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Brasília

Abandono Infantil: a felicidade de quem encontra

Arquivo Geral

17/04/2018 7h00

Atualizada 16/04/2018 21h45

Daniel Silva Passos , esposa Andreia Castro Passos, com filhos Foto: Kléber Lima

João Paulo Mariano
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Apesar do abandono de, em média, quatro crianças por ano em todo o Distrito Federal, há pessoas que fazem de tudo para preencher esse vazio deixado pelas famílias biológicas. São homens e mulheres que se empenham em superar a barreira do sangue para transformar esses bebês abandonados em filhos do coração. Assim, como qualquer criança, eles terão direito a um lar, aconchego e chance de um futuro melhor.

Nessa segunda (16), o Jornal de Brasília mostrou como vivem essas crianças abandonadas ou que foram afastadas de suas famílias, além de apresentar um perfil de quem seriam esses pais que cometem o crime. A história do bebê deixado na parada de ônibus do Riacho Fundo I, que faleceu sem ao menos ter um nome, felizmente foi uma exceção à regra, já que, em geral, tem sido possível salvar o recém-nascido.

Foi o que ocorreu com o menino Miguel, encontrado em uma calçada da QNM 36 de Taguatinga, no ano passado, e com a jovem Marina Ferreira Borges, 18 anos, que foi adotada quando tinha apenas seis meses. Os dois foram deixados pelos pais biológicos tão novos que eles não guardaram nenhuma memória ou cheiro dos deles. Não deu tempo. As fatalidades da vida foram mais rápidas e não permitiram que os dois pudessem ter isso.

Contudo, ambos tiveram a sorte de serem acolhidos por famílias da capital que desejavam transformar o sonho de ter filhos em realidade. Miguel, por exemplo, saltou do estado de um menino abandonado em uma calçada, numa rua qualquer de Taguatinga, para alguém desejado – e principalmente amado – por diversas pessoas.

Bombeiro

O sargento do Corpo de Bombeiro Daniel Passos foi um desses que, em pouco tempo, alimentaram um sentimento tão grande pelo menino que só havia uma maneira de demonstrar isso: tornando o pequeno seu terceiro filho. No dia 7 de janeiro de 2017, Miguel foi abandonado, dois dias depois do nascimento, em frente a uma casa da QNM 36. Até hoje não há paradeiro dos pais biológicos.

Daniel Silva Passos guarda com carinho a manta de Miguel, socorrido por ele. Foto: Kléber Lima

O sargento estava de plantão e foi designado para a tarefa de prestar os socorros à criança. Ele lembra que, quando chegou, o menino chorava bastante e só parou no momento que o militar o segurou em seus braços. Com 18 anos de corporação, diversos salvamentos nas costas e até partos, para ele, foi um dos momentos de maior felicidade de todo esse tempo de trabalho.

A esposa do sargento, Andréia Castro, 31, lembra que, depois do contato com a criança, ele não tirava a ideia da adoção da cabeça. “Foram 20 dias visitando a criança no abrigo. Todos os dias. Levamos roupas para ele. O Daniel chorava pensando no bebê. Queríamos muito adotá-lo”, afirma Andréia.

Destino

Porém, a vida tinha outros plano para o menino. Miguel foi adotado 20 dias depois de ser encontrado, mas por outra família. Ele foi para um casal de professores que estava junto há 17 anos e não conseguia ter filhos. Daniel e Andréia até entraram na Justiça para tentar a adoção, mas tiveram o processo indeferido duas vezes. O juiz da Vara da Infância e da Juventude (VIJ) afirmou que, apesar da beleza da história, não havia vínculos e, além disso, era necessário respeitar a fila de adoção.

“Fiquei muito triste. Foi um baque. Mas pensamos bem e decidimos levar adiante a vontade de ser pais. Resolvemos ter mais um filho”, lembra o sargento Daniel.

O caçula da família, Théo, nasceu em fevereiro e alegrou o lar que Miguel não pôde ficar. Ele fez crescer a família já era formada pelo casal e pelos filhos Elisa, 5, e Davi, 2.

Não existe o impossível

A mãe de Marina, a policial militar Maria Santos, 52, nunca esqueceu da primeira vez que viu a filha, que hoje tem 18 anos. “Ela estava em uma casa sem janelas, sem quase nada. Ela chorava muito, mas não era por estar agoniada. Era de fome”, lembra a mulher. O encontro foi na região de Santa Rosa, que faz parte do município de Natividade (TO). “Apesar do choque, já me apaixonei por ela naquela hora. Sabia que ela seria minha filha”.

Com a menina desnutrida e muito doente aos seis meses, Maria deu entrada no processo de adoção assim que chegou a Brasília. O pedido foi concedido na hora devido à gravidade do estado de saúde. Todo esse início triste deu lugar a uma vida de muito carinho. “Minha mãe me ajudou muito e ainda zela por mim. Agradeço muito a ela por tudo que fez”, diz Marina, antes de ficar sem graça ao dizer, na frente da mãe, que a ama.

Marina Ferreira Borges (filha) e Maria Santos (mãe) / Foto: João Stangherlin

Dos seis meses de idade até os dias de hoje, o trajeto da jovem não foi fácil. Somente aos três anos que foi diagnosticado um grau acentuado de surdez. Para se comunicar, ela utiliza tanto a Lingua Brasileira de Sinais (Libras) quanto a fala, desenvolvida mesmo com a dificuldade auditiva.

Para o futuro, a jovem deseja fazer mestrado e doutorado, depois de finalizar a faculdade de Letras, na habilitação Português do Brasil. Ela também já decidiu que quer ensinar Libras. Talvez muitos dos que viram Marina quando bebê não imaginaram que ela cresceria e se tornaria a mulher que é hoje. Mas, para a policial Maria, sua mãe, não havia dúvidas de que aquela menina cresceria forte e feliz: “O amor é incondicional”.

SAIBA MAIS

» O supervisor da Vara da Infância e da Juventude (VIJ), Walter Gomes, explica que, apesar do sentimento de compaixão e solidariedade de quem encontra crianças na rua, como foi o caso do sargento Daniel Passos, é preciso lembrar que existe uma lista que precisa ser respeitada. Tudo isso para que não haja perigo para as crianças.

» Segundo ele, é necessário que se entre em contato com a VIJ, assim como houve no caso de Maria. É garantia para os menores.

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