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Três Poderes
Três Poderes

Boa política é a alma da democracia

Deputado federal Eunício Oliveira fala sobre sua trajetória política, o momento atual político do Brasil e seus projetos futuros

Marcelo Chaves

23/09/2025 15h00

Eunício Oliveira está no seu quarto mandato como deputado federal pelo estado do Ceará, onde também foi eleito senador. É economista e agropecuarista. Foi ministro das Comunicações do governo Lula e logo após presidente do Senado. O parlamentar destaca-se na política cearense desde a época em que foi presidente da Casa do Estudante de Fortaleza, quando começou sua luta pela redemocratização do Brasil, ingressando no MDB, seu único partido. No Congresso Nacional destacou-se pela aprovação da Lei Eunício Oliveira, que renegociou a dívida de milhões de pequenos e médios agricultores nordestinos. O líder emedebista é o entrevistado da semana da Coluna Três Poderes.

O que mais pesou na decisão do senhor de ingressar na política?

A política veio de berço. Todos os ramos da minha família tiveram atuação em vários níveis políticos. Meu pai, Otoni Lopes de Oliveira, teve participação política destacada em nossa Lavras da Mangabeira–CE, inclusive como vereador. Acompanhando ele nessas atividades, eu tive o despertar da importância da política na vida das comunidades. Mais tarde, aos 16 anos, fui morar na Casa do Estudante de Fortaleza e comecei a participar do movimento estudantil contra a ditadura militar, por melhores condições de ensino, por mais liberdade, e cheguei a ser presidente da Casa. Desde então, não parei mais, adquiri a consciência de que a verdadeira política é a feita para ajudar as pessoas, sem proveitos pessoais. A boa política é a alma da democracia.

Seu sogro, Antonio Paes de Andrade, foi presidente da Câmara dos Deputados e chegou a assumir interinamente a Presidência da República. De que forma ele inspirou a sua trajetória política?

Comecei a admirar e seguir as firmes posições de Paes de Andrade antes mesmo de ser meu sogro. Paes fazia parte do Grupo Autêntico do MDB, que reunia lideranças de todo o Brasil para enfrentar e reivindicar, até com mais veemência do que o próprio Partido, eleições gerais livres e diretas, uma Constituinte que restabelecesse o Estado Democrático de Direito, liberdade de opinião e organização e mais justiça social. Foi assim também que eu entendi o papel do MDB na resistência à ditadura, no seu papel fundamental para a redemocratização do Brasil, tornando-se meu único partido até hoje.

Durante a gestão do senhor como ministro das Comunicações, quais avanços o senhor considera mais relevantes? E olhando para trás, o que faria diferente diante da transformação digital que o país vive hoje?

Presidente Lula sempre defendeu a correta visão de que um País soberano precisa ser autônomo e moderno em suas Comunicações. Foi isso que combinamos. Assim começamos a construir o Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações, primeiro satélite geoestacionário brasileiro, equipamento que deu autonomia à comunicação das Forças Armadas, e serviu como parte do Plano Nacional de Banda Larga, que já visava promover o acesso à internet de alta velocidade. Eram os primeiros passos firmes do que hoje conhecemos como o wi-fi que usamos em qualquer lugar. Com esses investimentos também veio a massificação, a popularização dos celulares para os brasileiros. Também construímos um sistema de transmissão de TV, o PAL-M, específico para o Brasil, o que ajudou a que, além da autonomia, nossas redes de TV levassem as transmissões para todo o País. O que eu faria diferente é que, se imaginássemos como as redes sociais estariam hoje, praticamente sem regras, já teria atuado contra as fake news.

O senhor exerceu a Presidência do Senado entre 2017 e 2019. Como avalia aquele período, sobretudo no equilíbrio entre Legislativo, Executivo e Judiciário? Quais foram os maiores desafios de liderar a Casa?

Exigiu serenidade, convicção democrática, desprendimento para o diálogo e confiança no equilíbrio entre os Três Poderes. Tínhamos um país politicamente sensível, estávamos no início do governo Temer, que exigia tudo isso. Trabalhei sempre ouvindo e respeitando todas as lideranças de partidos com representação no Senado em busca de consensos. Era um tempo bastante diferente de hoje, onde as relações entre os Poderes estão mais ásperas com alguns momentos de afronta.

Isso, inclusive, leva o STF a assumir papel com mais ativismo político, que antes não lhe era característico. O senhor foi candidato na eleição para o governo do Ceará em 2014. Como o senhor enxerga o cenário político do estado hoje, mais de dez anos depois?

Em 2014 teve uma eleição muito disputada no Ceará. Não fui eleito por uma diferença de 300 mil votos, concorrendo praticamente sozinho com as forças historicamente majoritárias no Estado. Foi eleito o atual ministro da Educação, Camilo Santana, com quem eu, então presidente do Senado, tive o discernimento político de trabalhar junto para levar recursos para todos os municípios cearenses. Desde então, construímos alianças políticas como a que temos hoje pensando no desenvolvimento do Estado. É isso que estamos trabalhando para manter em 2026.

No atual mandato de deputado federal, quais são as suas prioridades?

Ao longo da minha vida pública eu sempre estive comprometido em praticar ações políticas que resultem em melhorias significativas para os problemas de infraestrutura, segurança, educação, saúde, entre outras demandas que o dia a dia da população nos apresenta. Tenho convicção que é isso o que pensam os eleitores quando nos elegem. Além disso, o nosso papel é o de propor, avaliar e aprovar leis específicas que melhoram os serviços e as políticas públicas ou aperfeiçoar e atualizar leis em vigor.

O senhor é autor da chamada “Lei Eunício”, de 2006, e recentemente apresentou projeto para ampliar prazos de renegociação de dívidas rurais, estendendo condições também aos MEIs. Qual o impacto esperado dessas medidas?

Essa é uma lei que podemos chamar de ganha-ganha. Ganhou o Banco do Nordeste, que pode recuperar um dinheiro que já estava contabilizado em perdas, pois milhões de agricultores voltaram a pagar suas dívidas com desconto, juros menores e viáveis. E ganharam os trabalhadores rurais que não perderam suas terras, que puderam novamente receber crédito para continuar trabalhando, colocando comida na mesa da população cearense e nordestina e sustentando suas famílias.

Como concilia sua trajetória empresarial. O que o senhor aprendeu na iniciativa privada que trouxe para a política?

Em 1998, quando fui eleito deputado federal pela primeira vez, fiz questão de me afastar da administração de todas as minhas empresas antes mesmo de tomar posse. Foi uma forma de respeitar e cumprir o papel e os compromissos que todo o homem público deve assumir quando quer trabalhar, verdadeiramente, em defesa de quem o elegeu.

Qual a sua posição sobre propostas que ampliam prerrogativas parlamentares? Até que ponto esse movimento fortalece ou fragiliza a confiança nas instituições e o ambiente de negócios do país?

A PEC das Prerrogativas que a Câmara aprovou foi um grande desserviço à própria Casa, e um tapa na cara da sociedade, como vimos nas reações populares, que foram unânimes em críticas. O Parlamento hoje, todas as pesquisas mostram, precisa trabalhar muito mais em sintonia com as reais necessidades da população e menos em função do que chamamos de interesses corporativos, ou seja, dos seus próprios interesses. Não há dúvida que não fortalece a instituição e que essa instabilidade contamina todos os demais ambientes sociais, políticos e econômicos.

O senhor pretende disputar novamente o Senado ou até mesmo o governo do Ceará em 2026? Quais alianças considera viáveis hoje no estado e que projeto o MDB pretende oferecer ao eleitor cearense?

O MDB Nacional deliberou que a prioridade é recuperar o Senado, Casa onde, historicamente, o partido sempre foi majoritário, e eleger o maior número possível de senadores. Dos nossos atuais 12 senadores, 11 precisam renovar seus mandatos. Em 2026 o MDB vai ter muito cuidado para identificar e participar de alianças com esse propósito. No Ceará, onde atualmente temos a vice-governadora na base que viabiliza o governo Elmano de Freitas, também essa é a missão na qual o partido me pediu para trabalhar e apresentar meu nome para o Senado.

Fotos: Moreira Mariz/Agência Senado e Reprodução

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