Ficou no passado — ainda que recente — o tempo das caneladas, cotoveladas e carrinhos por trás no gramado onde se joga o confronto Brasil x EUA. O Brasil vai para o segundo tempo depois de resistir ao jogo desleal na primeira etapa, botando a bola no chão.
Segundo uma fonte ligada à política externa, a qualidade das projeções sobre o comércio exterior foi decisiva para formular uma estratégia de contenção pacífica. Essas mesmas projeções indicavam que o impacto do tarifaço na balança de pagamentos não seria o prenúncio de uma quebradeira.
Nos bastidores, a mansidão do governo na crise do tarifaço é traduzida como opção tática. Essa escolha se materializou quando o Brasil preferiu evitar o confronto, mesmo coberto de razão. A opção explica, inclusive, por que o Planalto evitou acionar a lei de reciprocidade aprovada no Congresso.
O presidente da ApexBrasil, Jorge Viana, lembra que, se o tarifaço “tivesse vindo há quatro ou cinco anos, teria sido uma tragédia”. Para ele, a situação tende a melhorar, “com esse diálogo com o Trump”. Viana credita a serenidade do governo ao restabelecimento da “diplomacia presidencial”, conduzida por Lula, que reabriu canais de diálogo para um Brasil que havia deixado de disputar espaço no mundo — na Europa, na África, na Ásia e até nos Estados Unidos.
A impressão geral em Brasília é que Lula entrou em campo e vem estufando a rede — desde a goleada com a aprovação da isenção do Imposto de Renda até R$ 5 mil na Câmara. Para parlamentares, inclusive da oposição, quando Lula não está em campo, é como se o escrete jogasse completo, mas com o homem-gol no banco.
A torcida adversária sentia falta do futebol-arte, reclamando das caneladas aqui e ali. Em junho de 2023, o então líder do União Brasil, Elmar Nascimento, admitiu que foi Lula quem reverteu uma derrota na Câmara, ao assumir pessoalmente a articulação política na votação da MP dos Ministérios. Um mês antes, após um dia de reveses — como na votação do marco temporal das terras indígenas —, a cúpula do Planalto buscava saídas, num ambiente cada vez mais tóxico entre Executivo e Legislativo.
Nessa peleja do tarifaço e na goleada do IR Zero, Lula soube a hora do contra-ataque. Resistiu aos ataques, driblou a pressão do mercado — que tentava fazer gol de mão, com dólar pra cima e bolsa pra baixo — e manteve a calma. A torcida contrária repetia que o ajuste fiscal estava ameaçado, que a renúncia tributária passaria dos R$ 100 bilhões. Mas Lula botou a bola no chão e organizou o time.
Dias antes de Hugo Motta pautar o projeto no plenário, conversei com Arthur Lira na noite de filiação do jurista Gustavo Rocha ao Republicanos. A conversa foi em off, mas dali saí com a certeza de que o gol de Lula estava amadurecido. Só não imaginava que viria em goleada — e com uma rara de uma unanimidade parlamentar.
No caso do tarifaço, ainda falta montar uma tática para aplicar uma caneta em Marco Rubio, designado por Trump para renegociar com o Brasil. No IR Zero para quem ganha até R$ 5 mil, resta o Senado confirmar o placar. Mas o governo, enfim, está com a bola no pé nos dois casos — e recuperando seus números de aprovação.
Lula, enfim, voltou a ser o camisa 10 do próprio governo. E, quando ele joga, até o adversário levanta para aplaudir.