O The New York Times, considerado o jornal mais influente do mundo, dedicou uma reportagem inteira ao Íbis Sport Club, o lendário “pior time do mundo”, de Paulista, na Grande Recife. A publicação norte-americana mergulhou na história do clube pernambucano que transformou o fracasso em identidade, o vexame em folclore e a derrota em marketing.
Entre goteiras, rachaduras e arquibancadas interditadas, o repórter descreve o cenário do estádio Ademir Cunha, onde o Íbis treina e sobrevive “com mais vontade do que glamour”. Mas o que realmente chamou a atenção do jornal foi o carisma com que o clube abraça sua fama mundial de perdedor.
Fundado em 1938 por funcionários de uma fábrica têxtil, o Íbis viveu seus anos de glória ainda nos anos 1950, quando chegou a vencer Náutico e Sport e revelou o atacante Vavá, bicampeão mundial com a Seleção em 1958 e 1962.
Mas a virada veio nos anos 1980 — e para o lado errado. Entre 1980 e 1984, o Íbis passou 1.428 dias sem vencer uma partida sequer, acumulando 55 jogos e 48 derrotas, com saldo negativo de 206 gols.
Foi o suficiente para entrar no folclore mundial do futebol. O mascote do time passou a se chamar Derrotinha, e o uniforme ganhou uma frase bordada na gola: “O pior time do mundo”.

O reizinho do fracasso: Mauro Shampoo
O New York Times também se encantou com Mauro Shampoo, ex-jogador, cabeleireiro e ícone pop recifense, que marcou um único gol (discutível) em oito anos de clube. Hoje, aos 68 anos, ele comanda o “Arena Shampoo”, seu salão de beleza em Boa Viagem, cercado por fotos, bonecos e lembranças do Íbis.
“Eu queria ser jogador de verdade, ser pago, show. Nunca ganhei um centavo. Mas virei famoso, show”, disse Mauro, em seu português misturado com carisma e resignação.
Filho de uma família pobre de 14 irmãos, ele sobreviveu vendendo doces e engraxando sapatos até virar o “melhor dos piores”. Foi homenageado no Carnaval de Olinda com um boneco gigante e virou tema de dois filmes.
A nova era: humor e internet
O presidente Ozir Ramos Júnior, ex-jogador e herdeiro da família que fundou o clube, também é personagem central na reportagem. Ele transformou a tragédia esportiva em estratégia de comunicação.
“Quando a gente ganha, os torcedores protestam. Dizem que estamos traindo nossa tradição”, brinca.
A partir de 2011, o Íbis virou fenômeno nas redes sociais com o perfil Íbismania, que ironiza os grandes clubes e exalta o próprio fracasso. Em 2020, chegou a figurar à frente de Barcelona, Real Madrid e PSG em engajamento médio por post, segundo levantamento da empresa Sports Value.
O The New York Times encerra a reportagem com uma reflexão digna do espírito pernambucano: o Íbis não tenta escapar de sua fama — ele a cultiva.
“O Íbis é o clube que transformou o fracasso em folclore, a derrota em cultura”, escreveu o jornal.
Entre um corte de cabelo e outro, Mauro Shampoo resumiu a filosofia do time:
“Joguei no pior time do mundo, mas era camisa 10. Eu era o melhor dos piores, show.”