que é gratuito.

Qual a avaliação do senhor sobre o que é gasto com a saúde?

Por ser 100% gratuito é um gasto muito alto. Até quando o Estado vai conseguir manter esse gasto, que é muito alto por conta desse nosso erro geral dos governos, do parlamento, e do Brasil a fora. A saúde nunca terá jeito se a gente não resolver isso. Pode ser o melhor governador ou o pior, ela nunca terá jeito. O que a gente pode fazer é trazer essa discussão de conscientização e provocação. Quando eu entrei na Câmara Legislativa fui ver quanto era destinado para a saúde. Nós estávamos em quarto lugar [em número de emendas], perdíamos para educação, cultura, esporte e várias outras pastas que os deputados mandavam os recursos para lá. A saúde é o carro-chefe de qualquer campanha, seja presidente, governador, prefeito, deputado. Mas a prioridade para os políticos nunca foi de verdade a saúde. Quando entrei comecei a colocar recursos. Lógico que o que eu colocar não vai resolver o problema da saúde, mas isso impacta o cidadão. Até o ano passado, eu encaminhei R$ 74 milhões para a saúde. Isso apenas um deputado distrital, batendo todos os recordes. Mais que deputado federal e senador.

O que fez piorar isso?

Uma critica que eu faço é com relação aos programas que foram encerrados no governo [Rodrigo] Rollemberg, que eram os de atenção básica, como o de tabagismo, alcoolismo, DST — Doenças Sexualmente Transmissíveis. Eles acabaram. Hoje a população não tem a quem procurar, caso ela queira parar de fumar, e isso impacta, pois se não tem um programa com pessoas te orientando sobre o que fazer. Você não cria essa consciência e acaba se entregando. A prevenção na saúde irá determinar nosso futuro. Hoje temos uma grande quantidade de unidades básicas de saúde, que tem como função a prevenção, com os agentes comunitários de saúde (ACS), que vão às casa das pessoas para ver se elas estão bem, se medicando, e não estando, pedem para o médico ir a residência delas. Mas não funciona, pois hoje os ACS estão nas unidades básicas de saúde atendendo as demandas que chegam neles, que são mini-hospitais, e não era para ser. O trabalho das UBSs é ir até as pessoas para dar atenção.

E quais são as vantagens desse modelo?

As UBSs tem um número restrito de habitantes para poder atender. Cada equipe atende 4 mil pessoas. Pelos cálculos, você pega uma área com esse número e sabe o que eles estão precisando naquele momento. A atenção básica pode ser um grande fiscal e um termômetro para da sazonalidade e das doenças daquela região. Tendo um surto naquela região, os agentes de saúde avisam a Secretaria de Saúde. Era para ter sido assim na pandemia.

Uma lei nesse sentido não seria viável? Não teríamos reduzido os números da epidemia de dengue?

Ela já existe. A execução que não é realizada e, muitas vezes, não por vontade do secretário de Saúde ou do próprio governador, mas porque o sistema não esta adequado ou a população não está ciente sobre como funciona esses sistema. Durante o surto de dengue eu fiz várias críticas por conta da explosão de casos, embora eu tenha alertado quanto a isso. O mosquito da dengue nunca deixará de existir e nem de se proliferar. Podemos ter um maior número de casos, como podemos ter menos, mas o fato é que teremos, pois os ovos estão ali, para na primeira gota de chuva, esse ovo vai eclodir. Essa prevenção é feita pelo agente de vigilância ambienta em saúde (Avas), No ano passado, tínhamos 500 contratos temporários, mas ele acabou e a secretaria não tinha como fazer um contrato rápido, porque tinha um concurso em curso e ainda não tinha expirado. Eles só conseguiram chamar em janeiro e fevereiro, e já tinha explodido os casos. As amarras que o Estado tem impede que as coisas sejam feitas mais rápido.

Como o senhor vê a atual gestão?

O governador Ibaneis [Rocha – MDB] e a secretária de Saúde, Lucilene [Maria Queiroz], estão passando por uma prova de fogo. Saíram de uma pandemia (de covid-19) e caíram em uma epidemia da dengue. Isso não é fácil. Óbvio que nós fazemos críticas para construir, como estou fazendo agora. Eu estou alertando o governador, a secretária que precisamos recompor o quadro de AVAs, para que eles possam estar na rua fazendo o seu papel. Teremos uma reunião com a secretária de Saúde com a comissão de aprovados AVAs e ACS. Não temos um número suficiente, são pouco mais de 1 mil para 3 milhões de habitantes.

Quanto ao número de servidores, falta mais concurso ou ser mais atraente para os concurseiros?

Para os cargos de agentes há uma concorrência imensa, mas para médicos não. Os médicos não querem ir para a Secretaria de Saúde, porque os salários não são atraentes e não tem mais a estabilidade financeira de entrar no serviço público e se aposentar com o salário integral. Hoje, ele se aposenta com o teto. Um médico pode ganhar R$ 20 mil, mas quando se aposentar será pouco mais de R$ 6 mil. Ele prefere estar na iniciativa privada e, no fim da carreira, para ter uma estabilidade, ir para a secretaria. Além das condições de trabalho. Hoje temos muitas unidades de saúde com estrutura ruim, embora o governo tenha construído novos hospitais, mas os antigos, como Ceilândia, Sobradinho e Gama, não ajudam. O médico ali precisa trabalhar em uma estrutura melhor. A gente ajuda a equipar, a melhorar, mas a verdade é que esses mais antigos precisam ser demolidos e construir novos, mais modernos. Nem sempre é apenas a questão financeira.

E sobre a falta de anestesistas?

A Secretaria conseguiu fazer a contratação de anestesistas por meio de cooperativas, que era outro problema que tínhamos. Eles ganham o mesmo que qualquer outro médico da secretaria, por ser uma carreira só, porém, na rede privada, ele ganha quatro, cinco vezes mais do que na Secretaria de Saúde.

Por que ainda temos filas?

Porque não depende apenas dos anestesistas, depende do cirurgião, do pós-cirúrgico, depende de UTI — unidade de terapia intensiva —, porque tem paciente que precisará, e sem isso o cara não entra na sala de cirurgia, mesmo que lá esteja o cirurgião. Ela será suspensa até ter essas condições. Tendo, aparece um paciente grave, tem que receber esse que está morrendo. A regulação precisa ser muito versátil para poder entender que aquele leito precisa ser usado agora.

Um hospital apenas para cirurgias funcionaria?

O grande dilema da secretaria é, se ela tiver 20 leitos de UTI e reservar dez para cirurgias eletivas, quando não há risco de morte, ele será realizada. Mas aparece uma pessoa grave, com decisão da Justiça, que precisa de UTI, ela vai ter que liberar. O seu José vai ter que ficar 10 anos esperando essa cirurgia, porque ele não vai morrer, mas o outro está morrendo. Quem eu coloco nessa vaga? Esse é um julgamento que mata qualquer um. Eu vou escolher quem vai morrer ou o seu Zé que tem 10 anos ali esperando? Às vezes tem tudo, mas faltou o material para a cirurgia. Não é fácil.

E o que o senhor acha dos discursos de quem vai resolver a saúde?

Qualquer um que sentar aqui e disser: “eu resolvo o problema da saúde”, “o problema da saúde é fácil de resolver”, “é só contratar médico”, “é só arrumar hospital”, não é. Todo mundo fala isso, mas não é só o médico. Se tivéssemos vagas de UTI suficiente para cirurgias e para as emergências, precisaríamos de três vezes mais do que temos atualmente.

E por que não se faz isso?

UTI é calculada de acordo com o número de habitantes. Não posso colocar esse número de UTIs porque eu não vou receber recursos do Ministério da Saúde por elas, pois ele só pagará “X” por elas. Fora os habitantes de outros estados, que têm o direito de serem atendidos. Tem prefeito que fica feliz quando compra uma ambulância para mandar os pacientes para cá.

O senhor está trabalhando para que os salários de especialistas de saúde sejam equiparados com os odontólogos?

Ao longo dos anos, os governos erraram em diferenciar o salário de profissionais do mesmo nível. Sempre entendi, e o judiciário é assim, que vencimento, de nível superior, todos devem ser iguais. De nível médio todos são iguais. No GDF, por muito tempo, os amigos do governo conseguiam melhorias maiores para suas carreiras. Os sindicatos ligados aos partidos do governo conseguiam coisas melhores. Isso trouxe uma discrepância muito grande ao longo do tempo. Hoje, psicólogos da Secretaria de Saúde ganha mais do que o psicólogo da Secretaria de Educação, são todos funcionários do mesmo governo e psicólogos. Eles recebem diferentemente porque um conseguiu mais e outro menos. Temos no nível superior médicos, odontólogos, especialistas, que não são nem médicos nem enfermeiros, e os próprios enfermeiros. Essas carreiras, obviamente, têm diferenças em relação ao mercado de trabalho. Fora o médico, para mim, essas carreiras de nível superior precisam ter o mesmo vencimento, que precisa compreender um percentual do salário do médico. Hoje os odontólogos tem uma vantagem (salarial) em relação aos especialistas e aos enfermeiros. Essas carreiras estão brigando pela equiparação porque um dia eles já ganharam o mesmo. Com as políticas sindicais e de governo acabaram separando eles, por isso querem que volte a como era antes. Não é algo surreal ou que eles estejam inventando. É algo que já existia.

E o que o senhor pode fazer para ajudar?

Eu fiz essa locução com o governo. Sentamos e o governo melhorou um reajuste que eles já receberiam, que era de 3% para 13% ou 14%. Defendo que sentemos novamente com o governo, mas depende do governador. O Ibaneis sempre teve essa pegada de fazer justiça, agora depende do orçamento, que é finito. O que temos que fazer é a pressão e a articulação política. Semana que vem, teremos uma reunião com os especialistas e a Secretaria de Economia para tentarmos ali começar novamente a negociação.

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