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Brasil

Covid-19 faz Estados planejarem ir às casas, criar hospitais e até vetar cirurgia

Com 252 pacientes sob investigação em 15 Estados, mais o DF, as secretarias estaduais de Saúde se preparam para enfrentar um eventual agravamento do quadro

Redação Jornal de Brasília

02/03/2020 7h54

Compras de mascaras na rua das farmacias aumentam pelo risco do Coronavirus Foto: Vitor Mendonca/JBr Data: 26-02-2020

A chegada ao País do novo coronavírus, que teve seu segundo caso confirmado em São Paulo neste sábado, 29, colocou a estrutura de saúde no nível “perigo iminente”, um estágio abaixo do limite para a declaração de emergência por circulação por contaminação interna da doença no País. Com 252 pacientes sob investigação em 15 Estados, mais o Distrito Federal, as secretarias estaduais de Saúde se preparam para enfrentar um eventual agravamento do quadro, planejando atendimento domiciliar e até a suspensão de tratamentos e cirurgias agendadas para a liberação eventual de leitos.

“Esse cancelamento de procedimentos eletivos é uma possibilidade extrema, sempre cogitada quando há muitos casos de urgência”, explica o presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Alberto Beltrame, titular de Saúde do Pará. “Isso só ocorrerá se houver uma sobrecarga de casos graves, coisa que, neste momento, não há como estimar.”

Com a maior concentração de casos suspeitos no País, o Estado de São Paulo tem ainda 136 pacientes em avaliação. De acordo com o governador João Doria (PSDB), o Estado “vai investir R$ 30 milhões em um programa de prevenção do coronavírus”, dos quais R$ 14 milhões serão destinados a uma campanha de conscientização a ser veiculada em meios de comunicação e redes sociais. A ação será iniciada na próxima semana. “Os R$ 16 milhões restantes serão utilizados para apoio operacional”, informou.

O segundo colocado com maior concentração de casos suspeitos é o Rio Grande do Sul, com 27 pacientes em observação. De acordo com as autoridades gaúchas, não há investimento em equipes para atendimento domiciliar. Em Minas, porém, que conta 17 pacientes sob suspeita, as equipes técnicas do setor incluíram em seu plano de contingência a criação de times médicos e de enfermagem com até sete profissionais, cada uma com custo semanal de R$ 39 mil. “São necessários um coordenador médico; um coordenador de enfermagem; um médico plantonista por turno de 6 ou 12 horas; um enfermeiro plantonista por turno de 12 horas; um técnico em enfermagem plantonista por turno de 12 horas; um técnico de enfermagem para transporte na ambulância; e um motorista”, prevê

O plano do governo mineiro considera ainda, no nível 3, com cenário agravado, a criação de um “hospital de campanha”. Para cada 15 leitos extras, o plano prevê 18 profissionais, 6 deles médicos. Além disso, o documento mineiro estabelece uma lista de materiais, como aparelho de pressão arterial, estetoscópio, máscaras N-95, máscaras cirúrgicas, termômetros, luvas, óculos de proteção, lanternas, kits para coleta de amostras, álcool, capotes e sacos plásticos para material infectado, além de receituários.

A preocupação com o vírus cresceu também na Bahia, com nove casos suspeitos. No início de fevereiro, durante a reunião do Conass em Brasília, que tratou dos planos de contingência, o secretário de Saúde, Fábio Vilas-Boas, defendeu que o repasse de recursos adicionais aos estados fosse na casa dos R$ 600 milhões para a intensificação do plano de emergência de vigilância sanitária no País.

Planejamento

“Como todo plano de contingência, são traçados vários cenários e temos de pensar em tudo, desde uma situação mais leve até situações mais críticas”, explica o presidente do Conass, comentando as propostas. De acordo com Beltrame, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, “já adiantou a intenção de colocar mil UTIs extras no sistema, ou seja, mil conjuntos de equipamentos para reforçar o sistema, em caso de necessidade” e ações com a indústria – para obter máscaras, por exemplo – também já avançaram.

Beltrame voltou a destacar que, embora o País não esteja vivendo uma situação de epidemia, o governo federal garantiu que repassaria os recursos necessários para de custeio. “O ministro não disse quanto. Mas estamos confiantes. Tenho dito que o Brasil tem uma vantagem em relação a maior parte dos demais países. Temos o SUS (Sistema Único de Saúde). Isso nos dá a articulação necessária entre todos os gestores para enfrentar uma situação de emergência em saúde pública. Nos reunimos regularmente uma vez por mês. O SUS tem outra vantagem – gratuidade e universalidade do atendimento. Isso vale para todos Atende a todos. Envolve inclusive a rede privada, que adota os mesmo critérios de vigilância, prevenção e eventual tratamento dos casos.”

Cirurgias

No Rio de Janeiro, as autoridades também desenharam um mapa da situação de cada uma das unidades hospitalares, número de leitos, localização e situação, classificando as situações por Nível Zero, 1, 2, 3 (contingência máxima). No caso de um agravamento rápido do quadro, locais como o Hospital Anchieta contam com 60 leitos em fase de contratação. Nos Hospitais Municipal Ronaldo Gazolla, dos Servidores do Estado, da Lagoa e Alberto Torres pode haver “suspensão de cirurgias” programadas.

O secretário de Saúde do Rio, Edmar Santos, ainda anunciou que, de 30 a 40 dias, haverá um hospital com 75 leitos que poderão ser dedicados exclusivamente às vítimas do Covid-19, algo semelhante ao feito na China, e alvo de críticas de especialistas (mais informações nesta página). Ele não quis revelar, porém, onde será a nova unidade, para não forçar uma demanda.

O mapeamento do sistema ocorre também no Ceará. O Estado tem 145 hospitais com 1.475 respiradores e ventiladores, sendo 1.337 aparelhos em uso. A maior concentração de leitos e equipamentos está nas 44 unidades da capital, Fortaleza, mas o Estado tem uma rede com capacidade de 53 centros médicos, nos quais há 110 leitos para isolamento de pacientes, 93 deles no SUS.

A orientação para as equipes médicas cearenses é a de que casos graves de infecção sigam para isolamento nos seguintes hospitais: São José de Doenças Infecciosas, de Fortaleza; Hospital Regional Norte, de Sobral; Hospital Regional do Sertão Central, de Quixeramobim; e Hospital Regional do Cariri, em Juazeiro do Norte.

Menor impacto

Em Goiás, apenas dois casos são suspeitos, um homem e uma mulher, que aguardam diagnóstico. Outros três casos contabilizados pelo Ministério já foram descartados por exames no Estado, cujos resultados foram concluídos na tarde de sexta-feira – embora ainda aparecessem no quadro oficial ontem. Já em Mato Grosso, um dos que não registram nem suspeitas da doença, o governo informou, em nota, que a estrutura hospitalar permanece em alerta, com o Hospital Universitário Júlio Müller como referência e com uma unidade de retaguarda, que é o Hospital Estadual Santa Casa.

Especialistas elogiam propostas

Infectologistas ouvidos pela reportagem disseram que as ações dos planos de contingência locais precisam levar em consideração os erros e os acertos da estratégia adotada na China para conter o avanço do vírus. Epicentro da epidemia, algumas decisões adotadas pelas autoridades chinesas podem ter contribuído para a exaustão do sistema de saúde e a sensação de pânico na população

Para os especialistas, o atendimento domiciliar previsto por alguns Estados é uma ótima opção para os casos de menor gravidade, poupa recursos financeiros e libera os leitos e recursos médicos para quadros mais graves – incluindo o de outras doenças. “Na China, parece ter havido a intenção de internar todos os casos suspeitos e confirmados e isso levou ao colapso do sistema, sem que conseguissem atender a toda a demanda. E ainda trouxe problemas para outros tratamentos de saúde. Por ser uma situação inédita, pensou-se que essa era a melhor opção”, avalia Francisco de Oliveira Junior, médico do Instituto de Infectologia Emílio Ribas.

Com as informações adquiridas atualmente sobre o impacto do vírus, se sabe que a maior parte das pessoas apresenta sintomas leves e sem complicações, podendo ser tratada em casa. Por isso, os especialistas avaliam como acertada a estratégia de atendimento domiciliar. No entanto, destacam que é preciso pensar em duas etapas para esse formato, com monitoramento ativo e passivo dos pacientes, de acordo com o total de casos confirmados.

Monitoramento ativo é o que tem ocorrido até esse momento no País, com as secretarias de Saúde ligando e visitando as pessoas com suspeita de terem contraído o coronavírus. Também é o que tem ocorrido com os dois casos confirmados da doença, de viajantes de São Paulo que trouxeram o vírus da Itália – ambos são acompanhados.

“Ligar periodicamente, perguntando se a pessoa melhorou ou piorou, indagar sobre a temperatura, e se houve algum novo sintoma, é muito eficaz. Mas pode não ser viável e sustentável se o número de contaminados foi muito alto”, diz Oliveira Junior Nesse caso, segundo ele, pode ser criada uma central de atendimento para orientar a população e colher informações sobre o estado de saúde delas.

O infectologista Jean Gorinchteyn lembra que o atendimento domiciliar também pode aproveitar a estrutura e a experiência das equipes já existentes do programa de Saúde da Família. “Aproveitando as equipes que já estão implementadas em determinadas cidades ou regiões dos grandes centros. Assim, as pessoas evitam grandes deslocamentos para os hospitais sem ficar negligenciadas.”

Outro ponto que destacam dos planos de contingência são as campanhas de prevenção. Para os infectologistas, elas são uma das ações mais importantes no controle do coronavírus e também de outras doenças. “Temos uma oportunidade importante de introduzir novos hábitos à população e assim prevenir outros tipos de doença no futuro”, diz Oliveira Júnior.

Hábitos

Para Gorinchteyn, no entanto, é importante que as campanhas não foquem apenas em ações educativas e propagandas, mas também em um esforço mais ativo para induzir a mudança de hábitos na população. “Seria interessante se ônibus e vagões do metrô tivessem dispensadores de álcool em gel nas portas. É uma prática importante para um ambiente de grande aglomeração e baixa circulação de ar. Na época do H1N1, práticas parecidas foram adotadas por restaurantes e lanchonetes, perduram até hoje e viraram rotina para muitos.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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