O clima de comoção marcou o velório de Isaac Augusto de Brito Vilhena de Morais, de 16 anos, neste domingo (19), na capela 1 do Cemitério Campo da Esperança. Entre lágrimas e abraços, familiares, amigos e colegas de escola se despediram do estudante, morto a facadas na noite de sexta-feira (17), ao tentar recuperar o celular roubado por um grupo de adolescentes no parque entre as quadras 112 e 113 Sul.
O irmão mais velho de Isaac, Edson Aparecido Avelino Júnior, de 28 anos, técnico em tecnologia da informação, relembrou com emoção o menino que, segundo ele, era conhecido pela alegria, pela educação e pelo respeito com todos.
“O Isaac era uma criança muito amada, lá em casa e na vizinhança também. Ele representava alegria para todos. Cumprimentava do porteiro ao síndico, nunca fazia distinção de ninguém. Se passasse cem vezes pela portaria, dava cem vezes bom dia”, contou Édson, visivelmente abalado.

O jovem, que havia acabado de concluir o curso de inglês, sonhava em seguir os passos do irmão e se tornar analista de segurança da informação. “Ele me dizia que queria trabalhar com TI, como eu. Conversávamos sobre a profissão, e isso me dói muito, porque ele não vai poder realizar esse sonho”, lamentou.
De acordo com Edson, o irmão era um adolescente responsável, querido na escola e entre os amigos da quadra, onde costumava jogar bola e andar de bicicleta nas tardes livres. “Apesar da idade, ele era muito centrado. Tinha uma liderança natural com os colegas e sempre buscava fazer o certo”, descreveu.
A última conversa entre os dois aconteceu um dia antes do crime. “Mandei mensagem dizendo que ele precisava dar mais alegria à nossa mãe, ser mais responsável, porque ela andava preocupada com ele. Nunca imaginei que seria a última vez que falaríamos”, contou o irmão, com a voz embargada.

Na casa da família, em Brasília, o quarto que os dois dividiam continua do mesmo jeito. “As coisinhas dele ainda estão todas lá, certinhas. Por enquanto, a gente tem o apoio dos amigos e da família, mas vai ser difícil quando o tempo passar”, disse Édson.
Com o olhar firme, fez também um apelo por mudanças: “A gente vive num país em que, com 16 anos, você pode votar e decidir o futuro de milhares de pessoas. Então também deve responder pelos seus atos. Trabalhar não é crime; eu comecei com 14 anos, e isso molda o caráter. O que aconteceu com o Isaac não pode se repetir.”
Dor compartilhada
Antes do velório, ainda pela manhã, a vizinhança organizou uma homenagem nas entrequadras 112/113 Sul. Balões brancos foram soltos no céu em sinal de paz, enquanto amigos e familiares deixavam flores e bilhetes com mensagens de carinho.
Entre os participantes estava o auditor federal Ricardo Eugênio Monteiro Coelho, vizinho e amigo da família, que relembrou o momento da tragédia e o sentimento de insegurança que paira sobre a comunidade.
“Os meninos jogavam bola quando foram abordados por três adolescentes armados com faca, que pediram os celulares. O Isaac reagiu, correu atrás, mas levou uma facada certeira no peito. O colega dele ainda tentou socorrer, mas ele caiu ali mesmo, dentro do parque”, contou Ricardo.
Ele criticou a demora no atendimento de emergência. “O socorro demorou cerca de 50 minutos para chegar, mesmo com o Corpo de Bombeiros a menos de dois quilômetros. Primeiro veio um carro que não era ambulância, só depois chegou a unidade de resgate. O pai é cirurgião, a mãe enfermeira, e nem assim conseguiram salvá-lo. Foi desesperador”, relatou.
O vizinho afirma que o caso não é isolado. “Meu filho de 17 anos também já foi assaltado ali perto. É um tipo de crime que se repete, de adolescentes que roubam celulares para vender por quinhentos reais. Está virando rotina. A diferença é que, desta vez, a violência foi ainda mais brutal”, lamentou.
Crime e investigação
Isaac foi morto por um adolescente de 15 anos, que havia sido apreendido apenas 18 dias antes por tráfico de drogas. A Polícia Militar do Distrito Federal prendeu seis suspeitos no Paranoá.
Segundo o secretário de Segurança Pública, Sandro Avelar, o grupo era “inexperiente”, e o caso foi classificado como latrocínio (roubo seguido de morte). O celular da vítima ajudou a rastrear e localizar os envolvidos.
A governadora em exercício, Celina Leão (PP), afirmou que o episódio é “isolado”, mas defendeu o endurecimento das punições para menores infratores. “Por que um adolescente de 16 anos pode votar e não pode responder pelos crimes que comete?”, questionou.
A fala ecoa o sentimento de revolta de familiares e moradores. Para Édson, a resposta à morte do irmão precisa ir além da prisão dos envolvidos. “É preciso mudar a forma como lidamos com esses casos. Que o Isaac sirva de exemplo e não seja apenas mais um nome nas estatísticas”, afirmou.