ANDRÉ BORGES E CÉZAR FEITOZA
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
A cúpula do governo federal teve um encontro com o Comando do Exército na quarta-feira (22), no Palácio do Planalto, para definir o destino que será dado a uma grande área localizada a apenas nove quilômetros do Congresso Nacional e que está avaliada em cerca de R$ 40 bilhões.
A reunião aconteceu após a Folha revelar, no último domingo (19), que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deu sinal verde ao Ministério dos Transportes para o governo retomar o terreno que hoje está sob posse do Exército, espaço com 4,2 milhões de metros quadrados, equivalente a quase três vezes o tamanho do parque Ibirapuera, em São Paulo.
Segundo informações obtidas pela reportagem, participaram do encontro os ministros Rui Costa (Casa Civil), José Mucio (Defesa), Renan Filho (Transportes) e Esther Dweck (Gestão e Inovação em Serviços Públicos). O comandante do Exército, general Tomás Paiva, também participou da agenda.
O Exército estava em negociações avançadas com o Governo do Distrito Federal para a construção de um novo bairro em Brasília no terreno que pertencia à Força. O loteamento das áreas estava em processo final. Cada lote seria cedido por permuta para empreiteiras construírem cerca de 20 mil imóveis na região.
O Ministério da Defesa e Exército conseguiram acertar um meio-termo com os demais ministros do governo Lula. Em troca de ceder a área, os militares devem ficar com cerca de R$ 3 bilhões do valor arrecadado com a exploração do terreno.
O valor será usado para a construção da nova Escola de Sargentos do Exército, em Recife (PE), e do Hospital Militar de Área de Brasília.
Os militares pediram essa contrapartida porque previam, em seus planejamentos, que os recursos oriundos da construção do novo bairro de Brasília iria custear as duas obras. O aval foi concedido pela cúpula do governo Lula.
O Ministério da Gestão e Inovação tratará de retomar a área transferida ao Exército, para dar andamento ao processo de concessão de um espaço que equivale ao tamanho de um bairro da capital federal.
O objetivo é incluir a área em oferta de leilões ligados a projetos de ferrovias, mas fazer essa oferta imobiliária em fases. O Ministério dos Transportes pretende ouvir análises do BNDES e da Caixa, para elaborar estudos sobre a oferta da área, tanto em termos de modelo de leilão como de potencial imobiliário.
Com o encontro, o governo espera pôr fim a uma discussão que vinha aflorando os ânimos entre o Executivo e os militares há mais de um ano.
O plano do governo é usar o terreno para explorar seu potencial imobiliário bilionário e, a partir disso, viabilizar não só a construção do VLT (Veículo Leve Sobre Trilhos) que ligará Brasília a Luziânia (GO), em uma rota de 62 km, mas também outros cinco trajetos de passageiros já desenhados em outras regiões do país.
O governo federal não é contra a construção das instalações militares, mas entende que não cabe ao Exército definir o destino do terreno. Na prática, em vez de repassar a área ao GDF, o Ministério dos Transportes pretende conceder o espaço, por meio de um leilão, atrelando a exploração imobiliária à construção das ferrovias.
O plano é adotar um modelo conhecido internacionalmente como “real estate”, pelo qual a concessão ferroviária é associada ao desenvolvimento urbano e imobiliário no entorno das estações.
Além do projeto do DF, a concessão daria apoio financeiro a outros cinco trajetos: Londrina–Maringá (PR); Rio Grande–Pelotas (RS); Fortaleza–Sobral (CE), São Luís–Itapecuru Mirim (MA) e Salvador– Camaçari–Feira de Santana (BA). Todos deverão ter editais de concessão publicados em 2026.
O governo federal entregou em 2006 o terreno para o Exército. Há duas décadas, os militares são responsáveis pela vigilância e conservação da área conhecida como Pátio Ferroviário de Brasília.
Com o passar do anos, a cúpula militar viu a possibilidade de arrecadar recursos com a construção de um novo bairro em área nobre de Brasília. O contrato original com o governo federal, porém, não permitia ao Exército levantar os prédios.
Os militares passaram a negociar com o governo a assinatura de um termo de entrega definitivo do terreno. O aval veio em 2020, durante o governo Jair Bolsonaro (PL).
O debate sobre o terreno voltou no início do governo Lula. Após anos de conflitos sobre o tema, a Advocacia-Geral da União se pronunciou em parecer técnico favorável à retomada da área pelo governo federal.
“É viável juridicamente e aconselhável do ponto de vista da política pública a afetação integral da área do Pátio Ferroviário de Brasília ao serviço público ferroviário, tanto pela porção já atualmente utilizada pela Concessionária FCA – Ferrovia Centro-Atlântica, quanto pelo restante da área para ser aproveitado por exploração imobiliária planejada, com a geração de receitas voltadas ao financiamento de projetos ferroviários estratégicos, como o terminal do VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) entre Luziânia e Brasília”, diz o parecer obtido pela Folha.