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Brasília

Ipês florescem mais cedo e aguçam a memória afetiva dos brasilienses

Arquivo Geral

18/06/2018 7h00

Atualizada 17/06/2018 20h41

Foto: Myke Sena/Jornal de Brasília

Rafaella Panceri
rafaella.panceri@grupojbr.com

Além de colorir jardins, praças e canteiros públicos do Distrito Federal, os ipês fazem parte da memória afetiva de moradores antigos da cidade. É o caso do aposentado de 82 anos Araujo Maciel. Residente no Guará há 47 anos, ele viu as primeiras plantas da espécie nascerem na praça em frente à casa onde vive com a mulher.

Neste ano, a floração dos ipês cor-de-rosa acontece mais cedo, em junho. Segundo especialistas, uma série de fatores influi no fenômeno. Entre eles, a variação brusca de temperatura e o aumento no número de mudas cultivadas ao longo do tempo. Assim, mais ipês florescem pela primeira vez, simultaneamente — como explica a engenheira agrônoma e doutora em ecologia Carmen Correia.

“É uma tendência ficar muito fixado no que aconteceu no ano anterior, mas no fim de maio já podemos ver ipês floridos em todos os anos”, esclarece. “Há espécies de ipês de diferentes biomas plantadas no DF, como da Mata Atlântica e do Pantanal”, aponta, e acrescenta que a intensidade na floração varia de ano para ano. “Em 2018, há maior quantidade de flores neste mês e isso chama a atenção. Houve um período mais frio e agora está mais quente. Pode ter sido um estímulo para que as flores viessem mais rápido”, analisa.

Como um filho

João Wesley. Foto: Myke Sena/Jornal de Brasilia

O aposentado João Wesley Stoppa, 59 anos, mora no Guará há 27. A casa da família Stoppa fica em frente a uma praça na QI 11, cujos canteiros têm cinco ipês em plena floração. “É um prazer acordar com uma beleza dessas”, conta. Ele e a mulher tiveram um filho assim que se mudaram para ali.

O garoto brincava na praça subia nas árvores, que eram bem menores.  “Tinham três metros, no máximo. Ele cresceu com elas”, lembra. Durante a floração, as plantas se reproduzem. “Muita gente vem aqui para pegar sementes. Elas ficam em vagens com até 30 centímetros. Algumas voam e param na calha do telhado. Onde ficam, nascem”, detalha.

Ele já tentou plantar mudas de ipê branco no local. “Busquei sementes na Vila Telebrasília, mas não germinaram”, conta. “É a lei da natureza”, acredita.

Vizinho de João, o aposentado Araujo Maciel, 84 anos, mora no Guará desde 1971. Recebeu o colega na vizinhança e é conhecido como um dos mais antigos da quadra. “Quando cheguei ao Guará, era só poeira e lama. Esses ipês não estavam aí. A administração plantou há uns dez anos”, cogita.

Da terra, o colorido

Araujo Maciel. Foto: Myke Sena/Jornal de Brasília

A família de Araujo Maciel veio do Piauí para o DF em busca de trabalho. “Aqui tivemos filhos e netos. É um lugar especial e, agora, colorido. A época da floração é uma beleza”, compartilha o morador do Guará. A aposentada Clotilde Angela, 76, casada com Araujo há 54 anos, afirma ter visto os ipês ainda pequenos.

“Quando chegamos, isso aqui parecia uma selva. Com a urbanização, vieram os ipês. Como só plantaram o rosa, eu mesma plantei um amarelo e outro branco na praça. Espero estar viva para conseguir ver as flores”, deseja.

Homenagem à mãe

Frei Paulo Sérgio. Foto: Myke Sena/Jornal de Brasília

Mais nova do que as árvores da QI 11, no Guará, uma muda de ipê da Asa Sul chama a atenção pelo que representa: a mãe de um pároco. O frei Paulo Sérgio, 48, apelidou a planta de Mariana e acompanha o desenvolvimento dela, que já atingiu cerca de dois metros de altura. A ideia partiu de uma campanha da Paróquia e Santuário Santo Antônio, localizada na 911 Sul.

“Distribuímos 300 mudas. Meu conselho foi dar um nome que fizesse referência a alguém de que eles gostassem, para gerar sinergia e estimular o cuidado com a planta”, lembra, ao citar o evento de 2016. Na ocasião, as mudas foram benzidas no início da Novena de São Francisco, que coincidiu com o Dia da Árvore (21 de setembro).

Ao se lembrar de Dona Mariana, que tem hoje 85 anos, ele se recorda da semente que plantou. “Assim como a minha mãe me gerou, um ipê maior, em frente à Paróquia, gerou esse daqui”, compara. Ele conta que Mariana acompanha o desenvolvimento do ipê. “Quando ela vem a Brasília, falo para rezar pertinho da planta”, brinca. “Quando penso em alguém importante, penso nela”.

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