A literatura mais nova vem refinando o entendimento de como os traços psicopáticos operam em tempo real nas interações sociais, especialmente no aprendizado da cooperação e na sensibilidade a incentivos sociais. Um estudo de 2024 na PNAS mostrou que dois componentes centrais, callosidade e exploratividade, se relacionam de maneira distinta com os sinais de aprendizagem de cooperação codificados pela rede em modo padrão. Indivíduos mais callosos exibem sensibilidade atenuada, tanto comportamental quanto neural, a incentivos para cooperar, ao passo que a exploratividade e manipulatividade associam-se à captação exacerbada desses sinais quando a exploração do outro é vantajosa. Essa dissociação sugere que psicopatia não é um bloco único: diferentes subdomínios modulam como o cérebro rastreia reputações, expectativas de reciprocidade e oportunidades de exploração, o que ajuda a explicar por que algumas pessoas parecem surdas a normas pró-sociais, enquanto outras as monitoram precisamente para melhor instrumentalizá-las.
Em paralelo, a relação entre psicopatia e empatia recebeu sínteses robustas. Revisões sistemáticas e meta-análises recentes convergem para um padrão com déficits mais pronunciados em empatia afetiva, que envolve ressonância com o sofrimento alheio, do que em empatia cognitiva, que envolve tomada de perspectiva, ainda que ambas possam estar comprometidas conforme o perfil e a medida utilizada. Essa assimetria é coerente com achados experimentais de empatia pela dor, nos quais sensibilidade própria à dor mais baixa relaciona-se a menor empatia pela dor do outro, o que potencialmente facilita agressão e exploração. Trata-se de um mecanismo de desacoplamento afetivo que preserva a frieza em contextos sociais. O quadro, portanto, não é binário; ele é facetado e varia por subtipos, como primário e secundário, e por instrumentos, como modelos triárquicos e traços sombrios clássicos.
Na juventude, a pesquisa sobre traços calloso-emocionais, o análogo desenvolvimental da psicopatia, reforça a base neurocognitiva do fenômeno. Revisões indicam alterações na resposta à ameaça, no processamento emocional e na ressonância empática, com estudos estruturais recentes sugerindo diferenças de volume em regiões específicas do cérebro. Esses achados sustentam a ideia de que desconexões afetivas precoces, combinadas a controle cognitivo peculiar e alta busca de recompensa, podem compor trilhas de risco para padrões duradouros de insensibilidade e transgressão, sobretudo quando o ambiente reforça estratégias de curto prazo.
No mundo do trabalho, a evidência mais atual continua mostrando que a psicopatia é o preditor mais consistente de comportamentos contraprodutivos, sobrepondo-se a narcisismo e maquiavelismo. Além de níveis médios mais altos de transgressão instrumental, surgem interações importantes com o contexto, porque experiências de injustiça ou maus-tratos podem desbloquear repertórios exploratórios, intensificando a agressão interpessoal e a sabotagem organizacional. Isso recoloca a discussão para além do indivíduo, indicando que certos arranjos culturais e de gestão podem amplificar custos sociais de perfis psicopáticos, enquanto estruturas de governança e monitoramento ético tendem a amortecê-los.
Um segundo eixo de avanços veio da psicometria. A agenda triárquica, baseada em Boldness, Meanness e Disinhibition, segue produzindo novos instrumentos e validações, inclusive medidas derivadas de modelos biológicos alternativos. Essa diversificação melhora a precisão para captar perfis diferenciados, como indivíduos ousados e socialmente dominantes, mas com baixa desinibição, em contraste com perfis mais impulsivos e antissociais. Na prática clínica e forense, esse recorte por facetas ajuda a qualificar risco, distinguir violência reativa de instrumental, avaliar responsividade a sanções e indicar candidaturas a intervenções motivacionais. O ponto comum, reiterado por estudos recentes, é que o instrumento importa, pois diferentes escalas enxergam fatias distintas do construto e, portanto, produzem correlações diferentes com empatia, agressão e aprendizagem social.
Em síntese, o estado da arte aponta para uma psicopatia menos como rótulo monolítico e mais como arquitetura de processos. Ela envolve um módulo afetivo amortecido, no qual o dano alheio é pouco saliente, um módulo oportunista que lê o jogo social para explorar quando convém e um perfil motivacional que privilegia metas de curto prazo com baixa penalização subjetiva do transgressivo. A força dos achados está em costurar níveis, do cérebro ao comportamento no trabalho, sob medidas mais finas e paradigmas experimentais ecologicamente válidos. Para aplicações clínicas, escolares e organizacionais, o recado é claro: avaliar quais facetas estão ativas é tão crucial quanto verificar o quanto de traço há, e, do lado ambiental, normas, incentivos e supervisão moldam a expressão fenotípica desses traços, reduzindo ou acentuando seus custos sociais.
Regiões e redes frequentemente associadas à psicopatia:
Córtex pré-frontal medial e ventromedial. Modelos clássicos já postulavam disfunções no vmPFC como centrais para déficit de tomada de decisão moral e de regulação emocional em psicopatia. Em pacientes com lesões nessa região, há déficits em associar consequências negativas a ações oportunistas. A revisão Psychopathy and medial frontal cortex, publicada em 2024, ressalta que disfunções nessa zona medial frontal, especialmente no córtex ventromedial, têm sido testadas como fonte de falhas na integração entre emoção e valor moral.
Córtex cingulado anterior e médio, ínsula anterior e estruturas subcorticais. Em uma meta-análise recente que buscou convergir achados heterogêneos de neuroimagem, Dugré e De Brito, em 2025, identificaram um Psychopathy Network que inclui hubs no córtex cingulado dorsal e médio, caudato, ínsula anterior, claustrum, prefrontal dorsolateral, tálamo, midbrain e giro temporal superior. A ínsula e o cingulado são regiões-chave para processamento de dor, aversão, conflito cognitivo e litígios emocionais, funções que, quando comprometidas, facilitam a indiferença ao sofrimento alheio.
Rede de conectividade funcional e redes intrínsecas, como DMN, subcórtex, frontoparietal e atenção ventral. Um insight importante dos estudos mais recentes é que áreas disparadas em diferentes estudos se sobrepõem mais claramente quando vistas por sua conectividade funcional do que isoladamente. Regiões distintas são nós de uma rede conectada que, em conjunto, podem sustentar os déficits emocionais e motivacionais associados à psicopatia. Por exemplo, Dugré e De Brito encontraram que a rede de psicopatia mostra contribuição relevante do Default Mode Network e das regiões subcorticais, sugerindo que processos internos de autorreflexão, memória, inferência social e comunicação entre partes profundas do cérebro são integrados no funcionamento disfuncional da psicopatia.
Estruturas de reforço, recompensa e processamento motivacional, como caudato, tálamo, midbrain e vias dopaminérgicas. O Psychopathy Network identificou envolvimento dessas regiões subcorticais e de sistemas neuroquímicos que possivelmente contribuem para a propensão à busca de recompensa, ignorância de punições e exploração instrumental.
Heterogeneidade dos achados. Muitos estudos de neuroimagem reportam picos em regiões distintas, com baixa sobreposição espacial direta. Por isso, abordagens modernas tentam mapear redes funcionais que unifiquem achados aparentemente díspares. Dugré e De Brito mostram que picos localizados diferentes, quando conectados em redes de conectividade em cérebros normais, convergem para um padrão compartilhado, o Psychopathy Network.
Contribuição indireta. O estudo de Dugré e De Brito observou que, embora esperassem que vmPFC ou amígdala surgissem como hubs centrais, essas regiões não foram as mais centrais na rede identificada, sugerindo que podem contribuir por meio de conexões e modulação, mais do que por ativação direta.
Causalidade e correlação. Muitos desses achados vêm de estudos correlacionais, o que dificulta afirmar que disfunções nessas regiões causam o traço psicopático, ou se são consequências ou adaptações a perfis comportamentais. Ensaios com lesões cerebrais ou métodos longitudinais ajudam, mas ainda são relativamente raros.
Até a próxima…