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Brasília

Mobilidade Sustentável: Os desafios da descarbonização

Eletrificação de ônibus no país depende de evolução energética e maior investimento financeiro

Vítor Mendonça

31/07/2024 6h05

Ônibus elétrico

Na medida em que os ônibus elétricos são opção para uma mobilidade sustentável, ainda é preciso avançar em estruturação para a funcionalidade desses veículos no Brasil Foto: Vítor Mendonça/Jornal de Brasília

Para além da preocupação com a saúde dos rodoviários no país, a missão de implementação de ônibus elétricos representa uma oportunidade de alinhamento às expectativas de redução de emissões de carbono na atmosfera. O Brasil foi o 13º país com a maior quantidade de emissões de CO² vindas de combustíveis fósseis e da indústria em 2022, com aproximadamente 483,48 milhões de toneladas emitidas, segundo dados do Global Carbon Project, projeto que quantifica as emissões globais de gases de efeito estufa.

De acordo com a Agência Internacional de Energia (IEA, em inglês), cerca de 74,5% das emissões de carbono na atmosfera vêm de atividades terrestres, incluindo o transporte de passageiros e fretes. Aproximadamente 45,1% do total de emissões do planeta abarcam o que é expelido por carros, motos e ônibus.

Nesse sentido, o país tem investido em estratégias para a diminuição de emissões de CO². Dentro do Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), por exemplo, a prioridade é para a aquisição de ônibus com tecnologias de redução de gás carbônico expelido na atmosfera. São R$ 10,6 milhões investidos em municípios brasileiros para a aquisição de 5.350 ônibus mais sustentáveis para a renovação da frota brasileira.

Do quantitativo total, cerca de 2,5 mil ônibus são elétricos. O restante rodará com a tecnologia Euro 6 – que limita a emissão de poluentes veiculares do tipo CO². Atualmente, o Brasil possui 290 veículos urbanos movidos a bateria – cerca de 0,27% dos 107 mil ônibus na frota nacional, segundo levantamento realizado pela Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU). 

De acordo com o ministro das Cidades, Jader Filho, os investimentos na renovação dos transportes urbanos são um compromisso com a mobilidade sustentável do país. “Com isso renovamos a nossa frota e incentivamos o processo importante de tecnologias mais limpas”, destacou o ministro durante fala no 8º Fórum de Debates da Confederação Nacional do Transporte (CNT), em Brasília.

Estruturação

Entretanto, a aquisição de ônibus elétricos no Brasil está condicionada à adaptação das cidades para receber os veículos com zero emissões de carbono. “Não existe uma solução única para o Brasil em relação à questão do transporte. Nós somos um país continental. Criar estrutura nos nossos rincões e fazer a eletrificação dos ônibus não é uma realidade tão próxima. É preciso criar estruturas muito potentes para poder absorver essas demandas”, disse Jader.

De acordo com o professor Pastor Willy Gonzales, do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental (ENC) da Universidade de Brasília (UnB), a primeira das principais barreiras para a implementação da tecnologia elétrica no país está na matriz energética.

“Qualquer projeto para o desenvolvimento de uma cidade é baseado no uso do solo, e o transporte público configura uma demanda de pessoas que precisam se deslocar na cidade. Mas agora surge um outro tipo de planejamento: o energético. Como se manter uma nova tecnologia se não há também esse planejamento [para implementação]? É preciso planejar a matriz energética em si, que entra na pauta agora”, destacou o professor.

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Para o professor Pastor Willy Gonzales, do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental (ENC) da UnB, Brasil precisa avançar na estabilidade da energia para suprir ônibus elétricos. Foto: Vítor Mendonça/Jornal de Brasília

Conforme explica o especialista, a pressão externa para a descarbonização, vinda de órgãos internacionais como a Organização das Nações Unidas (ONU) e de tratados como o Acordo Climático de Paris, tem acelerado o processo de implementação de novas tecnologias para alcançar resultados relevantes para a diminuição do efeito estufa.

Durante a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2023, a COP28, o Brasil apresentou a meta de reduzir em 53% as emissões de gases do efeito estufa até 2030. Uma vez que a COP30 será realizada no país em 2025, ter avanços alinhados aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) é fator relevante para a aceleração no processo de implementação de uma mobilidade urbana mais ecológica.

De acordo com Pastor, o Brasil está começando a pensar de uma maneira estratégica, refletindo sobre o que é bom no curto, médio e longo prazo no que diz respeito à adoção de novas tecnologias para a descarbonização das vias urbanas. 

“Há uma mudança realmente, e essa mudança deve nos levar a trazer novas alternativas para planejar de forma mais acertada. As linhas mestras o governo está dando, mas o encaixamento do que vem do nível superior até chegar no nível operacional vai demorar um tempo e é preciso planejar com especificidades, porque não é um modelo único para todos [os estados], ainda que hajam regiões metropolitanas parecidas”, disse.

Confronto econômico e pressão popular

Outro desafio para a implementação dos ônibus elétricos no país é o custo para a aquisição dos modelos. Um veículo urbano descarbonizado, movido a bateria, varia entre R$ 2,5 e R$ 3 milhões a unidade – quase três vezes mais que um modelo convencional, de acordo com a NTU.

O coordenador e fundador da Comissão de Meio Ambiente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), Olímpio Alvares, destaca que a implementação das tecnologias precisa de uma preparação cautelosa, especialmente segundo o aspecto financeiro, uma vez que envolve recursos públicos e que cidades e municípios tendem à necessidade de subsídios para a aquisição dos veículos elétricos.

Além do custo dos veículos, é preciso pensar nos investimentos em infraestrutura das garagens dos ônibus, que necessitará de adaptação para a recarga dos elétricos, em eventuais trocas de baterias, a adaptação da rede elétrica externa das garagens – que poderá passar de média para alta tensão. “Isso envolve custos milionários”, disse.

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Olímpio Alvares, coordenador da Comissão de Meio Ambiente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), destaca que, apesar do alto custo dos elétricos, veículos têm vida útil maior

Do outro lado do custo inicial alto, porém, a vida útil dos ônibus elétricos, de pouco mais de 15 anos, é maior que a dos ônibus tradicionais, que normalmente é de 10 anos. Assim, segundo Olímpio, o valor pode ser recuperado ao longo da operação dos ônibus elétricos.

“É preciso que tudo seja feito de forma muito cautelosa e prudente, para não haver problemas operacionais e conseguir fazer o serviço de transporte público sem prejudicar os usuários”, explicou.

Neste aspecto, o professor Pastor Willy destaca ainda que há ainda uma pressão popular durante o processo de implementação dos ônibus elétricos nas cidades. “As pessoas [ao olharem para os veículos a bateria] vão querer saber qual o benefício econômico para elas, e se perguntam quanto a mais ela terá que pagar por aquele veículo”, disse. Trata-se, portanto, de uma nova preocupação além das outras que já são permanentes no dia a dia.

“[A população] quer saber quanto ao conforto, à segurança, à pontualidade, confiabilidade – se não vai quebrar no caminho –, que já são preocupações permanentes e de longa data. O planejamento do transporte ainda é deficitário e ainda há muitas carências no atendimento e no respeito ao usuário. Isso ainda não foi resolvido. As pessoas entendem que o veículo novo vai resolver problemas anteriores”, pontuou.

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