O agronegócio brasileiro, uma das engrenagens essenciais da economia do país, enfrenta um cenário desafiador. Segundo a Serasa Experian, o número de produtores rurais que recorreram à recuperação judicial no primeiro semestre deste ano já supera o total de todo o ano passado. Foram 207 pedidos de janeiro a junho, contra 162 em todo o ano anterior. E a tendência continua: de janeiro a setembro, o setor primário acumulou 287 pedidos, mais que o triplo dos 77 registrados no mesmo período de 2023.

Apesar de o setor de serviços liderar as estatísticas de recuperação judicial em 2024, com 41% dos casos, é o agronegócio que chama atenção pelo ritmo acelerado de crescimento nas solicitações. Segundo Eduardo Bazani, sócio-diretor da Nordex Consultoria Empresarial, o cenário reflete uma combinação de fatores críticos: “As condições climáticas adversas, juros altos no crédito agrícola e o aumento nos custos de produção contribuíram para as dificuldades do setor”.

Os desafios do campo não estão isolados. Dados da Serasa mostram que, no país como um todo, 1,7 mil empresas pediram recuperação judicial entre janeiro e setembro deste ano, um aumento de 73% em relação ao mesmo período do ano passado. Esse índice supera até mesmo o período da recessão de 2016, quando 1,5 mil empresas buscaram proteção judicial nos primeiros nove meses. “Os juros altos são um dos principais fatores para o aumento de casos, somados à inadimplência dos consumidores, à depreciação cambial e à dificuldade de acompanhar as transformações tecnológicas”, explica Bazani.
A escalada de dificuldades é ilustrada por nomes conhecidos do setor. Em outubro, a AgroGalaxy, gigante de insumos agrícolas com sede em Goiânia (GO), entrou com pedido de recuperação judicial, declarando dívidas de R$ 3,7 bilhões. Esse montante engloba compromissos com bancos, fornecedores e produtores rurais. Outras grandes empresas seguiram o mesmo caminho neste ano. O Grupo Patense (MG) soma dívidas de R$ 2,15 bilhões; a Sperafico Agroindustrial (PR), R$ 1,07 bilhão; e a Usina Maringá (SP), R$ 1,02 bilhão. Já a Elisa Agro Sustentável (GO) e o Grupo AFG (MT) acumulam débitos de R$ 679,6 milhões e R$ 648,5 milhões, respectivamente.
Bazani destaca outro ponto crítico: enquanto os preços das commodities caem, os custos de produção permanecem altos. “A queda nos preços de fertilizantes, por exemplo, foi inferior à das commodities de grãos. Além disso, as condições climáticas também não ajudaram. Tudo isso acabou prejudicando o setor.” Os dados revelam ainda que as micro e pequenas empresas representam sete em cada dez pedidos de recuperação judicial no Brasil. Para esses negócios, a reestruturação empresarial torna-se mais que uma opção — é uma questão de sobrevivência.
Bazani reforça que o processo de recuperação é vital para empresas em crise e também para aquelas que buscam se fortalecer. “A reestruturação oferece diversas formas de suporte e transformação, ajudando a restaurar a saúde financeira e operacional da empresa.” Em meio às dificuldades, o agronegócio brasileiro — tantas vezes resiliente — enfrenta o desafio de buscar soluções que permitam superar as adversidades e retomar o crescimento.