Andréia Castro
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Estudar, trabalhar, cuidar dos filhos, ganhar dinheiro e ser bem-sucedido são algumas das cobranças que enfrentamos no dia a dia e que, muitas vezes, acabam gerando o tão falado mau humor – sentimento que, uma hora ou outra, acaba tomando conta do nosso estado de espírito. Pessoas mal-humoradas como o carrancudo Dom Casmurro, personagem de Machado de Assis, que parecia padecer de uma rabugice eterna, são cada vez mais comuns.
O sentimento pode vir aos poucos, causar uma leve irritação e desaparecer. Ou então, se prolongar, deixando a pessoa ansiosa, excessivamente crítica e sem ânimo para nada. Crises de mau humor passageiras, ou constantes, podem acabar atrapalhando o convívio, além de gerar desconforto e até problemas de saúde mais graves.
Segundo o psicólogo cognitivo da Universidade de Brasília, Fabrício Fernandes Almeida, existem vários níveis de mau humor. “O mal-humorado ocasional é aquele que tem baixa resistência à frustração e falta de habilidade em lidar com situações estressantes”, explica. Fabrício revela que existem pessoas que acabam gerando expectativas negativas já no começo do dia e continuam mal-humoradas até irem dormir. “Tem também aqueles que conseguem tirar o foco do que os incomoda com alguma atividade ou hobbie”.
Mau humor crônico
No caso mais extremo, está o mal-humorado crônico, que sofre de uma doença chamada distimia. “É quem possui o estado de espírito do Hardy Har Har, a hiena de desenho animado famosa por viver resmungando “Oh dia, oh céu, oh vida, oh azar”, exemplifica Fabrício.
Neste caso, a característica já nasceu com a pessoa, que precisa conviver com a famosa nuvem cinza em cima da cabeça diariamente.
Um estudo da psicóloga Sonja Lyubormisky, da Universidade de Stanford (EUA), revelou que o humor é 50% geneticamente determinado, 40% determinado pela maneira como pensamos e agimos e apenas 10% por situações da vida – ou seja, acontecimentos felizes ou infelizes. Os dados mostram que é possível mudar o humor ou pelo menos tentar. “Todo mundo pode ter um hobbie ou parar 20 minutos durante o dia e tentar fazer algo que goste, que relaxe. Recarregar as baterias é vital para melhorar o estado de espírito”, ensina Fabrício.
Movimente-se
Quando nos colocamos em movimento, praticando atividade física, por exemplo, também melhoramos o humor. O estudante de Sistemas de Informação Alexandre Vinícius, de 24 anos, assume ser bastante mal-humorado, mas consegue controlar o humor fazendo exercícios. “Claro que não é o tempo todo, mas o mau humor acaba aparecendo, principalmente quando acordo”, conta. Ele diz que a academia acaba sendo uma válvula de escape para não descontar o mau humor em outras pessoas. “Desconto o estresse e o pavio curto nos ferros. E dá certo porque eu consigo ter qualidade de vida dessa forma”, revela.
O estudante, que malha de segunda a sábado, duas horas e meia por dia, já precisou se afastar dos exercícios por motivos de saúde e afirma que o humor piorou ainda mais. “Minha natureza é impaciente e irritadiça. E quando adoeci, acabei voltando a malhar antes da hora para melhorar a convivência com a família e os amigos”, finaliza.
Lyubormisky mapeou em sua pesquisa algumas atividades capazes de melhorar o humor. São elas: expressar gratidão, cultivar o otimismo, evitar cismas e comparações sociais, cultivar relacionamentos, desenvolver estratégias de superação, aprender a perdoar, desfrutar as alegrias da vida, comprometer-se com metas e cuidar do corpo.
Zangados de plantão
Alexandre explica que não precisa de um motivo específico para pintar o mau humor. “Pode ser uma noite mal-dormida, um plano frustrado ou até mesmo uma discussão com a minha mãe. Qualquer coisa pode acabar me deixando chateado”, garante.
Para o psicólogo Fabrício Fernades Almeida é fácil desencadear uma crise de mau-humor. “Um grande engarrafamento, por exemplo, pode revelar diferentes atitudes. Há pessoas que gritam, buzinam e reclamam da situação. Outras ligam o som e tentam tirar proveito daquele problema”, explica.
O historiador Thiago Facó, 26, tenta levar as intempéries da vida com bom humor, mas admite que nem sempre consegue. “O auge do meu mau-humor aparece logo pela manhã, quando estou apressado para sair de casa. Nessa hora, não gosto nem que falem comigo”, assume.
Ele afirma que, apesar disso, não se considera uma pessoa mal-humorada. “Sou impaciente, mas logo o humor melhora. São pequenos momentos de falta de humor. (risos)”, conta ele.
Thiago revela, no entanto, que os amigos o consideram “reclamão”, chato. “Tenho um jeito mais rude de me expressar e acabo passando uma certa aspereza em determinados momentos”, afirma.
“Reconheço que minha impaciência, às vezes, é exagerada. E sei que as pessoas não são obrigadas a agirem como eu quero ou com a rapidez que eu espero. E, nesse sentido, sei que estou errado”, finaliza Thiago. Não sem antes reiterar que seus momentos de mau humor duram apenas “dois minutinhos e pronto”.
Para o sociólogo Pedro Andrade, essa maneira de ser pode sim ser taxada de mau humor. “Mas é aquele mau humor leve, que vem e vai. Incomoda as pessoas, mas não passa disso. Preocupante mesmo são aqueles que não conseguem abandonar o papel de zangado e passam 24 por dia assim”, analisa.