O entrevistado da semana da Coluna Três Poderes é o presidente da CEB, Edison Garcia (foto). Desde 2019 à frente da Companhia Energética de Brasília, Edison conduz uma gestão marcada pela modernização da iluminação pública, expansão de fontes renováveis e articulação com o setor privado. Ex-procurador da Advocacia Geral da União (AGU) e ex-presidente do INSS, hoje também integra os conselhos das distribuidoras do grupo Neoenergia. Na conversa com o JBr, ele fala sobre trajetória, gestão, desafios e projetos futuros.
Qual foi o principal desafio que enfrentou ao assumir a presidência da CEB em 2019?
O maior desafio foi, sem dúvida, conduzir a reestruturação da companhia em meio à necessidade de privatizar a CEB Distribuição. Quando assumi, a empresa vivia um momento muito desafiador: além de prejuízos recorrentes e limitações operacionais, a CEB-D apresentava alguns indicadores muito ruins e precisava de uma empresa privada que tivesse disponibilidade para fazer investimentos. De 2021 até agora, por exemplo, a Neoenergia já investiu mais de R$ 1,5 bilhão na área de distribuição de energia no DF, o que melhorou consideravelmente a prestação de serviço à população. Além disso, conduzimos um processo técnico e transparente de desestatização, aprovado pelo Tribunal de Contas e realizado em plena pandemia. O leilão foi um sucesso: arrecadamos R$ 2,5 bilhões, com ágio de 76% sobre o lance mínimo. Isso permitiu que a CEB voltasse seu foco para infraestrutura energética, com destaque para iluminação pública eficiente e projetos estruturantes de geração de energia limpa. Essa transição exigiu coragem, articulação institucional e uma visão de longo prazo sobre o papel do Estado como indutor de desenvolvimento.
Como a experiência na Advocacia Geral da União e no INSS contribuiu para sua atuação atual no setor elétrico?
A AGU me ensinou a lidar com o Estado sob o ponto de vista jurídico e estratégico. Na função de procurador federal, aprendi a equilibrar rigor técnico, segurança jurídica e viabilidade administrativa, algo essencial em qualquer projeto público estruturante. Já no INSS, ao comandar uma das maiores estruturas federais do país, enfrentei desafios de escala e eficiência, com foco em resultados para milhões de brasileiros. Durante minha gestão, lancei no 2º semestre de 2018, no último ano da gestão do presidente Michel Temer, o aplicativo Meu INSS, que facilitou o acesso do cidadão a serviços previdenciários. Após aprimoramentos ao longo dos anos, ele se tornou, hoje, o serviço mais utilizado na plataforma gov.br. Na CEB, aplico essa experiência diariamente, especialmente na articulação com órgãos de controle, agências reguladoras e organismos multilaterais, como no atual processo de captação de recursos junto ao New Development Bank (NDB), o banco dos BRICS. Trata-se de governar com técnica, planejamento e compromisso com o interesse público.
O que considera o maior avanço da CEB nos últimos anos sob sua gestão?
O maior avanço foi consolidar a transformação da CEB em uma empresa pública moderna, sustentável e com capacidade de liderar projetos de grande impacto social. Deixamos de ser uma distribuidora ineficiente e nos tornamos uma protagonista em infraestrutura energética inteligente. Hoje, tocamos vários projetos sustentáveis que vão ao encontro à agenda ESG global, uma vez que temos iniciativas para a construção de plantas solares que podem colocar o DF no protagonismo da transição energética do país. Também é preciso citar a modernização da iluminação pública, com mais de 105 mil pontos de LED instalados.
A iluminação pública no DF passou por modernizações. Que resultados práticos a população já sente?
A modernização da iluminação pública já transformou o cotidiano em diversas regiões. Com a Nova Concessão, assinada em 2024, já substituímos mais de 105 mil pontos de luz por LED – tecnologia que consome até 55% menos energia e tem durabilidade superior. A meta é atingir 100% da rede até o início de 2026, totalizando cerca de 300 mil pontos modernizados em pouco mais de um ano.
Além da economia para o Estado, os ganhos são percebidos diretamente pela população: ruas mais iluminadas, maior sensação de segurança, valorização de áreas urbanas e rurais e resposta mais ágil em manutenções, graças aos novos instrumentos de atendimento ao cidadão, centro de operações antes inexistente, call center, aplicativo ilumina DF e o mais recente canal de WhattsApp. Em 2026, com a instalação de telegestão, que fará o monitoramento de parte das lâmpadas do centro de operações, estaremos vendo a situação de cada luminária on-line através do sistema. Também iluminamos locais sem planejamento de iluminação pública como ciclovias, vias de pedestres e áreas periféricas.
O projeto de instalação de usinas fotovoltaicas para abastecer órgãos públicos é pioneiro. Em que estágio está hoje?
Estamos em fase de licitação destas usinas. A construção e instalação de uma usina fotovoltaica com capacidade de 10 megawatts-pico (MWp) no Jardins Mangueiral, por exemplo, vai permitir à Secretaria de Educação economizar cerca de R$ 10 milhões por ano em custos com energia elétrica dentro da rede pública de ensino. O projeto é fruto de um convênio firmado entre a CEB e a (SEEDF). Com investimento estimado em R$ 40 milhões, a nova planta solar terá capacidade de gerar aproximadamente 20 gigawatts-hora (GWh) por ano, o que equivale ao consumo de cerca de 400 escolas da rede pública. Também firmamos um convênio com o Supremo Tribunal Federal (STF) e a Agência de Desenvolvimento do Distrito Federal (Terracap) para a construção de uma usina fotovoltaica em Brasília. Com capacidade de 3,5 megawatts-pico (MWp) e produção anual de 6,8 gigawatts-hora (GWh), a estrutura garantirá o abastecimento integral do STF por meio de energia solar, em um investimento de R$ 15,3 milhões. A iniciativa marca um avanço na transição energética do GDF, fortalecendo o compromisso com fontes renováveis e a redução da pegada de carbono. Nesta semana, a licitação para este projeto recebeu alguns recursos por partes de alguns licitantes e, superada esta parte, tomaremos a decisão de quem vai executar as obras, que devem começar ainda este ano.

Quais os próximos passos para alcançar a meta de 75% de consumo público com energia solar até 2028?
O principal passo é a liberação e formalização do financiamento com o NDB, o que nos permitirá iniciar as obras da maior usina solar do DF. Em paralelo, estamos concluindo o licenciamento ambiental das demais áreas e estruturando os contratos de suprimento com os órgãos públicos. Esse modelo traz economia e previsibilidade para o orçamento público e impulsiona a transição energética com responsabilidade fiscal. Estamos assinando o Memorando de Entendimento (MOU) com o Comando do 7° Distrito Naval da Marinha. Após conversas e tratativas com o Almirante Eduardo Vasquez e equipe, que ocorrem desde outubro de 2024, será feito um estudo acerca da viabilidade e instalação de uma usina, possivelmente na Área Alfa, em Santa Maria. O presente Memorando tem por objeto avaliar a viabilidade técnica, econômica, jurídica e ambiental na utilização dos imóveis sob jurisdição da Marinha do Brasil localizados no Distrito Federal para instalação de usinas de geração de energia fotovoltaica. Além disso, temos a meta de abastecer 75% dos prédios públicos do DF com energia sustentável até 2028. Edificações da Presidência da República, a Empresa Brasileira de Comunicação (EBC) e outras estruturas da administração pública sediadas na capital terão como prioridade o uso da fonte limpa e renovável.
Como Brasília pode se tornar referência nacional em eficiência energética e sustentabilidade urbana?
Brasília reúne condições ideais para isso: alta incidência solar, território organizado e um governo atual com visão estratégica para a pauta ambiental. Um marco importante foi a sanção da Lei Distrital nº 6.891/2021 pelo governador Ibaneis Rocha, que estabelece que todos os prédios públicos do Distrito Federal utilizem energia solar até 2028 – um passo decisivo rumo à transição energética.
Com o financiamento do NDB totalmente implementado, teremos o primeiro parque público de geração solar com escala urbana do país — e com uso exclusivamente institucional. Combinando essa geração com a universalização da iluminação em LED, eletromobilidade, arborização urbana e digitalização da rede, o DF pode se tornar o primeiro território do país com infraestrutura pública quase inteiramente alimentada por energia limpa. A CEB, como braço do GDF neste processo, é protagonista nesse processo de sustentabilidade e é parceria dessa transformação, executando projetos estruturantes e inovadores para que Brasília se torne uma referência nacional em eficiência energética e cidades inteligentes.
Na sua avaliação, quais os principais entraves para acelerar a transição energética no setor público?
O primeiro entrave é estrutural: o modelo de contratação e financiamento do setor público ainda é lento e fragmentado. O segundo é orçamentário — poucos órgãos têm recursos para modernização energética sem parcerias. O terceiro entrave é cultural: nem todas as instituições públicas tratam a eficiência energética como prioridade. Estamos superando isso por meio de planejamento estratégico, articulação internacional (como com o NDB), formação de consórcios interinstitucionais e capacitação de gestores. O Estado precisa ser exemplo de sustentabilidade, e o DF pode liderar essa mudança com segurança jurídica, inovação e transparência.

Há planos de expandir o modelo de usinas solares para outras áreas, como escolas e hospitais?
Sim, e isso já está em curso. A ideia é que as futuras usinas operem com modelo de geração compartilhada, beneficiando diretamente centenas de escolas, hospitais e UBSs. A Secretaria de Saúde, por exemplo, criou um projeto, com recursos próprios, que prevê a instalação de placas solares nas unidades de saúde, o que dará autonomia no uso de energia para estes locais. Outros órgãos públicos também já se beneficiam de uma grande usina solar construída pelo pelo Instituto Brasília Ambiental (Ibram) no Parque Ecológico de Águas Claras. A geração temcapacidade para atender as demandas de todas as unidades de conservação (UCs) do DF e de outros órgãos públicos do governo local, como a Secretaria de Meio Ambiente e Proteção Animal (Sema), o Jardim Botânico (JBB), dez escolas públicas e metade do consumo do Zoológico de Brasília. Importante reforçar, conforme dito anteriormente, a construção e instalação de uma usina fotovoltaica com capacidade de 10 megawatts-pico (MWp) no Jardins Mangueiral, por exemplo, que vai permitir ao Governo do Distrito Federal (GDF) economizar cerca de R$ 10 milhões por ano em custos com energia elétrica dentro da rede pública de educação. O projeto é fruto de um convênio firmado entre a CEB e a Secretaria de Educação (SEEDF). Com investimento estimado em R$ 40 milhões, a nova planta solar terá capacidade de gerar aproximadamente 20 gigawatts-hora (GWh) por ano, o que equivale ao consumo de cerca de 400 escolas da rede pública. Esse modelo vai reduzir custos operacionais e permitir que as economias sejam revertidas em melhoria dos serviços prestados à população. Imagina uma escola pública que economiza R$ 50 mil por ano em energia e reinveste isso em tecnologia ou merenda escolar — é essa realidade que estamos construindo.
Como presidente da CEB e membro dos conselhos da Neoenergia, quais sinergias pretende fortalecer entre as frentes?
A atuação nos conselhos da Neoenergia se deu a partir de um convite do Mário Ruiz, então Presidente da Neoenergia, ratificado posteriormente pelo seu sucessor e atual Presidente da empresa no Brasil,Eduardo Capelastegui, para integrar os conselhos das distribuidoras do grupo nos estados da Bahia, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Elektro São Paulo e Neoenergia Brasilia, muito em função dos resultados e do trabalho de estruturação do processo de desestatização da CEB Distribuição e da visão estratégica demonstrada na organização de processos na CEB-D. Hoje, há uma coincidência de interesses entre a CEB IPes e a Neoenergia na organização do parque de iluminação pública do Distrito Federal: a maioria das lâmpadas sob responsabilidade da CEB IPes estão instaladas es postes sob gestão da Neoenergia, especialmente nas cidades satélites. Além disso, ainda hoje, anos após a desestatização, há pessoas que confundem as atividades da distribuidora e da CEB IPes e, a relação institucional de elevado nível entre as empresas, tem ajudado neste processo de transição e atuação junto à população do DF. Por fim, mas não menos importante, não posso deixar de citar a governança implementada nas duas empresas, que têm mecanismos claros e transparentes que norteiam as ações institucionais e nos orienta sobre como agir em caso de uma hipótese de conflito de interesses, por exemplo.
Por fim, que legado espera deixar ao final da sua gestão — e qual projeto ainda faz questão de ver realizado?
Ao final do governo Ibaneis, quero deixar como legado um sistema elétrico totalmente modernizado para o Distrito Federal. Nossa meta é entregar uma capital iluminada com LED e sistemas de telegestão, além de garantir que os instrumentos de manutenção e os canais de atendimento à população estejam estruturados de forma eficiente e acessível. Também ficará como legado do trabalho as usinas fotovoltaicas já em operação e outras ainda em construção. Na área de distribuição, uma rede modernizada com os investimentos feitos pela Neoenergia. Outro marco importante desse trabalho é a permanência da CEB na concessão da Usina de Queimado, até 2041. Em parceria com a Cemig — acionista da usina ao lado da CEB Participações —, conquistamos êxito no leilão de GSF, que permite a prorrogação de concessões próximas ao vencimento mediante aquisição de títulos relacionados ao risco hidrológico. Essa vitória assegura a continuidade da operação de um ativo altamente rentável e estratégico. Essas ações, somadas, compõem um legado sólido de inovação, sustentabilidade, eficiência econômica e compromisso com as futuras gerações.
Fotos: Gilberto Alves