Aproveito essas primeiras linhas para pedir licença poética e recitar que as curvas declinantes da queda da Taxa Selic foram um carinhoso afago para o crescimento do empreendedorismo e a motivação para que diversos investidores abandonassem a renda fixa. Dito isso, caro leitor, também é preciso destacar que a situação estimulou a “descoberta” da educação financeira e a corrida por rentabilidade em outros produtos de investimentos, além da poupança.
Outro ponto que merece sua atenção é que um dos grandes vencedores nesta fantástica fábrica de rentabilidade do mercado financeiro, em 2020, foram os fundos cambiais, que são veículos de investimentos que acompanham o desempenho do dólar. Um bom exemplo foi BB TOP Dólar FI cambial, que teve uma rentabilidade de 30,34%.
Com este quadro, temos em 2021 dois pontos cruciais e distintos: os investidores felizes, mas os consumidores finais dos alimentos, atingidos pela alta da inflação, não. Observando o custo da cesta básica no Estado de São Paulo, podemos perceber um aumento de 15% em relação a 2020, maior alta nos últimos 10 anos.
Adivinha quem causou esse desequilíbrio? Muito bem! Os produtos com valores atrelados ao dólar e, em seguida, a pandemia da Covid-19, que destruiu a renda de milhões de famílias pelo isolamento social.
Sem renda e sem oportunidade de conquistar um emprego, presenciamos um aumento do endividamento dessas famílias. Segundo a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), 67,3% das famílias brasileiras estão endividadas. Já o Banco Mundial estima que 150 milhões de pessoas voltarão a viver na extrema pobreza, e, no Brasil, 14 milhões de brasileiros já vivem com renda mensal por pessoa de apenas R$ 89. Um quadro extremamente preocupante.
A realidade é que os alimentos mais caros acordaram um monstro adormecido para os investidores dos últimos 26 anos do Plano Real: a inflação.
Ela está destruindo a rentabilidade de muitos dos investidores que desconhecem um conceito importante: taxa de juros reais, em outras palavras, é ter a rentabilidade acima da inflação.
Quero lembrar que os produtos de investimentos utilizam uma referência para entender se a performance do seu capital investido está boa ou ruim e, opa, voltamos ao início desta coluna: a Selic!
Para quem é mais arrojado, eu não disse nenhuma novidade, mas a grande descoberta é que, desde setembro de 2020, o investidor conservador não supera a inflação.
Continuando o ciclo, lembra aquele dólar que foi o grande vencedor para alguns investidores em 2020? Na verdade, ele é o grande vilão que aumentou os preços dos alimentos, o custo de vida das famílias e prejudicou a rentabilidade de milhões de poupadores.
No final, como disse o inesquecível economista brasileiro Mário Henrique Simonsen: “a inflação aleija, mas câmbio mata”.