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Brasil

Crescem publicações sobre suicídio no Brasil durante a pandemia; veja como buscar ajuda

Para obter os novos resultados, o CQM monitorou as redes brasileiras ao longo de 29 dias em maio de 2020 e contabilizou 103.923 menções ao tema

Redação Jornal de Brasília

03/07/2020 15h26

Marcella Franco
São Paulo, SP

Desde que se mudou para o mesmo terreno em que mora toda a família do marido, no interior do Paraná, Helena* (o nome foi trocado a pedido da entrevistada), de 23 anos, não conseguiu mais ser feliz. Longe de seus pais e dos irmãos, diz que detesta o lugar e que se sente sozinha.

O marido nunca foi “do tipo que para em casa”, diz ela. “Recentemente descobri umas coisas dele que ainda fizeram tudo piorar.” Na pandemia, é ela quem cuida sozinha dos dois filhos de quatro anos e da bebê de nove meses.

Para se distrair, Helena participa de um grupo no Facebook. O objetivo lá é encontrar e divulgar perfis de pessoas que já morreram. Na semana passada, diante do nome e da foto de uma mulher um pouco mais velha que ela e que cometera suicídio, Helena comentou: “Queria ter essa coragem”.

“Tem horas que vem uma angústia. Dá vontade de sumir, de morrer, de se matar. Fazer alguma coisa para tirar isso de dentro. Meu marido tem espingarda, mas penso nos meus filhos. O menino é muito apegado a mim”, diz.

Publicações como a de Helena engrossam um levantamento feito pelo ComunicaQueMuda (CQM), plataforma digital da agência nova/sb que tem como foco propor debates sobre temas considerados polêmicos. Este é o terceiro ano que o suicídio suscita pesquisa do CQM.

Por meio de menções no Twitter, no Instagram, no YouTube, no RSS e no Facebook, foi possível comparar que, enquanto em 2017 a principal conexão do tema era com o jogo “Baleia Azul”, e, em 2018, com a série “13 Reasons Why”, em maio passado os posts relacionados a suicídio foram provocados pelo isolamento social atual.

“O tema, assim como a tristeza, começou a aumentar nas postagens dos internautas. Em 2017, o assunto ainda era tabu, mesmo com quase 800 mil vítimas por ano, um suicídio a cada 40 segundos no mundo, e outras 20 tentativas para cada caso”, diz Bia Pereira, diretora da agência e coordenadora do CQM.

De acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde), em 2014, 10.631 pessoas cometeram suicídio no Brasil. A maioria é masculina: a cada dez suicídios, oito são de homens e dois, de mulheres. Para a OMS, 90% dos casos aqui e no mundo todo poderiam ter sido evitados.

Para obter os novos resultados, o CQM monitorou as redes brasileiras ao longo de 29 dias em maio de 2020 e contabilizou 103.923 menções ao tema. Dentro deste número, registrou aumento no número de depoimentos e relatos. De 6,3% em 2017, passaram para 23,5% em 2020.

“Isso mostra que as pessoas estão mais confortáveis em falar sobre como se sentem”, diz a coordenadora. O número de notícias a respeito do suicídio, por sua vez, subiu de 7,5% para 42%, enquanto a frequência de piadas sobre o assunto diminuiu. Antes contabilizavam 34% das postagens, e agora são apenas 3%.

A pesquisa avaliou também as publicações que disseminam conteúdo positivo, como reflexões acerca da seriedade da depressão ou que incentivam a busca por ajuda. Enquanto em 2017 elas representavam 28,8% do total, em 2020 passaram para 63,5%.

“Esses comentários abrem uma porta para que essas pessoas compreendam que podem falar sobre como se sentem, que tem alguém para ouvi-las. Também são fundamentais para equilibrar o debate do tema nas redes, que é infestado por haters e desinformação”, completa Pereira.

“Não tenho ninguém para conversar. Minha família mora muito longe, e não converso com os parentes do meu marido. Só tenho meus filhos mesmo, e não gosto de falar muito sobre mim porque as pessoas não entendem”, conta Helena, que diz nunca ter cogitado fazer terapia.

“Suicídio tem a ver com um sofrimento insuportável que a pessoa acha que não vai acabar nunca. É preciso mostrar que é possível transformar essa esperança na morte em esperança de que a pessoa pode ser tratada, pode buscar outros caminhos, entender as coisas e reagir a elas”, explica Karen Scavacini, psicóloga cofundadora do Instituto Vita Alere de Prevenção e Posvenção do Suicídio.

Qualquer pessoa pode pensar em suicídio em algum momento da vida, de acordo com a psicóloga, mas, para a maioria, é um pensamento que, assim como chega, vai embora. “Mas, quando a pessoa começa a pensar muito em morrer, não consegue afastar esses pensamentos e vê o suicídio como uma saída viável, aí é o momento de pedir ajuda.”

Scavacini afirma que, ao se deparar com uma publicação como a de Helena, é preciso agir. No caso de desconhecidos, a melhor recomendação é utilizar as ferramentas de denúncia da plataforma onde o comentário foi postado. “Vão analisar e mandar mensagem sem que a pessoa saiba quem fez a denúncia”, diz.

Se a publicação for de um amigo, ofereça ajuda falando de forma privada, sem que ele seja exposto.

“Estamos em uma época de muitas perdas, é algo que mexe com todos. Quanto mais estresse uma comunidade passa, mais afetada será sua saúde mental. E, quanto pior a saúde mental, maiores são as chances de o suicídio acontecer.”

E, caso quem precise de ajuda seja você mesmo, Scavacini sugere a conversa com pessoas próximas e uma pesquisa por locais com atendimento gratuito online durante a quarentena.

“Tente também respirar fundo e fazer planos para, se possível, colocá-los em prática quando a pandemia acabar. Mas, mais do que tudo, seja atendido e avaliado por um profissional da área da saúde mental.”

SINAIS DE ALERTA

Falar sobre querer morrer, não ter propósito, ser um peso para os outros ou estar se sentindo preso ou sob dor insuportável
Procurar formas de se matar
Usar mais álcool ou drogas
Agir de modo ansioso, agitado ou irresponsável
Dormir muito ou pouco
Se sentir isolado
Demonstrar raiva ou falar sobre vingança
Ter alterações de humor extremas

O QUE FAZER

Não deixe a pessoa sozinha
Tire de perto armas de fogo, álcool, drogas ou objetos cortantes
Leve a pessoa para uma assistência especializada
Ligue para canais de ajuda

188

É o telefone do Centro de Valorização da Vida (CVV). Também é possível receber apoio emocional via internet (www.cvv.org.br), email, chat e Skype 24 horas por dia

ATENDIMENTO GRATUITO

Psicanálise na Praça Roosevelt, de São Paulo
Atendimentos aos sábados, das 11h às 14h

Psicanálise na Rua, de Brasília
Contato: facebook.com/psinarua
Para moradores do DF e entorno; atendimentos às sextas, das 16h30 às 18h30, e aos sábados, 10h às 12h

Psicanálise na Praça, de Porto Alegre
Atendimentos aos sábados, das 11h às 14h

Psicanálise de Rua, de São Carlos (SP)
Atendimentos aos sábados, das 11h às 14h, para pessoas da região de São Carlos

Grupo bate-papo, de Brasília
Atendimentos: terças, às 13h; quartas, às 10h e às 14h; sextas, às 10h

Varandas Terapêuticas – Instituto Gerar
Contato: tel. (11) 3032-6905 e (11) 97338-3974
Atendimentos: mediante agendamento
Pagamento voluntário

EscutAto – Instituto de Psicologia da USP (IPUSP)
Atendimentos: mediante agendamento

As informações são da FolhaPress

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