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Coluna D

Odiar é fácil. Difícil é dialogar

Arquivo Geral

25/05/2017 20h05

Atualizada 15/07/2017 21h53

Diana Leiko

Faltando alguns dias para a inauguração da nova Delegacia Especial de Repressão aos Crimes Cibernéticos (DRCC) do Distrito Federal, marcada para o dia 29 de maio, cabe lembrar que discussões acaloradas no ambiente digital são perfeitamente normais, mas o mundo virtual também tem suas regras, que servem especialmente àquelas pessoas que não têm o esclarecimento do que significa liberdade de expressão e cometem crimes de injúria, calúnia e difamação.

Voltemos, então, um pouco antes de chegar às medidas punitivas para quem ultrapassa os limites da justiça. Comecemos pela detração, já que, sem ela, não existiriam razões para a utilização do poder coercitivo na correção de comportamentos indesejáveis. Para embasar meu texto, recorro a um pequeno livro (cuja leitura recomendo), do historiador brasileiro Leandro Karnal – “A detração. Breve ensaio sobre o maldizer”.

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O ambiente digital é terreno fértil para essa prática bastante antiga. Afinal, “onde houver pessoas, há falas; onde houver fala, há detração”. Imagine o potencial de difusão de fofocas em uma rede como o Facebook que atingiu, no dia 31 de março, a marca de 1,94 bilhão de usuários no mundo inteiro? Não à toa a rede social de Mark Zuckerberg iniciou parcerias com verificadores independentes para impedir a propagação de notícias falsas. Tudo em nome da transparência e da verdade.

Mas por que chegamos a esse ponto? Por que as redes sociais viraram um grande ringue onde as pessoas trocam farpas, acusações, se ofendem, gritam (querem ser ouvidas, mas não querem escutar)? E também uma arma de destruição em massa, se levarmos em consideração que a ignorância é, segundo o escritor francês François Rabelais, a mãe de todos os males? Informações falsas ou incorretas são como uma bomba atômica, que espalhadas – além de liberar uma enorme energia em quem as recebe – contamina as pessoas com radiações ionizantes.

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E quando se tem algoritmos controlando o conteúdo que chega até você e te coloca em “bolhas” de informação, o ato de dialogar simplesmente inexiste. Não há espaço para opiniões contrárias. O objetivo das redes de agradar o usuário acabou por criar um ambiente polarizado. Cada grupo fica em um canto, preferindo ouvir inverdades que lhe agradem do que uma visão contrária (e real).

Quando praticamos o diálogo, a palavra liga em vez de separar. Reúne em vez de dividir. Assim, o diálogo não é um instrumento que busca levar as pessoas a defender e manter suas posições, como acontece na discussão e no debate. Podemos ser adversários, mas não precisamos ser inimigos. Podemos aprender a aceitar as diferenças, sem que isso seja motivo para insultos.

A palavra, uma vez dita, não volta

Ainda pegando nas mãos de Leandro Karnal para me fazer entender, “há dois detalhes pouco conhecidos das pessoas de fora do Direito. O artigo 141 aumenta a pena de um terço se o alvo da injúria for o presidente da República, um chefe de Estado estrangeiro, um funcionário público, em razão das suas funções, ou se for a ofensa proferida na presença de várias pessoas. Será que todos possuem consciência disso quando atacam um político nas redes sociais? ”.

E mais: “O conhecimento da lei sobre calúnia, difamação e injúria deveria tornar as pessoas mais cuidadosas, especialmente na internet, por onde fluem montagens, acusações e outros quejandos que, se fossem levados a juízo, causariam problemas aos acusadores”.

Então, caro leitor, não se iluda. Utilizar o smartphone como uma arma disparando ataques a terceiros não te blinda. Você não está acima do bem e do mal e protegido por uma tela. E, se eu fosse você, não pagaria para ver. Espero que a Delegacia Especial de Repressão aos Crimes Cibernéticos (DRCC) do Distrito Federal vá além das investigações de denúncias de golpes bancários tão comuns, que chegam via SMS, e-mails e telefonemas. Que se investigue os estelionatos e as ameaças virtuais, mas que ela atue fortemente também no combate à difamação, injúria e calúnia.

“Guardai-vos, pois, do murmúrio inútil, poupai à vossa língua a maledicência; não há frase furtiva que caia no vazio, a boca mentirosa mata a alma” (Sabedoria 1,11).

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