Mais de 4.912 ocorrências de acidente de trabalho foram registradas no DF em 2025, apenas de janeiro a maio. Os dados do Ministério do Trabalho e Emprego mostram que houve um aumento de 13% de casos neste ano. No mesmo período do ano passado, o número de registros do tipo foi de 4.334 ocorrências. O número de mortes de trabalhadores enquanto exerciam a função também aumentou de 14 em 2024 para 18 óbitos de janeiro a maio deste ano.
Segundo Marcos Góis de Araújo, auditor-fiscal do Trabalho e Chefe do Setor de Segurança e Saúde no DF do Ministério do Trabalho e Emprego, diversos fatores podem explicar o aumento dos acidentes de trabalho. Ele aponta que os principais se devem ao número baixo de auditores-fiscais do Trabalho para atender toda a demanda de Segurança e Saúde no Distrito Federal e Entorno. “Contamos com apenas 10 profissionais, sendo que apenas 1 com dedicação exclusiva à indústria da construção civil. A título de comparação, esse número em 2010 era de 12”, destacou.
Outro fator que Marcos considera relevante para esse cenário, é a precarização do trabalho, com as empresas contratando cada vez menos via CLT e com a terceirização de todo tipo de atividade sem qualquer controle. Dessa forma, ele frisou que os funcionários ficam à mercê de sua própria sorte sem as proteções coletivas adequadas, sem treinamentos apropriados e com equipamentos de proteção ausentes ou inadequados. “A soma desses dois fatores pode ser um indicativo importante na explicação deste aumento”, completou. Ele acrescentou que a nomeação de 900 novos Auditores-Fiscais do Trabalho para o Brasil inteiro está parada, devido a decisão de um juiz de Rondônia que suspendeu liminarmente o concurso. Marcos considera que para que haja uma minimização do número de acidentes, é preciso que as empresas contratem trabalhadores formais, obedecendo à CLT e às Normas Regulamentadoras.
Sobre os acidentes de trabalho no DF, Marcos salientou que não existem acidentes comuns na região, devido ao fato das atividades econômicas serem bem variadas. Ele ainda apontou que os últimos 3 acidentes que aconteceram na região foram em atividades distintas: em um caso, o trabalhador fazia uma atividade acessória na produção de cimento, outro foi uma queda em um fosso de elevador e o último em uma queda na manutenção de uma fachada em uma edificação localizada no setor Noroeste. Entretanto, ele salientou que o setor que mais acidenta no DF é a Construção Civil.
Ainda de acordo com o auditor-fiscal, na área de saúde e segurança do Trabalho, há uma fiscalização de segurança e saúde que é feita com base em dados de sistemas governamentais que identifica as atividades econômicas e empresas que mais acidentam/adoecem os trabalhadores, baseada nos dados dos anos anteriores. Com isso, é realizado um planejamento anual com foco em ações nessas empresas e atividades econômicas. Ele afirmou que um residual de 10% de ações de auditoria fiscal são feitas em empresas denunciadas que aparentam ter riscos maiores para a integridade física de seus trabalhadores.
Segundo ele, quando acidentes de trabalho acontecem um auditor-fiscal do Trabalho fica responsável por realizar a análise do mesmo. “Essa análise é feita com o objetivo de identificar as inadequações que ocorreram para a ocorrência do acidente. Nós não buscamos culpados, mas sim solucionar as questões para que novos acidentes não ocorram, corrigindo-se procedimentos, treinamentos, proteções, e tudo que levou ao acontecimento”, pontuou.
Direitos do trabalhador
O coordenador do curso de Direito da Faculdade Anhanguera de Brasília, Thiago Caetano Luz, citou os direitos que conforme a legislação brasileira, o trabalhador acidentado tem, tais quais: a atendimento médico e hospitalar custeado pela empresa nos primeiros socorros; à emissão da Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) pelo empregador junto ao INSS; ao auxílio-doença acidentário (B91), pago pelo INSS a partir do 16º dia de afastamento; à estabilidade provisória de 12 meses após o retorno ao trabalho (art. 118 da Lei 8.213/91); aos depósitos de FGTS durante o período de afastamento; além da possibilidade de indenização civil caso seja comprovada culpa ou negligência do empregador.
Ele também explicou o que caracteriza legalmente um acidente de trabalho, segundo o art. 19 da Lei 8.213/91: “O acidente de trabalho é aquele que ocorre pelo exercício da atividade laboral, causando lesão corporal, perturbação funcional ou doença que resulte em morte, perda ou redução da capacidade para o trabalho”, disse. De acordo com Thiago, a lei também equipara a acidente de trabalho a doença ocupacional (profissional ou do trabalho), o acidente no trajeto (casa–trabalho e trabalho–casa), agressões, sabotagens, imprudência de terceiros, entre outros casos.
Dentre as várias situações caracterizadoras de acidentes de trabalho, ele considera que é possível citar quedas de altura, lesões por esforço repetitivo (LER/DORT), acidentes com máquinas e equipamentos, choques elétricos, acidentes de trajeto e problemas de saúde mental relacionados ao trabalho. Sobre a saúde mental, ele acredita que sejam problemas que estão sendo cada vez mais reconhecidos.
Ele ressaltou que o trabalhador acidentado não pode ser demitido durante o período de afastamento. O contrato de trabalho fica suspenso durante o recebimento do benefício. “Além disso, ao retornar, o empregado tem garantia de emprego por 12 meses conforme a Lei 8.213/91, art. 118”, destacou.
Segundo ele, a empresa tem que cumprir algumas obrigações em caso de acidente de trabalho, como a emissão da CAT imediatamente. Além disso, o empregador deve providenciar os primeiros socorros e custear o atendimento de urgência, recolher FGTS durante o afastamento, adotar medidas de prevenção e segurança para evitar novos acidentes. Para além desses itens, o empregador deve cooperar com a fiscalização do Ministério do Trabalho e Previdência.
As empresas podem ser responsabilizadas judicialmente, se na investigação de um caso de acidente de trabalho for apontado que houve negligência, como ausência de equipamentos de proteção individual (EPI) e omissão quanto às normas de segurança. A responsabilidade também pode ser apontada em casos de ambiente de trabalho insalubre ou perigoso sem as devidas medidas de proteção, assédio ou pressão excessiva que pode contribuir para doenças ocupacionais.
Mercado legal e ilegal na construção civil
Segundo José Antônio Bueno Magalhães Júnior, o diretor de políticas e relações trabalhistas do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Distrito Federal (Sinduscon DF), o grande problema hoje, que faz com que os acidentes de trabalho aumentem, é o mercado ilegal. Para ele, a solução seria que essas empresas procurassem os meios necessários para atuarem de forma legalizada no setor de construção civil.
Ele afirmou que a Sinduscon atua com o mercado legal, orientando e alertando as empresas atendidas pela entidade. “Nós temos um tripé na construção civil que são os EPIs, EPCs e as medidas administrativas”, salientou. O EPI, ainda de acordo com José, é o equipamento de proteção individual, que é visto com mais facilidade a exemplo do capacete, a bota e o cinto de segurança. Já o EPC se refere ao equipamento de proteção coletiva, que são instrumentos de proteção como os aparadores de queda e de lixo. “Essas são mais difíceis de serem detectadas por quem não conhece”.
E no terceiro item, estão as medidas administrativas, que são os treinamentos de pessoal, investimento na área, compra de materiais e limpeza da obra, por exemplo. “Onde o funcionário é colocado em um local compatível com o treinamento dele. Não adianta eu dar um treinamento para um funcionário e o colocar em outra área”, frisou. Para José, também não vai adiantar investir somente em equipamentos de segurança, é preciso investir em tudo. “Nós já chegamos a um ponto hoje, em que a gente investe na qualidade de vida do funcionário. Nós damos cursos para eles, assim como atendemos a parte psicológica e social”, destacou. As oficinas realizadas pela SInduscon incluem até cursos de educação financeira, porque o Sindicato entende que esse é um tópico que também afeta a vida pessoal e profissional de uma pessoa. Ele acrescentou que nesse sentido, o setor conta ainda com o Serviço Social da Indústria da Construção Civil (Seconci), que atende os funcionários fazendo esse serviço de assistência e apoio.
Ele afirmou ainda que atualmente são gastos 7% a 8% do valor da obra em saúde e segurança do trabalho, quando se está falando das empresas que buscam atuar no mercado legal. José acredita que saúde e segurança do trabalho se trate da prevenção de acidentes no trabalho. “Nós atuamos para evitar o acidente. Depois que acontece, não adianta. Então nós temos que criar uma cultura da saúde e segurança do trabalho”, comentou. Ele afirma que essa cultura vai permitir que os funcionários já cheguem na obra cobrando o necessário para o bem-estar deles naquele ambiente. “Isso deve ser praticado porque é bom para a empresa, é bom para a cidade e é bom para o funcionário”, finalizou.
Saiba mais
Para fazer denúncias ou reclamações relacionadas a acidentes/doenças do trabalho, existe um canal de denúncia: https://denuncia.sit.trabalho.gov.br/home. Ou presencialmente na Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do DF no Shopping Venâncio 2.000, localizado no 1º andar bloco B-50, toda segunda-feira e sexta-feira das 9h às 13h.
Casos recentes de óbitos em acidente de trabalho no DF
Um trabalhador de 42 anos morreu durante a manutenção de um elevador em agosto, no Condomínio Allegro em Ceilândia. Em setembro, um trabalhador de 40 anos morreu após cair de uma cobertura no edifício Parque das Gardênias, no Noroeste.